Startup Direito do Trabalho
Por: Camilla Pedroza • 3/12/2019 • Trabalho acadêmico • 2.188 Palavras (9 Páginas) • 172 Visualizações
O aumento no uso e prestação de serviços de transporte de pessoas por meio do aplicativo Uber ensejou a um intenso debate acerta do seu funcionamento no País. A discussão orbita as seguintes perguntas: o que é o motorista da Uber? Que tipo de relação ele mantém com a empresa? Até onde, do ponto de vista jurídico, essas relações se estendem? As liberdades que um motorista da Uber possui para decidir onde e quando trabalhar são suficientes para que seja considerado autônomo? O assunto ainda é muito controverso no âmbito da Justiça do Trabalho brasileira.
O que é entendido pela Justiça Trabalhista é que o vínculo empregatício subsiste quando:
a) o serviço prestado tem relação direta ou indireta com a atividade principal da empresa,
b) quando for prestado de forma continuada, o que elimina a eventualidade.
Em se analisando os casos da Uber, o segundo requisito é passível de eliminação, uma vez que o serviço é eventual. Porém é preciso se atentar ao segundo requisito uma vez que os motoristas são pilar primordial na prestação do serviço.
Dessa forma, analisando a situação, é possível verificar situações como estipulação de preços, imposição de sanções no cometimento de falhas, controle de jornada de trabalho, inclusive por GPS, as quais todas configuram vínculo empregatício.
E baseado nesse entendimento, o juiz Bruno da Costa Rodrigues, da 2ª Vara do Trabalho de Campinas, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, no processo 0011594-77.2017.5.15.0032, ponderou que a atividade é um serviço de transporte que explora o trabalho humano sem autonomia do trabalhador e sentenciou que a Uber pagasse a um motorista credenciado o valor de R$ 10 mil em danos morais. Conforme decisão do magistrado, a empresa por aplicativo foi condenada também a pagar aviso prévio indenizado de 30 dias, 13º salário proporcional, férias e FGTS. Além disso, a Uber foi multada com base nos artigos 467 e 477 da CLT.
Na ação, o trabalhador expõe que foi admitido em 2017e não foi registrado em sua CTPS e demitido sem justa causa, quatro meses depois. Baseado nas regras da própria Uber, o magistrado ressalta que a jornada de trabalho do reclamante é totalmente controlada através de algoritmos e GPS, conforme art. 6 da CLT[1]:
“Tomando contato distante com discussões relacionadas ao trabalho de motoristas da Uber em outros países e me deparando com notícias de reconhecimento de relação de emprego (e trabalho dependente, conforme peculiaridades trabalhistas de cada país), de fato, sem conhecer a estrutura montada pela Uber para a exploração do trabalho, tais decisões causaram um pouco de estranheza.
Contudo, após análise pormenorizada (resumida nos itens da presente sentença) da forma de controle imposta pela Uber por meio de suas regras de "política de privacidade", "Termos de uso" e "Código de Condutas", bem como o uso da tecnologia no controle total da atividade, fica fácil compreender os motivos pelos quais diversos países, incluindo alguns com tradição de prevalência contratual e cultura econômica liberal, a exemplo de Reino Unido e EUA, vem reconhecendo a condição de "empregados" dos motoristas do Uber (além do reconhecimento de empresa de transportes), pois, diante de tanto controle e de tanto poder de direção, não há como adotar entendimento diverso. Inclusive, em razão de aspectos legais de regulamentação de transporte, enquadramento tributário e análise de concorrência desleal, a Uber chegou a ser proibida de operar por decisões judiciais na Alemanha, Itália, Espanha, Dinamarca. ”
O juiz constata também que a empresa é responsável por fixar um preço e emitir recibo para o serviço prestado pelo trabalhador. A decisão também é fundamentada no fato da Uber impor punições por condutas como cancelamento de corridas, acelerações e freadas bruscas detectadas pelo monitoramento por satélite.
A decisão também aponta que a escolha do horário de trabalhar não significa autonomia, constituindo mera cláusula do contrato de emprego, e que a Uber adota instrumentos psíquicos para exigir mais trabalho e controlar demanda.
Da mesma forma houve reconhecimento de vínculo empregatício na 37ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte entre a Uber e um motorista cadastrado. A decisão da juíza Ana Maria Espi Cavalcanti demandou que a empresa registre o vínculo do motorista em CTPS, além de pagar verbas rescisórias inerentes ao período de prestação de serviço. Uma indenização referente ao uso e desgaste do veículo também foi arbitrada. Como o desligamento foi sem aviso prévio, a empresa também foi condenada a pagar indenização no valor de R$ 5 mil por danos morais. Segundo a juíza, “a melhor doutrina e a jurisprudência predominante dos tribunais trabalhistas há muito já reconhecem que a remuneração do empregado pode ser paga por terceiros”.
No artigo "O Mercado de Trabalho no Século XXI: on-demandeconomy, crowdssourcing e outras formas de descentralização produtiva que atomizam o mercado de trabalho", o autor Adrián Todolí Signes, Professor Doutor, na Área de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de las Islas Baleares, analisou de maneira profunda a forma que a tecnologia vem modificando a maneira com que muitas empresas se relacionam com o mercado e como é premente mudar a mentalidade de que o empresário detém os meios de produção. Alinha que, com o avanço da tecnologia e o surgimento das plataformas virtuais, a ideia de controle de execução do serviço para se avaliar somente os resultados da prestação é descartada. Dessa maneira, esses modelos de negócio tem a avaliação comandada pelos usuários que se utilizam do serviço oferecido. Esse é o fenômeno chamado Crowdsourcing ou Crowdwork, que consiste em "tomar uma prestação de um serviço, tradicionalmente realizada por um trabalhador e descentralizá-lo indefinidamente e, normalmente, envolvendo grande número de pessoas em forma de chamada ou convocatória", na definição de Adrián Todolí Signes. Referido autor ainda destaca que esse modelo de negócio conta com três elementos: 1) os solicitantes, que são empresas ou indivíduos que solicitam a prestação de um serviço; 2) os trabalhadores que prestam serviços; e, 3) as plataformas virtuais, que utilizam as tecnologias de informação para unir oferta e demanda, e que recebem uma porcentagem pelo serviço realizado. Há que ser ponderado nesse tipo de negócio as plataformas genéricas e as específicas. Genéricas são aquelas em que os solicitantes podem requerer qualquer tipo de trabalho. Dentre as específicas, destaca a UBER, que se destina a um setor de atividade específico: transporte de passageiros. Ressalta que essa diferenciação é importante:
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