Florestan Fernandes - A Revolução Burguesa no Brasil
Por: Jauzão Pesca • 28/8/2018 • Resenha • 2.033 Palavras (9 Páginas) • 666 Visualizações
Florestan Fernandes - A revolução burguesa no Brasil
de Bruno-Lorenzi | trabalhosfeitos.com
Resenha: Florestan Fernandes, A Revolução Burguesa no Brasil
Bruno Rossi Lorenzi1
Em “A Revolução Burguesa no Brasil”, Florestan Fernandes descreve a formação da situação de mercado (típica do capitalismo moderno) no Brasil, através de uma análise ao mesmo tempo econômica, política, social e cultural da expansão cafeeira no séc. XIX. Em sua análise, Florestan foca a formação de um mercado capitalista interno, a formação das relações de classes e a persistência das relações patriarcais nas relações de trabalho e com o Estado, mesmo depois da formação de um novo setor dinâmico.
Antes da independência política em relação à Metrópole, a economia brasileira era uma típica economia colonial primário-exportadora. Não produzia para o mercado interno, importava tudo o que necessitava e dependia da Metrópole para tomar qualquer decisão quanto ao excedente econômico gerado. Com a independência, houve uma internalização das fases de comercialização antes engendrados pela Metrópole e uma autonomização do governo para aplicar o excedente econômico, que agora podiam ser aplicados a novos bens de consumo dos estamentos senhoriais. Com isso houve um aumento da produção agrícola, artesanal e manufatureira destinadas ao mercado interno e a possibilidade de usar o excedente econômico para dinamizar e diferenciar o setor econômico.
Porém, isso não eliminou nossadependência externa econômica nem a necessidade de exportação e importação, devido ao novo mercado interno ainda ser muito restrito e fraco, tanto econômica quanto politicamente.
Isso gerou uma dualidade na estrutura econômica e social do Brasil, com um setor dinâmico e caracteristicamente moderno (ligado à produção e exportação do café) e outro, referente a grande maioria do restante da sociedade, ainda arcaico e pré-capitalista. Essa dualidade estrutural significaria uma dependência externa, devido ao setor dinâmico, ligado à exportação, ser refém das alterações e decisões do mercado mundial. Esse modelo de organização sócio-econômica gerou uma situação de subdesenvolvimento, já que essa forma de organização não era suficiente para modernizar o outro setor arcaico. Ao invés disso, tendia a preservá-lo, mantendo, assim, a heteronomia da nossa estrutura.
Florestan observa que com a internalização dos processos de exportação e importação, os agentes econômicos externos se instalaram no interior da nova estrutura dinâmica, transferindo para dentro da nova estrutura firmas e unidades econômicas inteiras (especializados em transações comerciais, bancárias, etc) através de nossas elites, que se davam como uma espécie de “sócio-menor” desses agentes. Isso gerou um aparelhamento que, por um lado organizava nossa economia em relações de dependência com o exterior, maspor outro, possibilitava a emergência de um novo padrão de crescimento interno, diminuindo a nossa distância histórico-social em relação aos países centrais.
Através desse processo, o complexo comercial correspondeu ao primeiro surto verdadeiramente integrado do capitalismo no Brasil. Os fazendeiros de café e os imigrantes exerceram os papéis estratégicos para a formação e desenvolvimento do novo setor dinâmico da sociedade.
Ao fazendeiro de café, coube o papel de dissociar a riqueza produzida do status senhorial. Não sem uma grande resistência a essa dissociação, só sendo possível devido à incompatibilidade do novo setor competitivo em desenvolvimento e a antiga ordem estamental. Aos imigrantes coube o papel de, através da prática, legitimar ações econômicas de caráter acumulativas e especulativas (típicas do capitalismo moderno), já que estes eram menos vulneráveis aos valores e morais sociais vigentes, que abominavam a competição e o “espírito burguês”.
O capitalismo comercial e financeiro que se desenvolve nessa época expande o trabalho livre, em número e em diferenciação, e a produção destinada ao consumo interno. Para preencher os espaços vazios gerados por essa situação e transferir uma reserva de trabalho que desse conta desta, o governo estimulou a imigração. O imigrante, por meio de sua horta, podia diminuir suas necessidades em relação aomercado e desenvolver uma esfera de comercialização de bens de consumo, podendo acumular capital e reinvesti-lo em algum negócio maior posteriormente. Apesar de ser uma pequena parcela dos imigrantes que se aventuraram com sucesso nesse processo, o imigrante se torna o principal agente econômico da substituição de importações e o “herói da industrialização”. A grande vantagem do imigrante em relação ao fazendeiro de café era sua racionalidade adaptativa e a maneira pela qual aceitava e se propunha mais facilmente à mudança. Foi ele que transferiu para as diferentes camadas urbanas e rurais os padrões de uma “sociedade moderna” e “democrática”. Ele é, segundo Florestan, o agente que melhor encarna “o espírito capitalista” na antiga ordem estamental, apesar de sofrer influências da sociedade adotiva, pois, depois que enriquecia, queria se igualar em ideais e em honras ao senhor de engenho.
O Rio de Janeiro é para Florestan o protótipo do novo setor dinâmico, decorrente da expansão da produção de café e conseqüente aumento do trabalho interno, onde se encontram os negócios internos, prestação de créditos, negociações, especulações dos produtos a serem exportados e importados, hipotecas, etc.
Florestan descreve como a ordem social escravocrata e senhorial é pouco propícia à elaboração e convivência da competição. A natureza da organização econômica, social e políticaabsorvia as tensões de toda a sociedade aos estamentos superiores, diminuindo a importância e eficácia da competição. Como se mantiveram os valores e os critérios morais com a emergência do novo setor dinâmico, manteve-se uma solidariedade autocrática ao invés de um estímulo à competição. Portanto, os focos de tensão mais importantes ocorriam entre os estamentos superiores e a competição acabou se convertendo em fator de redistribuição dentro desses estamentos.
Tanto o novo homem de negócios das fazendas de café, quanto os novos negociantes comerciais, não se segmentaram em um estamento separado (burguês). Eles queriam se misturar ao velho estamento senhorial, tornando-se solidários entre si e dominantes. Além disso, os estamentos intermediários (ligados a política, negócios, administração, profissionais liberais etc) estavam muito ligados aos estamentos superiores (seja parietalmente, seja em relações de amizade) e exigiam ser tratados como tais. Portanto, foram na realidade os maiores defensores dos privilégios patrimonialistas e do “status quo”.
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