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A Ditadura Do Varejo As Grandes Redes De Supermercados Brigam Por Preços Baixos E Tornam Cada Vez Mais Dura A Vida Da Indústria

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Por:   •  11/9/2014  •  3.693 Palavras (15 Páginas)  •  743 Visualizações

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"Não revele meu nome nem minha empresa. Seríamos jogados para fora do mercado. Quem critica a maneira como as grandes redes agem sofre represália. Esteja certo disto: ou vão punir todas as empresas citadas na reportagem, ou pegarão algumas para dar o exemplo. Se você ficar refém das grandes redes, está perdido. A cada negociação de contrato elas vêm com novas exigências de descontos e com taxas que corroem nossa margem. Essas redes nos obrigaram a buscar alternativas. Dobramos nossa força de vendas e atendemos agora 60 000 clientes. Até dois anos atrás, 30% de nossa produção seguia para as prateleiras das grandes redes. Hoje são pouco mais de 20%. O que estamos fazendo é limitar os volumes. Vamos reduzir ainda mais essa dependência. É preciso jogar duro na negociação. Meu diretor de vendas gasta mais de um terço de seu tempo em discussões exaustivas com o pessoal dos supermercados, e nem poderia ser diferente. Acredite: mesmo não aceitando, algumas dessas taxas são lançadas à revelia, nas duplicatas. É uma confusão. São milhares de notas, contas que a tesouraria não tem como conciliar. Também tivemos de separar, no orçamento de marketing, as despesas do ponto-de-venda das de publicidade. Hoje uma posição na ponta de gôndola chega a custar 10 000 reais por mês. Como o ponto-de-venda é um aspirador de dinheiro, acaba sobrando muito pouco para as campanhas publicitárias. As conseqüências de tudo isso são margens achatadas e dificuldade para colocar produtos novos nas prateleiras, para inovar."

O depoimento é do presidente de uma empresa do setor de alimentos que fatura na faixa de 2 bilhões de reais por ano. Garantido pelo compromisso do anonimato, o relato do executivo dá uma boa idéia de quão complicadas e conflitivas estão hoje as relações dos grandes varejistas com os fornecedores. Varejo e indústria nunca viveram exatamente uma lua-de-mel, é certo. Trata-se de uma queda-de-braço que se mantém desde sempre. Nos anos de inflação elevada, quem esperneava eram os supermercadistas, compelidos a aceitar sucessivos reajustes nas viradas de tabela. Era pegar ou largar, quer dizer, ou ficar com as prateleiras desabastecidas. A situação começou a se inverter no começo dos anos 90: a abertura da economia e a estabilidade que seguiu ao Plano Real viabilizaram os investimentos estrangeiros no setor de distribuição, dando partida a um amplo, inédito e fulminante processo de fusões e aquisições. Grupos estrangeiros como o português Sonae, o francês Carrefour e o holandês Royal Ahold foram às compras. O Sonae investiu 1 bilhão de dólares, engoliu sete redes e passou a dominar o varejo na região sul do país. O Carrefour, o primeiro a chegar, em 1975, e que até recentemente crescia construindo seus próprios hipermercados, comprou o Eldorado, a Lojas Americanas e um punhado de cadeias regionais. O Royal Ahold desembarcou no Nordeste associado ao Bompreço. Em 1999, o Casino, concorrente francês do Carrefour, adquiriu 25% do capital do Pão de Açúcar, o que deu ao grupo do empresário Abilio Diniz fôlego para absorver mais de uma dezena de redes nos anos seguintes.

Esse processo tem um nome: concentração. Em 1997, as cinco maiores redes varejistas (Pão de Açúcar, Carrefour, Sonae, Bompreço/Ahold e Sendas) respondiam por 27% das vendas. No ano passado, essa participação chegou a 39%. Essas empresas ganharam escala e musculatura, que se traduzem em maior poder de negociação com os fornecedores. Passaram a impor as regras no relacionamento comercial com mão-de-ferro, de forma ditatorial mesmo. Estabeleceram contratos de longo prazo. Além do preço, da pontualidade na entrega e da qualidade dos produtos, consolidou-se como rotina no mercado exigências de descontos para lançamentos, promoções, vendas em datas especiais, bonificações e contribuições chamadas "enxovais" para inaugurações de lojas. A crescente busca de vantagens por parte dos distribuidores passou a gerar atritos. Primeiro com pequenos e médios fornecedores. "A mudança foi muito rápida, não deu tempo para que nos preparássemos para enfrentar a centralização dos negócios", diz o empresário Celso Gusso, presidente da Associação de Fornecedores de Supermercados (Assosuper). Estabelecida em Curitiba, a instituição foi criada há três anos para tentar neutralizar as pressões dos grandes varejistas. Gusso admite que a entidade não conseguiu reduzir as exigências dos contratos e hoje atua no corpo-a-corpo defensivo.

Abalados com a política comercial agressiva do Sonae, os fornecedores buscaram apoio na Assembléia Legislativa do Paraná, que instaurou uma CPI para apurar as relações comerciais na cadeia produtiva. Foram encontradas, no curso das investigações, 33 diferentes taxas (sete delas eram comuns) cobradas pelos quatro grandes varejistas -- além do Sonae, Carrefour, Wal-Mart e Extra. Outras CPIs pipocaram em mais sete estados, por causa das queixas de produtores de leite, que também passaram a responsabilizar os varejistas pela queda da remuneração paga pela indústria de laticínios (os produtores alegavam que, para compensar os descontos concedidos às grandes redes, a indústria de laticínios reduziu os preços pagos a eles). "O preço caiu 40% desde maio do ano passado", afirma o empresário Jorge Rubez, presidente da Leite Brasil, a associação nacional dos produtores. "Três quartos dessa redução ficou com o varejo, na forma de taxas."

Do arrocho não escapam nem mesmo fornecedores especializados em produzir artigos de marca própria para os supermercados. Semanas atrás, a gaúcha Fontana, fabricante de produtos de limpeza e higiene, decidiu romper o fornecimento de sabonetes ao Sonae. Segundo Juliana Fontana, diretora de marketing, tornou-se impossível cumprir exigências cada vez mais rígidas de prazo de entrega e de manutenção de preço. "Eles não aceitam negociar aumentos nem querem saber se a matéria-prima encareceu", diz Juliana. Procurado por EXAME, o Sonae recusou-se a dar entrevista.

A grande indústria já se habituou à queda-de-braço com o varejo. Um exemplo entre muitos: por causa da divergência em torno de uma tabela com reajuste de preços, centenas de itens da Nestlé foram retirados das gôndolas do Pão de Açúcar em junho do ano passado. Segundo Luiz Antonio Fazzio, ex-diretor executivo do maior grupo varejista do país, o Pão de Açúcar, e recém-contratado para presidir a C&A, os preços corrigidos lhe foram comunicados pelo então presidente da Nestlé, Ricardo Gonçalves. "Expliquei que quando o mercado permitisse adotaríamos a nova tabela", diz Fazzio. "Mas o pessoal da Nestlé respondeu que no dia seguinte já não entregaria a mercadoria." Dos 700 itens da Nestlé, apenas 100 permaneceram

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