Gramática sem decors
Tese: Gramática sem decors. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: Lauramara • 15/9/2014 • Tese • 2.345 Palavras (10 Páginas) • 160 Visualizações
Gramática sem decoreba
Primeiro, as aulas eram só teoria. Depois, redação, leitura e nenhum conceito. Mas hoje se sabe como ensinar a estrutura da língua, de forma prática, para que os alunos escrevam melhor
Iracy Paulina (novaescola@fvc.org.br)
Compartilhe
Envie por email Imprima
Há anos se fala de uma concepção diferente do ensino de gramática, mas pouca coisa mudou.O professor sabe que decorar regras e ler a gramática (que deve ser usada só para consulta) não funcionam. Isso porque somente o estudo teórico não leva ninguém a falar, ler e escrever melhor.Como muitos educadores ainda não descobriram outra forma de abordar o tema, simplesmente o deixam de lado. O resultado é que o conteúdo praticamente desapareceu da sala de aula.
Essa parte da língua foi relegada porque se acreditava que ela não dava competência para redigir bem. "Nos anos 1990, essa idéia começou a ser questionada", observa Kátia Lomba Brakling, uma das autoras dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa de 1ª a 4ª série e de 5ª a 8ª. "Tudo o que se vê nos programas de leitura mostrou que esse é mais um dos componentes a ser abordado quando se fala em reflexão sobre a língua."
• Leia mais sobre produção de texto
Existe uma enorme dificuldade em inovar a didática nesse campo. A constatação é de Artur Gomes de Morais, do Centro de Estudos em Educação e Linguagem da Universidade Federal de Pernambuco, que fez uma pesquisa sobre o tema em 2002. Ele pretendia verificar o que se realizava em classe com as séries iniciais do Ensino Fundamental em relação às novas orientações para o desenvolvimento do conteúdo.
Foram entrevistadas 12 professoras de 3ª e 4ª série da rede pública municipal do Recife.Apesar de se esforçarem, Morais verificou que elas mantinham um pé na inovação e outro no convencional. O que chamam de gramática contextualizada, em geral, são aulas sobre nomenclatura e classificações, só que travestidas porque se baseiam em um texto.Ainda hoje estamos longe do desejável,mas vêm ocorrendo algumas inovações. Um caminho interessante é desvendar com a garotada a intenção do autor ao escolher determinada forma de escrever, como faz o professor Perón Rios, da Escola de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco (leia o quadro).
Ana Silvia Moço Aparício, da Universidade de Campinas, chegou a conclusões semelhantes às de Morais em estudo feito com dez educadoras de 5ª a 8ª série da rede pública de Penápolis (SP). "Elas diziam inovar nessa área, mas privilegiavam a leitura e a escrita e os conteúdos vistos continuavam sendo as categorias tradicionais, como substantivos, adjetivos e preposições, usando o texto como pretexto."
Carta a um amigo
As atividades propostas em Língua Portuguesa aos estudantes da Escola de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco procuram sempre aliar, de forma unificada e coerente, várias áreas da disciplina, como gramática, leitura e produção textual. É o que mostra o plano de aula desenvolvido pelo professor Perón Rios com uma turma de 8ª série.
1. Rios pediu que todos lessem uma carta de Carlos Drummond de Andrade a João Cabral de Melo Neto (publicada em Correspondência de Cabral com Drummond e Bandeira) e discutiu sobre tipos de saudação e formato. Como é uma carta pessoal, a linguagem afetiva predomina.
2. Em seguida, a turma leu e discutiu o poema Imitação da Água (publicado em Obra Completa de João Cabral de Melo Neto) e escreveu uma carta para João Cabral, comentando o poema. Todos podiam tratá-lo como amigo (com linguagem afetiva) ou alguém distante (empregando a linguagem formal).
3. Escolhida uma das cartas para ser analisada, foram destacadas referência temporal, saudação e linguagem (pessoal afetiva). O professor sublinhou os marcadores de tempo, lugar e modo e pediu que a função deles fosse apontada. Era necessário analisar o peso de palavras como "cuidadosamente" no sentido buscado pelo aluno. "Poderíamos retirar esse termo sem modificar o sentido?", questionou.
4. Como próxima atividade, Rios propôs a reescrita de alguns trechos. O marcador usado em uma determinada frase em destaque era o mais adequado para exprimir a intenção da autora? Ele poderia ser substituído por outra palavra mais apropriada? Qual?
5. Rios explicou que os marcadores exprimem circunstâncias e são chamados de advérbios. Depois, pediu a todos que conceituassem os advérbios. Para concluir, compararam com a definição do livro.
Mais que a classificação, é preciso saber a função
Apenas encontrar substantivos e pronomes em um conto não é suficiente para ampliar o conhecimento da gramática, segundo Irandé Antunes, da Universidade Estadual do Ceará. "É preciso ir além das definições para descobrir, por exemplo, a função deles na introdução e na manutenção do tema ou do enredo", ela defende." Saber que é indeterminado o sujeito de uma frase é muito pouco. O importante é compreender por quê, com que propósito discursivo, se preferiu deixá-lo assim."Portanto, diz Irandé, é necessário ir além da nomenclatura, das classificações, da simples análise sintática de frases soltas para ver como as unidades da língua funcionam na construção dos textos e que efeitos seus usos podem provocar na constituição do discurso.
As pesquisas sobre o ensino de gramática levam em conta que, para haver uma boa comunicação, a pessoa deve adequar a forma como se expressa à situação comunicativa em que se encontra. "A questão não é exatamente aprender as regras gramaticais, mas dominar também a língua culta de uso real, aquela de fato usada pelas pessoas mais escolarizadas", aponta Morais.
É essencial que a garotada aprenda a importância de falar e escrever de acordo com a variante lingüística prestigiada socialmente, que é esperada em determinadas situações sociais." Se o aprendiz a domina, poderá compreender mais o que é dito ou escrito pelas pessoas mais letradas. Ele vai entender o que foi escrito num tom mais formal, desfrutar de obras literárias, compreender melhor publicações científicas", explica Morais.
Além disso, o domínio da variante prestigiada permite que os jovens não sejam discriminados em certos contextos e lhes dá uma ferramenta a mais para lutar por seus princípios
...