A culpa em face do crime
Projeto de pesquisa: A culpa em face do crime. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: • 6/5/2014 • Projeto de pesquisa • 7.051 Palavras (29 Páginas) • 1.062 Visualizações
Elizabeth de Almeida Viana Pereira
2º ano de Direito Matutino
Direito Penal
A Culpabilidade
LONDRINA
SETEMBRO DE 2013
Sumário
Sumário 3 Introdução 4 Epígrafe 5 Conceito de Culpa 6 A posição da culpabilidade em face da estrutura do crime 9 Teorias da Culpabilidade – Teoria Psicológica 10 Teoria Psicológico-Normativa 11 Teoria Normativa Pura 12 Teoria Limitada da culpabilidade 14 Características da teoria finalista 15 Teoria adotada pelo Código Penal na ótica de Paulo Costa Jr. 16 Elementos da culpabilidade 17 Da imputabilidade 18 Causas de exclusão da imputabilidade 19 Actio libera in causa 19 Da culpabilidade – Coação irresistível 21 Da culpabilidade – Obediência hierárquica 22 Obediência hierárquica como excludente de culpabilidade 23 Da culpabilidade – Doença mental 24 Da culpabilidade – A menoridade 25 Da culpabilidade – A emoção e a razão 26 Da culpabilidade – A embriaguez 28 Conclusão 30 Bibliografia 31
Introdução
A palavra culpa nasceu significando “ofensa” ou “ferida”. De acordo com Civoli, devia importar numa compreensão extensiva, abrangente não só do fato produtivo de um dano mas, também, do estado psíquico do agente que o produziu.
O tempo avançou e mais tarde passou a designar o elemento moral da ação ou da omissão lesiva, eqüivalendo, assim, à culpabilidade.
A culpa acompanha o Direito desde seus primórdios. No código de Manú, por exemplo, a culpa não se distinguia do caso em si, mas de condições nas quais o crime era praticado, tendo em vista particularidades como a casta à qual pertencia o criminoso.
A estatização do exercício da pena trouxe equidade no tratamento da culpa
Neste trabalho vamos abordar as concepções da culpabilidade e suas teorias.
“Sob a ponte da Justiça passam todas as dores,
todas as misérias, todas as aberrações, todas as
opiniões políticas, todos os interesses sociais. Justiça
é compreensão, isto é, tomar em conjunto
e adaptar os interesses opostos: a sociedade
de hoje e a esperança de amanhã.”
Mauro Capelletti, jurista italiano
“A História tem demonstrado que onde a
lei prevalece, a liberdade individual do
homem tem sido forte e grande o progresso.
Onde a lei é fraca ou inexistente, o caos
e o medo imperam e o progresso humano
é destruído ou retardado”.
Earl Warren (ex-pres. Suprema Corte dos EUA)
Conceito de Culpa
As palavras culpa e culpado têm sentido comum ao indicar uma pessoa responsável por uma falta, uma transgressão, uma violação à norma, ou seja, por Ter praticado um ato condenável. Se é culpado quando se causa um dano, uma lesão. Tal resultado só pode ser atribuído a quem deu causa ao dano se essa pessoa pudesse ter procedido de outra forma, se pudesse com seu comportamento Ter evitado a lesão.
No Direito Penal da Antigüidade, a responsabilidade penal decorria do simples ato lesivo, sem que se indagasse da culpa do autor da conduta. Percebeu-se, porém, no decorrer da evolução cultural, que somente podem ser aplicadas sanções ao homem causador do resultado lesivo se, com seu comportamento, poderia tê-lo evitado. Não se pode intimidar com proveito o homem com a ameaça da pena simplesmente pelo resultado de sua conduta. Ao contrário, a intimidação é apenas eventualmente eficiente quando se ameaça o homem com pena pelo que fez (e poderia não Ter feito) ou pelo que não fez (mas poderia fazer), evitando a lesão a um bem jurídico. Isso significa que é necessário indagar se o homem quis o resultado ou ao menos podia prever que esse evento iria ocorrer. Torna-se assim indispensável, para se falar em culpa, verificar se no fato estavam presentes a vontade ou a previsibilidade. Desses elementos (vontade e previsibilidade) surgiram dois conceitos jurídico-penais importantes: o dolo (vontade) e a culpa em sentido estrito (previsibilidade). O crime pode, pois, ser doloso (quando o agente quer o fato) ou culposo (quando o sujeito não quer, mas dá causa ao resultado previsível). Assim, temos a teoria psicológica da culpabilidade: a culpabilidade reside numa ligação de natureza psíquica entre o sujeito e o fato criminoso. Dolo e culpa, assim, seriam as formas de culpabilidade.
Tal teoria, porém, não explica a culpabilidade penal. Verificou-se que na culpa inconsciente (em que o sujeito não prevê o resultado) não há nenhuma ligação psíquica entre o autor e o resultado. Ademais, os atos humanos são penalmente relevantes apenas quando contrariam a norma penal. O dolo e a culpa, em si mesmos, que existem em todos os atos voluntários que causam um dano, não caracterizam a culpabilidade se a conduta não for considerada reprovável pela lei penal.
Por essa razão, a partir dos estudos de Frank, passou-se a entender que o dolo e a culpa eram insuficientes para se falar em culpabilidade, não sendo modalidades, mas elementos desta. Dolo e culpa, como liames psicológicos entre o agente e o fato, devem ser valorados normativamente. Há que se fazer um juízo de censura sobre a conduta. O fato somente é censurável se, nas circunstâncias, se pudesse exigir do agente um comportamento de acordo com o direito. Assim se formou a teoria psicológico-normativa da culpabilidade, então chamada teoria normativa da culpabilidade: a culpabilidade exige o dolo ou a culpa, que são os elementos psicológicos presentes no autor, e a reprovabilidade, um juízo de valor sobre o fato, considerando-se que essa censurabilidade somente existe se há no agente a consciência da ilicitude de sua conduta ou, ao menos, que tenha ele a possibilidade desse conhecimento.
Com o surgimento da teoria da ação finalista, de Welzel, porém, passou-se a discutir a validade dessa colocação. A ação, como afirmam os finalistas, não pode ser desligado do fim do agente, sob pena de se fraturar a realidade do fato concreto. O fim da conduta, elemento intencional da ação, é inseparável da própria ação. O dolo, por exemplo, é a consciência do que se quer e a vontade de realizar o tipo; se ele não existe, ou seja, se a ação não for dolosa, não há fato típico doloso. O que se elimina com a exclusão do dolo é a própria existência do fato típico e não a mera culpabilidade pelo fato que o sujeito praticou. Assim, o dolo e a culpa não podem ser elementos da culpabilidade; colocando-os como fazendo parte desta, está-se fracionando a estrutura natural da ação.
Sendo assim, não se pode aceitar a teoria psicológico-normativa, pois o dolo não pode ser elemento do fato e elemento da culpabilidade pelo fato. Chegou-se, assim, à teoria da culpabilidade, ou teoria normativa pura: o dolo e a culpa pertencem à conduta; os elementos normativos formam todos a culpabilidade, ou seja, a reprovabilidade da conduta. Assim, a culpabilidade ganha um elemento – a consciência de ilicitude (consciência de injusto) – mas perde os anteriores elementos ‘anímicos-subjetivos’ – o dolo e a culpa strictu sensu – reduzindo-se, essencialmente, ao juízo de censura.
A culpabilidade é, portanto, a reprovabilidade da conduta típica e antijurídica.
Mas, do princípio da culpabilidade se depreende que, em primeiro lugar, toda pena supõe culpabilidade, de modo que não pode ser castigado aquele que atua sem culpabilidade (exclusão de responsabilidade pelo resultado) e, em segundo lugar, que a pena não pode superar a medida da culpabilidade (dosagem da pena no limite da culpabilidade). Por isso, tem-se entendido que em nenhum caso se pode admitir, nem por razões ressociabilizadoras, nem de proteção da sociedade diante do delinqüente, ainda que perigoso, uma pena superior ao que permite a culpabilidade.
Hoje, cresce a idéia de que do conceito de culpabilidade não se pode excluir definitivamente o dolo e a culpa. Como se tem afirmado, o dolo ocupa dupla posição: em primeiro lugar, como realização consciente e volitiva das circunstâncias objetivas (no fato típico) e, em segundo, como portador do desvalor da atitude interna que o fato expressa. Em nosso código, por exemplo, o art. 59, ao mencionar como circunstância para fixação da pena ‘a culpabilidade’ do agente, inclui a apreciação da intensidade do dolo e do grau da culpa.
A posição da Culpabilidade em Face da Estrutura do Crime
Maggiore explica que desde que exista causa de exclusão da ilicitude não há crime, pois um fato não pode ser ao mesmo tempo lícito e antijurídico; quando, porém, incide uma causa de exclusão de culpabilidade o crime existe, embora não seja efetivo, não em si mesmo, mas em relação à pessoa do agente declarado não culpável. A culpabilidade liga o agente à punibilidade e a pena é ligada ao agente pelo juízo de culpabilidade. O crime existe por si mesmo, mas, para que o crime seja ligado ao agente, é necessária a culpabilidade.
Para existência do crime, segundo a lei penal brasileira, é suficiente que o sujeito haja praticado um fato típico e antijurídico. O crime existe por si mesmo com os requisitos “fato típico” e “ilicitude”. Mas o crime só será ligado ao agente se este for culpável.
Autores como Damásio de Jesus se posicionam como não sendo a culpabilidade um requisito do crime. Crime que apresenta duas facetas: fato típico e ilicitude. Ela funciona como condição da resposta penal.
A culpabilidade é pressuposto de pena e não requisito ou elemento do crime. Assim, a imposição da pena depende da culpabilidade do agente. Além disso, a culpabilidade limita a quantidade da pena: quanto mais culpável o sujeito, maior deverá ser a quantidade da sanção penal.
Teorias da Culpabilidade
1. Teoria Psicológica
A culpabilidade residiria na relação psíquica do autor com seu fato; é a posição psicológica do sujeito diante do fato cometido. Compreende o estudo do dolo e da culpa, que são suas espécies. A culpabilidade consiste na relação psíquica entre o autor e o resultado, tendo por fundamento a teoria causal ou naturalística da ação. O dolo é caracterizado pela intenção (ou assunção do risco) de o agente produzir o resultado; a culpa, pela inexistência dessa intenção ou assunção do risco de produzi-lo.
O erro dessa doutrina consiste em reunir como espécie fenômenos completamente diferentes: dolo e culpa. Se o dolo é caracterizado pelo querer e a culpa pelo não querer, conceitos positivo e negativo, não podem ser espécies de um denominador comum, qual seja, a culpabilidade. Não se pode dizer que entre ambos o ponto de identidade seja a relação psíquica entre o autor e o resultado, uma vez que na culpa não há esse liame, salvo a culpa consciente. A culpa é exclusivamente normativa, baseada no juízo que o magistrado faz a respeito da possibilidade de antevisão do resultado. O fracasso de tal doutrina se dá por ser um conceito normativo (a culpa) e um conceito psíquico (o dolo) espécies de um mesmo denominador comum.
2. Teoria Psicológico-Normativa
Não somente em casos de dolo, como também em fatos culposos, o elemento caracterizador da culpabilidade é a reprovabilidade. Quando é inexigível outra conduta, embora tenha o sujeito agido com dolo ou culpa, o fato não é reprovável. Assim, a culpabilidade não é só um liame psicológico entre o autor e o fato, ou entre o agente e o resultado, mas sim um juízo de valoração a respeito de um fato doloso (psicológico) ou culposo (normativo). Assim, dolo e culpa não podem ser considerados espécies de culpabilidade, mas sim elementos. E a culpabilidade é psicológico-normativa: contém o dolo como elemento psicológico e a exigibilidade como fator normativo.
De acordo com esta teoria, são seus elementos:
imputabilidade
elemento psicológico-normativo – dolo ou culpa
exigibilidade de conduta diversa.
Alguns defeitos mantém-se nesta doutrina. O dolo permanece como elemento da culpabilidade, o que não pode ocorrer dado ser ele um fator psicológico que sofre um juízo de valoração. Maurach pontua que “se se diz ‘a culpabilidade é uma censura’, faz-se um juízo de valoração em relação ao delinqüente. Em conseqüência, a culpabilidade deve ser um fenômeno normativo”. Se a culpabilidade em si é um fenômeno normativo, seus elementos também devem o ser. Um provérbio alemão aponta que a culpabilidade não está na cabeça do réu, mas na do juiz. O dolo, ao contrário, está na cabeça do réu. Assim, o dolo não pode manifestar um juízo de valoração. Ele é objeto desse juízo.
3. Teoria Normativa Pura
Também conhecida por extrema ou estrita. Relaciona-se com a teoria finalista da ação.
Retira o dolo da culpabilidade e o coloca no tipo penal. Exclui do dolo a consciência de ilicitude e a coloca na culpabilidade. Em consequência, a culpabilidade possui os seguintes elementos:
imputabilidade
possibilidade de conhecimento do injusto
exigibilidade de conduta diversa
De acordo com a doutrina tradicional, culpabilidade é a liga entre autor e resultado. Em face dos delitos culposos, esse conceito causa enormes dificuldades. Enquanto na culpa consciente pode-se falar em nexo subjetivo entre o sujeito e o resultado, na culpa inconsciente não existe essa ligação. A dificuldade também é encontrada no dolo. Enquanto a culpa pode ser graduada, a relação psíquica entre o autor e o resultado não pode ser objeto de valoração quantitativa, entendendo-se que é inexato falar em intensidade do dolo. Então, podendo ser valorada quantitativamente, a culpa tem um elemento normativo: a censurabilidade da conduta, a reprovabilidade do comportamento. E, como há ações dolosas que não são reprováveis, como na legítima defesa real, pode-se afirmar que há ações dolosas não culpáveis. Nestes casos , o dolo não faz parte da culpabilidade, sofrendo um juízo de valor, de apreciação, no campo da culpabilidade. Assim, a culpabilidade é um juízo de valor que incide sobre um tipo psicológico que existe ou falta. No tipo doloso, a ação é censurável pela vontade de cometer o fato; no culposo, a conduta é reprovável porque o sujeito não evitou o fato por meio de um comportamento regido de maneira finalista.
No juízo de culpabilidade a valoração é feita da seguinte forma: o sujeito devia agir de acordo com a norma porque podia atuar de acordo com ela. No juízo de ilicitude, a situação valorativa é a seguinte: o sujeito agiu em desacordo com a norma, deixando aberta a questão: podia ter agido de forma diferente?
Como a vontade da conduta é um fator puramente psicológico, e como essa vontade, de acordo com o finalismo, corresponde ao dolo, trata-se de um dolo natural, despido de fator normativo, isto é, despido da consciência da antijuridicidade.
Tendo em vista que a consciência da antijuridicidade é excluída do dolo, integrando a culpabilidade, e como esta constitui puro juízo de valor, segue-se que o conhecimento do injusto deve ter a mesma natureza daquela. Cuida-se de potencial consciência da ilicitude, não da real e atual. É suficiente que o sujeito tenha a possibilidade de conhecer a ilicitude da conduta, não exigindo que possua real conhecimento profano do injusto.
Diante disso, a culpabilidade não se reveste de característica psicológica. É puro juízo de valor normativo. Se compõe dos seguintes elementos:
imputabilidade
exigibilidade de conduta diversa
potencial consciência da ilicitude
Todos estes elementos se mantém presentes em crimes dolosos e culposos. Welzel foi bastante criticado quanto à separação entre culpabilidade e ilicitude, dolo eventual e culpa em sentido estrito. Welzel afirmava que o resultado nos delitos culposos derivava da inobservância do mínimo de direção finalista capaz de impedir a sua produção. Então, o fato imprudente era “evitável finalmente”, o que introduzia no conceito, precocemente, um momento valorativo, próprio da culpabilidade e não do âmbito do tipo. Além disso, a finalidade do agente no delito culposo é penalmente irrelevante. Ao modificar pontos de sua teoria, Welzel pontuou que, no crime culposo, o nexo finalista é juridicamente irrelevante. Na ação culposa o objetivo do agente é juridicamente irrelevante.
Vejamos exemplo citado por Damásio de Jesus. Na Alemanha o aborto não é perseguido, considerando-se então pelo senso comum como impunível. A agente, vinda da Alemanha, pratica o aborto no Brasil. Processada, alega ter agido sem consciência de antijuridicidade (erro de direito). Assim, sem real e atual conhecimento do injusto, inexiste dolo, restando apenas uma conduta culposa. A teoria finalista da ação resolve tal contraponto. Como o dolo pertence à ação e não existe real conhecimento da ilicitude, resta que a mulher praticou um fato doloso de tentativa de aborto, sendo indiferente para a existência da conduta dolosa a questão da consciência da ilicitude, a ser examinada na culpabilidade. Como ela possuía meios de saber se o fato era punível ou não, isto é, como tinha possibilidade de conhecer a ilicitude da conduta, agiu culpavelmente. O erro era evitável. O erro evitável não exclui o dolo e nem a culpabilidade, podendo atenuá-la. Agora, se tratasse de erro inevitável, restaria íntegro o dolo, excluindo-se a culpabilidade. O dolo, portanto, não é elemento da culpabilidade, mas seu coeficiente, sofrendo juízo de valor no campo da reprovabilidade.
4. Teoria Limitada da Culpabilidade
Pontua que o erro de proibição não exclui o dolo, enquanto o erro de tipo exclui este elemento normativo. Assim, a falta de consciência de antijuridicidade não afasta o dolo. Difere a respeito da suposição da causa excludente da ilicitude (as chamadas discriminantes putativas, como a legítima defesa putativa). Para a teoria extrema da culpabilidade, mesmo nesses casos subsiste o dolo, absolvendo-se o agente no caso de ser inevitável a ignorância da ilicitude. A teoria limitada, porém, faz distinções entre a ignorância da ilicitude por erro que recai sobre a regra de proibição e a ignorância da ilicitude por erro incidente sobre a situação de fato. Se, por erro, o sujeito supõe a existência de uma norma que, se existisse, tornaria legítima sua conduta, concordando com a extrema, a teoria limitada afirma existir dolo, permitindo a absolvição em caso de erro inevitável. Quando, porém, em vez de incidir o erro sobre a regra de proibição, recair sobre a situação de fato, supondo o sujeito estar agindo acobertado por causa excludente de ilicitude por erro, há que distinguir: no erro que recai sobre a norma de proibição subsiste o dolo, podendo ser excluída ou atenuada a culpabilidade, se inevitável ou evitável; quando, entretanto, há ignorância da ilicitude por erro que recai sobre a situação de fato, não subsiste o dolo, podendo responder o sujeito por crime culposo. O primeiro é tratado como erro de proibição; o segundo, como erro de tipo.
Tal teoria é adotada pela reforma penal de 1984. As discriminantes putativas, quando derivadas de erro sobre a situação de fato, são tratadas, como erro de tipo: o erro inevitável exclui o dolo e a culpa; o evitável, apenas o dolo, subsistindo a culpa (art. 20 § 1o ); quando surgem em face de erro sobre a ilicitude do fato, cuida-se de erro de proibição: se inevitável, exclui a culpabilidade; se evitável, atenua a pena (art. 21, caput).
Características da Teoria Finalista
conduta (ação) é o comportamento humano consciente dirigido a determinada finalidade
dolo é a vontade de concretizar os elementos objetivos do tipo
culpa é a inobservância do cuidado objetivo necessário, manifestada numa conduta produtora de um resultado objetiva e subjetivamente previsível (previsibilidade objetiva e subjetiva)
dolo e culpa constituem elementos do tipo: o dolo é elemento subjetivo do tipo; a culpa, elemento normativo do tipo
dolo e culpa integram o tipo e o fato típico, que se compõe de: conduta dolosa ou culposa, resultado, nexo e tipicidade
ausente o dolo e a culpa, o fato é atípico ou não
o dolo não é normativo, não portando a consciência de antijuridicidade (o dolo é natural)
o dolo contém os seguintes elementos: consciência da conduta e do resultado; consciência do nexo causal; vontade de realizar a conduta e de produzir o resultado;
na culpabilidade, no lugar de dolo e culpa ingressa a potencial consciência de ilicitude: possibilidade de conhecimento da ilicitude do fato
culpabilidade passa a ter como elementos a imputabilidade, exigibilidade de conduta diversa e potencial consciência de ilicitude
os elementos da culpabilidade não são psicológicos, mas normativos, puros juízos de valoração, sem conteúdo psicológico
o erro que recai sobre os elementos descritivos do delito é denominado erro de tipo; exclui o dolo, podendo o sujeito responder por crime culposo
o erro que recai sobre a ilicitude do fato, sobre a regra de proibição, chama-se erro de proibição. Não exclui o dolo: exclui a culpabilidade ou atenua.
Teoria adotada pelo CP na ótica de Paulo Costa Jr.
Ao contrário de Damásio, que observa no código penal brasileiro uma opção pela teoria finalista, Paulo José da Costa Jr. enxerga nossa legislação optando por um doutrinamento híbrido. Assim, enquanto no art. 18 deu preferência à teoria psicológico-normativa da culpabilidade, no erro decidiu-se pela concepção normativa pura (art. 20 e 21). Num apanhado geral, ele expõe que a culpabilidade, na verdade, deve ser entendida como forma de atuação do agente, para influir diretamente no estabelecimento da pena.
Afirma-se que, tomando por base a teoria finalista, o legislador teria incluído, em artigos como o 59 do CP, a culpabilidade como conceito normativo e representativo da idéia de reprovabilidade, eliminando assim a intensidade do dolo e o grau da culpa. O autor, no entanto, declara que nem os redatores da reforma do código penal, em 1984, tem posição fixa sobre o assunto. Na opinião de integrantes da comissão revisora, como Ariel Dotti, pode-se ocorrer um dolo intenso (mulher morta com inúmeras facadas, por exemplo) sem que a culpa se mostre como tal.
Elementos
da Culpabilidade
Para que uma conduta seja reprovável é necessário que o autor da ação tivesse podido agir de acordo com a norma, de acordo com o direito.
Em primeiro lugar, é preciso estabelecer se o sujeito tem certo grau de capacidade psíquica que lhe permitia Ter consciência e vontade dentro do que se denomina autodeterminação, ou seja, se ele tem a capacidade de entender, diante de suas condições psíquicas, a antijuridicidade de sua conduta e de adequar essa conduta à sua compreensão. A essa capacidade psíquica denomina-se imputabilidade. É a condição pessoal de maturidade e sanidade mental que confere ao agente a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se segundo esse entendimento. Para alguns, a imputabilidade não é elemento da culpabilidade, mas seu pressuposto.
Não basta, porém, a imputabilidade. É indispensável, para o juízo de reprovação, que o sujeito possa conhecer, mediante algum esforço de consciência, a antijuridicidade de sua conduta. É imprescindível apurar se o sujeito poderia estruturar, em lugar da vontade antijurídica da ação praticada, outra conforme o direito, ou seja, se conhecia a ilicitude do fato ou se podia reconhecê-la. Só assim há falta ao dever imposto pelo ordenamento jurídico. Essa condição intelectual é chamada possibilidade de conhecimento da antijuridicidade do fato (ou da sua ilicitude).
É necessário ainda que, nas circunstâncias do fato, fosse possível exigir do sujeito um comportamento diverso daquele que tomou ao praticar o fato típico e antijurídico, pois há circunstâncias ou motivos pessoais que tornam inexigível a conduta diversa do agente. É o que se denomina exigibilidade de conduta diversa.
Assim, só há culpabilidade se o sujeito, de acordo com suas condições psíquicas, podia estruturar sua consciência e vontade de acordo com o direito (imputabilidade), se estava em condições de poder compreender a ilicitude de sua conduta (possibilidade de conhecimento da ilicitude), se era possível exigir, nas circunstâncias, conduta diferente daquela do agente (exigibilidade de conduta diversa). São esses os elementos da culpabilidade.
Da Imputabilidade
Imputar é atribuir a alguém a responsabilidade de alguma coisa. Imputabilidade é o conjunto de condições pessoais que dão ao agente capacidade para lhe ser juridicamente imputada a prática de um fato punível. É o pressuposto da responsabilidade. Sem agente livre e consciente, não pode haver imputabilidade e, consequentemente, responsabilidade penal.
Responsabilidade
A imputabilidade não se confunde com a responsabilidade penal, a qual corresponde às conseqüências jurídicas oriundas de prática de uma infração.
O homem seria criminalmente responsável porque moralmente livre. Livre de escolher entre o bem e o mal, e decide pelo mal e viola a norma jurídica, sendo justo sobre ele recaiam as conseqüências dessa violação. Assim, essa liberdade de deliberar-se apesar dos motivos, essa possibilidade de dirigir-se segundo seu livre querer, no sentido do bem ou do mal, que o obriga a responder pelos seus atos perante a Justiça.
A imputabilidade de existir no momento da prática da infração. Daí, dizer o art. 26, caput, ao tratar de causas de exclusão da imputabilidade, que a deficiência deve existir ao tempo da ação ou da omissão”.
Causas da exclusão da imputabilidade
Inimputabilidade é a capacidade para apreciar o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com essa apreciação. Se a imputabilidade consiste na capacidade de entender e de querer, pode estar ausente porque o indivíduo, por questão de idade, não alcançou determinado grau de desenvolvimento físico ou psíquico, ou porque existe em concreto uma circunstância que a exclui. A imputabilidade é a regra; a inimputabilidade, exceção.
As causas de exclusão da inimputabilidade são as seguintes:
doença metal;
b) desenvolvimento metal incompleto;
c) desenvolvimento mental retardado;
embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior
As primeiras estão no art. 26, caput; a quarta, no art. 28, par. 1º.
Actio Libera in Causa
A imputabilidade deve existir ao tempo da prática do fato (ação ou omissão), de modo que não cabe uma imputabilidade subsequente. Se o agente praticou o ato no mesmo tempo que não tinha capacidade de compreensão e de determinação por causa de uma doença mental, não será considerado imputável se após a ocorrência readquirir a normalidade psíquica. É possível também o caso de a doença mental sobrevir a prática da conduta punível. Neste caso, o agente não será considerado inimputável, suspendendo-se a ação penal até que se restabeleça.
Pode ocorrer o caso de o agente colocar-se propositadamente em situação de inimputabilidade para a realização de conduta punível. Como p. ex. o sujeito que se embriaga voluntariamente para cometer o crime, encontrando-se em estado de inimputabilidade no momento de sua execução (ação ou omissão).
O termo actio indica a conduta (ação ou omissão); libera expressa o elemento subjetivo do sujeito; in causa, a conduta anterior determinadora das condições para a produção do resultado.
A punibilidade da actio libera in causa foi por muito tempo objeto de debate, contestada por muitos autores como inconciliável com a exigência de que o elemento psicológico da culpabilidade estivesse presente no momento da prática do fato punível. Mas hoje pode-se dizer que a punibilidade de fatos desse gênero é conclusão pacífica na doutrina e nas leis. O que diverge é a fundamentação que se procura dar a essa punibilidade.
Uma posição é a que justifica a punibilidade afirmando se suficiente para isso que a imputabilidade e o elemento subjetivo da culpabilidade e um qualquer das suas formas existam em um dos momentos do processo executivo, e que isso justamente ocorre na actio libera in causa, porque a ação de pôr-se em estado de inconsciência já constitui ato de execução do fato punível, ou alegando-se que basta que o dolo esteja presente no inicio do processo executivo, porque a causalidade, uma vez posta voluntariamente em movimento, opera ao longo de todo processo criminoso até à verificação do resultado. O indivíduo que se põe em situação de inconsciência para, nesse estado, cometer um crime, faz-se instrumento da própria deliberação criminosa.
Nos crimes de ação, na linha norma da causalidade, não será exato dizer que o fato de por-se o agente em estado de inimputabilidade seja um ato executivo do resultado punível. Não será mais do que o do sujeito que se mune de uma arma para ir ao encontro do seu adversário. É mero ato preparatório. É tanto assim que, se o iter criminis se interrompe nessa fase, não há nada a punir, nem se quer a titulo de tentativa. Mas a sua responsabilidade pode justificar-se aplicando-se à hipótese o princípio da causalidade imediata. Na fase de imputabilidade, ele faz de si mesmo o instrumento da sua deliberação criminosa, como o indivíduo que incumbe do desempenho da missão punível a um doente mental ou um menor.
Nos crimes praticados por omissão, em que o sujeito, por exemplo se narcotiza ou se embriaga até à letargia, para faltar àquilo que tinha o dever jurídico de cumprir, a responsabilidade do sujeito, como imputável, está perfeitamente definida, em relação ao resultado punível. A condição posta pelo agente, em estado de imputabilidade, é não só necessária, mas suficiente para que ocorra o resultado. É o ato último do agente na série causal em que ele pode influir. Fez tudo que lhe cabia para que o resultado ocorresse. Ocorrer ou não esse resultado já não depende de ato algum seu, fica entregue ao curso natural dos acontecimentos, no qual o agente não interfere.
Da Culpabilidade – Coação Irresistível e Obediência Hierárquica
Coação é o emprego de força física ou de grave ameaça contra alguém, no sentido de que faça alguma coisa ou não.
Espécies
Coação física: é o emprego de força bruta tendente a que a vítima (coato) faça alguma coisa ou não. P. ex. o sujeito, mediante força bruta, impede que o guarda ferroviário combine os binários e impeça uma colisão de trens.
Coação moral: é o emprego de grave ameaça contra alguém, no sentido de que realize um ato ou não. P. ex. o sujeito constrange a vítima, sob ameaça de morte, a assinar um documento falso.
Qualquer que seja o constrangimento, há de ser apreciado no caso concreto, tendo-se em vista as condições pessoais do coagido.
Em ambas as hipóteses, de acordo com o art. 22 do CP, a coação tem de ser irresistível... “Se o fato cometido sob coação irresistível...só é punível o autor do coação...”. Assim, se o sujeito é coagido a assinar um documento falso, responderá pelo crime de falsidade somente o autor da coação, excluindo o coato.
A coação que exclui a culpabilidade é a moral. Tratando-se de coação física, o problema não é de culpabilidade, mas sim de fato típico, que não existe em relação ao coato por ausência de conduta voluntária.
Da obediência hierárquica
Ordem de superior hierárquico é a manifestação de vontade do titular de uma função pública a um funcionário que lhe é subordinado, no sentido de que realize uma conduta (positiva ou negativa).
A ordem pode ser:
a) manifestamente ilegal, é quando responde pelo crime o superior e o subordinado. P. ex. o delegado de polícia determina ao soldado que exija do autor de um crime determinada quantia, a fim de não ser instaurado inquérito policial. Os dois respondem por crime de concussão ( Cp art. 316, caput). Em relação ao subordinado há uma atenuante genérica (CP, art. 65, III, c).
b) é possível que a ordem emanada do superior hierárquico não seja manifestamente ilegal. É o caso de um bisonho soldado de polícia, por ordem do comandante de escolta, mata com um tiro d fuzil, supondo agir por obediência devida, o criminoso que teta fugir ou opõe resistência passiva ao mandado de prisão. Neste caso, aplica-se o disposto no art. 22, 1º parte do Código Penal.
Obediência hierárquica como
causa de exclusão da culpabilidade
O art. 22, 2º parte, diz o seguinte: “Se o fato é cometido...em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da....ordem”.
No caso de a ordem não ser manifestamente ilegal, embora a conduta do subordinado constitua fato típico e antijurídico, não é culpável, em face de incidir um relevante erro de proibição. Diante disso, o subordinado não responde pelo crime, em face da ausência de culpabilidade. A obediência hierárquica constitui, assim, causa de exclusão da culpabilidade.
Quando a ordem é manifestamente ilegal, o subordinado pode incidir em erro de apreciação, não percebendo a sua ilegalidade. Aí é que surge o erro de direito excludente da culpabilidade, afastada a potencial consciência da ilicitude. Ausente. Incide uma atenuante genérica. (CP, art. 65 III, c)
São requisitos da obediência hierárquica:
a) que haja de direito público entre superior e subordinado – a subordinação doméstica ou eclesiástica não ingressa na teoria da obediência hierárquica. Assim, não há obediência hierárquica (para fins penais) entre pais e filhos, entre bispos e sacerdotes etc.
b) que a ordem não seja manifestamente ilegal.
c) que a ordem preencha os requisitos formais.
d) que a ordem seja dada dentro da competência funcional do superior.
e) que o fato seja cumprido dentro de estrita obediência à ordem do superior. Se o subordinado vai além do determinado pelo superior, responde pelo excesso. Neste caso, o inferior responde pelo crime, não havendo exclusão da culpabilidade.
Presentes os requisitos o subordinado não responde pelo crime por ausência de culpabilidade. O fato criminoso, então, é imputável ao superior. É o determina o art. 22, 2º parte, in fine: “Se o crime é cometido... em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor...da ordem”.
Da Culpabilidade – Doença Mental
O Código Penal em seu artigo 26 nos diz: “É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, do tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter lícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”, isso porque a pessoa no campo da culpabilidade se torna inimputável, pois a imputabilidade é o conjunto de requisitos pessoais que conferem ao indivíduo capacidade de entender o caráter ilícito do fato.
A exclusão da imputabilidade regula-se pelo critério biopsicológico normativo, que exige certos estados mentais anormais podendo ser doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou retardado, nesses casos devem ser constatados a veracidade através de perícia, que deve ser realizada sempre que houver dúvida sobre a sanidade mental do acusado (artigo 149 CPP).
Nessas categorias encontramos também os surdos-mudos não educados, ou que não receberam instrução adequada ou até mesmo o isolamento desse podendo impedir o desenvolvimento mental e afetar a capacidade de discernimento no campo intelectual ou ético. Também estão nessas categorias os silvícolas de quem só impropriamente se pode dizer que tenham desenvolvimento mental incompleto.
O inimputável está sujeito a internação obrigatória, em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, se o fato que realizar corresponder a crime punido com a pena de reclusão. A internação será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não se verificar, mediante perícia, a cessação da periculosidade. O prazo mínimo da internação deve ser estabelecido pelo juiz e será de um a três anos. Se o fato corresponder a crime punido com a pena de detenção, o juiz pode ordenar que o agente seja submetido a tratamento ambulatorial, que também terá, segundo a lei, a duração mínima de um a três anos (artigo 97, parágrafo primeiro do Código Penal.)
Da Culpabilidade –
A Menoridade
De acordo com o artigo 27 do Código Penal: ‘’Os menores de dezoito anos são penalmente imputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”. Mesmo assim o problema do menor infrator é um dos mais graves que nossa sociedade tem enfrentado, já que a solução não é simples.
A constituição Federal em seu artigo 227, nos diz em seu caput: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Talvez se o estado protegesse realmente esses direitos não haveria tantos menores infratores, e o investimento nessas áreas sairia mais barato que a recuperação desse menor.
O que observamos é um movimento para que jovens a partir dos 16 anos já sofram sanções previstos em lei para maiores de 18 anos. De acordo com o Código de Menores (lei nº 6697 de 10/10/1979), o menor de 18 anos e maior que 14, este fica sujeito às medidas de assistência, proteção e vigilância, função esta das F.E.B.E.M.s.
No ECA. (Estatuto da Criança e do Adolescente) lei nº 8069 de 13/07/90, está regida a questão do menor infrator. Caso o menor seja pego em flagrante por um ato infracional ou então por ordem escrita e fundamentada da autoridade judicial competente de acordo com o ECA. artigo 106, poderá o menor ser punido de liberdade, que não poderá ser superior a quarenta e cinco dias e exige decretação fundamentada, diante de “indícios suficientes de autoria e materialidade.
Nos resta a pergunta a ser feita, não seria um erro o legislador usar um critério puramente biológico, idade do autor, não levando em conta o desenvolvimento mental do menor infrator?
Da Culpabilidade –
A Emoção e a Paixão
Não basta a prática de fato típico e ilícito para impor a pena. É necessária para que a sanção penal seja aplicada, a culpabilidade, que é a reprovabilidade da conduta. Por sua vez, a imputabilidade, que é a capacidade da pessoa em entender que o fato é ilícito e de agir de acordo com esse entendimento, é pressuposto da culpabilidade, pois esta não existe se falta a capacidade psíquica de compreender a ilicitude. A inimputabilidade é uma das causas de exclusão de culpabilidade.
Art. 28. Não excluem a imputabilidade penal:
I – a emoção ou a paixão;
II – a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.
1º - é isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapazes de entender o caráter ilícito do fato ou e determinar-se de acordo com esse entendimento.
2º - a pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Nesse inciso I do artigo 28 do Código Penal estão regulados os denominados estados emotivos e passionais. Emoção é um estado afetivo, uma excitação do sentimento, de característica transitória que produz repentina e violenta perturbação do equilíbrio psíquico. Já a Paixão é a emoção em estado crônico, é uma profunda e duradoura crise psicológica que ofende a integridade do espírito e do corpo, o que pode arrastar muitas vezes o sujeito ao crime.
O agente que comete o crime sob impulso de emoção ou de paixão não será excluído de imputabilidade e, assim, nem de culpabilidade. É possível que esse ato tenha cunho patológico, nesse caso será regulado pelo artigo 26 caput, que exclui a culpabilidade.
Embora não excluam a culpabilidade, a emoção e a paixão tem força de diminuir a pena. O Código Penal prevê como atenuante genérica ter sido o crime cometido sob a influência de violenta emoção (incluindo a paixão), provocada por ato injusto da vítima (artigo 65-III letra “c”, última parte). E admite como causa de diminuição especial da pena terem sido praticados o homicídio ou as lesões corporais estando o agente sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima (artigos 121-parágrafo 1º e artigo 129-parágrafo 4º).
Da Culpabilidade –
A Embriaguez
A embriaguez consiste em um distúrbio físico-mental resultante de intoxicação aguda causada pelo álcool ou substância de efeitos análogos, privando o sujeito da capacidade normal de entendimento.
Em relação à seus graus, a embriaguez pode ser completa ou incompleta. Esses graus são divididos por períodos ou fases. É na embriaguez incompleta que está a fase de excitação (a partir de 0,8 gramas por mil de sangue) caracterizado pelo agente em estado de euforia, desinibido, com mímicas exageradas, movimentadas e sem coordenação, atitudes cômicas ou ridículas, mas ainda permanecendo a consciência. A embriaguez completa, está dividida em: fase de depressão (cerca de 3 gramas por mil de sangue) em que o agente não tem mais consciência no que faz ou fala, falta de coordenação motora, movimentação lenta e desaprumada combinadas com confusão mental e erros de percepção; e a fase de sono (cerca de 4 à 5 gramas por mil de sangue) também chamada de letárgica, neste período o ébrio cai e dorme, um sono profundo, pode chegar ao estado de coma, despertar confuso sendo que o agente só poderá cometer crimes omissivos ou comissivos por omissão.
Quanto ao elemento subjetivo do agente, no que diz respeito a embriaguez ela pode ser não acidental ou acidental. A embriaguez não acidental pode ser voluntária ou culposa. Há embriaguez voluntária quando o sujeito ingere substância alcoólica com intenção de embriagar-se. Existe ebriez culposa quando o sujeito não ingere substância alcoólica com a finalidade de embriagar-se, mas em face de excesso imprudente acaba ficando. Na embriaguez não acidental não será excluída a imputabilidade independente do grau de ebriez do sujeito. A embriaguez acidental é a embriaguez fortuita que ocorre em situações em que o sujeito não quer embriagar-se nem fica embriagado por culpa sua. Ela pode ser por caso fortuito ou força maior. No caso fortuito o agente ingere uma substância e desconhece seu efeito inebriante, ficando embriagado. Na embriaguez por força maior o sujeito é obrigado, por terceiro, sem ter responsabilidade, a ingerir bebida alcoólica. Se a embriaguez acidental não excluir nem reduzir a capacidade intelectual ou volitiva do agente, este responderá pelo crime sem atenuação da pena.
Há outros casos de embriaguez como a preordenada, em que o sujeito se embriaga propositadamente para cometer um crime ( caso de actio libera in causa), incidindo sobre a pena uma circunstância agravante, prevista no artigo 61-II letra “l” do Código Penal. Embriaguez patológica é quando o sujeito está predisposto a acessos furiosos mesmo com pequenas doses, como exemplo os filhos de alcoólatras, e assim sendo, aplicar-se-ão o disposto no artigo 26 caput ou parágrafo único. Na embriaguez habitual o efeito passa com a simples suspensão do uso da bebida desde que não haja perturbação da saúde mental.
Apresentar-se publicamente em estado de embriaguez, de modo a causar escândalo ou por em perigo a segurança própria ou alheia, é uma contravenção penal regulada pelo artigo 62 da Lei das Contravenções Penais.
A embriaguez provocada por substância análoga, referida no artigo 28-II, deve ser interpretada como os entorpecentes e estimulantes bem como os alucinógenos. Os tóxicos serão tratados da mesma forma do ébrio etílico. Está regulado pelo artigo 26 do Código Penal o portador de doença mental ou perturbação da saúde mental provocado pelo uso de drogas e, ainda, pelo artigo 19 da Lei n.º 6.368 de 21 de outubro de 1976 ( Lei de Tóxicos).
Conclusão
A culpabilidade passou por inúmeras transformações ao longo da evolução do direito. Seus tipos e requisitos atenderam a cada etapa da vida em sociedade.
Esta parte impressa do trabalho e mais suas contribuições orais não pretendem se tornar um tratado capaz de esvaziar este tema. Quer apenas contribuir para o início de seu debate.
Bibliografia
MIRABETE, Julio Fabbrini. MANUAL DE DIREITO PENAL. Parte Geral. Volume 1. 15ª edição. Editora Atlas. São Paulo, SP
JESUS, Damásio E. de. DIREITO PENAL –Parte Geral. Volume 1. 21ª edição. Editora Saraiva. São Paulo, SP, 1998
MACHADO, Raul. A CULPA NO DIREITO PENAL. 2ª edição. Sem editora. São Paulo, SP, 1943
COSTA JR. Paulo José da. COMENTÁRIOS AO CÓDIGO PENAL. Parte Geral, Volume 1. 3ª edição. Editora Saraiva. São Paulo, SP, 1989
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