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Função Social Do Contrato

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Por:   •  27/11/2014  •  Tese  •  9.693 Palavras (39 Páginas)  •  194 Visualizações

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A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

Sumário: I. Considerações iniciais. II. A funcionalização do negócio jurídico. III. A função social do contrato como causa do negócio jurídico IV. A função social interna do contrato V. A função social interna do contrato e a dignidade da pessoa humana. VI. A função social externa do contrato; VII - O contrato ofensivo a interesses metaindividuais. VIII. O terceiro ofendido. IX. O Terceiro ofensor. X. Considerações finais.

“Comece pelo começo. Siga até chegar ao fim e então, pare”.

Lewis Carrol, em “Alice no País das Maravilhas”.

I – Considerações iniciais

Muito se tem dito e escrito sobre a função social do contrato. Ela vem a reboque da tendência de funcionalização inerente a toda situação jurídica subjetiva. É natural, como em qualquer campo da ciência ou da experiência, que a curiosidade do ser humano o instigue a desbravar o novo, o inusitado. O cuidado com o tema é justificado: o art. 421 do Código Civil de 2002 é uma cláusula geral de grande envergadura e confins ainda imprecisos.

A teoria contratual clássica se enraizou no ensino jurídico com alicerce no dogma da autonomia da vontade. Aos privados se concede um espaço - impermeável ao Estado e a sociedade – no qual se exercita o poder de criação de normas individuais, delimitando-se a função econômica do contrato, ou propriamente a “veste jurídica da circulação econômica” na conhecida acepção de Enzo Roppo.

No paradigma voluntarista o contrato se qualifica como a espontânea submissão do indivíduo à limitação de sua liberdade em três momentos: a) pela liberdade contratual, em seu sentido positivo de livre escolha do parceiro e da estipulação do conteúdo do contrato e ainda, em seu sentido negativo, de liberdade de não contratar – freedom from contract; b) pela intangibilidade do pactuado – o vetusto pacta sunt servanda justificava a obrigatoriedade dos efeitos contratuais. Em outras palavras: o contrato era justo por ser emanado da vontade de pessoas livres, o que significava abstenção do julgador de envolver-se na apreciação do conteúdo substantivo do clausulado, cingindo-se a uma apreciação formalista; c) pela relatividade contratual, isto é, o contrato tão somente vincula às partes, sendo infenso a terceiros, cuja vontade é um elemento estranho à formação do negócio jurídico.

Porém, os signos da modernidade nas estremas contratuais foram submetidos paulatinamente a um amplo rearranjo. A abordagem clássica à disciplina contratual sucumbiu, primeiramente por ascendência de orientações reguladoras, atentas a questão do bem-estar social do welfare state e, mais recentemente, perante uma renovada visão do direito civil na ótica principiológica das Constituições. Este fenômeno conduziu a um declínio tão acentuado das características tradicionais do contrato que não foram poucos que vaticinaram a sua “morte”, uma tendência que mais recentemente tem sido desmentida.

O contrato hoje pode ser conceituado como um instrumento de tutela à pessoa humana, um suporte para o livre desenvolvimento de sua existência, inserindo-se a pessoa em sociedade em uma diretriz de solidariedade (art. 1., III, CF), na qual o “estar para o outro” se converte em linha hermenêutica de todas as situações patrimoniais.

Apesar da Constituição ter a pouco completado a maioridade civil, houve a necessidade da edição de um Código Civil para que a comunidade civilista brasileira despertasse de uma letargia profunda ou de uma espécie de “mal estar constitucional” como tão bem sugere Lenio Streck. Pouco a pouco os amantes do direito privado se comovem com a arte do “desapego”. Repensam a condição de indivíduos segregados e abandonam as suas ilhas e pequenas posses. Migram ao continente e se submetem a filtragem da axiologia constitucional. Convertem-se em seres humanos – valor, fundamento e fim da ordem jurídica. Esmaece a dicotomia público e privado, pela evidente constatação de que não existem locais inóspitos à recepção do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Neste percurso rumo a um direito privado humanizado e , por que não dizer, civilizado, desaba a sacralidade da autonomia da vontade, substituída por uma noção renovada de autonomia privada, atada aos Princípios da Dignidade Humana (art. 1, III, CF) e da Ordem Econômica (art. 170, CF). A autonomia privada é forjada na liberdade do ser humano de edificar a sua própria vida, exercendo o seu consentimento em suas escolhas existenciais e no desenvolvimento das relações patrimoniais.

Uma expressão mais qualificada para localizar a autonomia privada no plano do “ter” seria a locução “autonomia negocial”. A autonomia negocial não é um valor em si, pois se condiciona ao quadro de valores da Constituição em uma linha de direta e imediata de aplicação de suas normas sobre as relações privadas. A Constituição não reduz a autonomia negocial, mas cria mecanismos de controle de sua legitimidade. A liberdade é consentida pelo sistema, pois a ordem econômica não é a corda que asfixia o ser humano, mas aquela que retira a pessoa do pântano que movia o liberalismo.

Muito da atual análise do direito dos contratos é tributário do ressurgimento de uma filosofia jurídica “valorativa” que aditou novos temas àqueles propostos pelo positivismo, procurando redimensionar as funções do fenômeno contratual.

Nada obstante, descabe adotar uma atitude quixotesca a ponto de sepultarmos os princípios clássicos da teoria contratual. Sobrevivem a liberdade contratual, a força obrigatória e a relatividade dos contratos. A finalidade básica do contrato como fonte de obrigações é a persecução dos objetivos demarcados pela autonomia. O sistema deve encorajar as trocas, pois elas traduzem o benefício mútuo que resulta da transação econômica. O contrato é um facilitador da circulação de titularidades e valores, apto a alicerçar a confiança nas promessas, promovendo a intersubjetividade.

Todavia, o solidarismo constitucional adicionou à autonomia privada a companhia de outros três princípios: A boa-fé objetiva; a função social do contrato e a justiça (ou equilíbrio) contratual. Estes três princípios não restringem a autonomia privada, pelo contrário: valorizam-na, equilibrando aquilo que a realidade crua tratou de desigualar, afinal o poder da vontade de uns é maior de que o de outros. Na arguta observação de Teresa Negreiros, vivencia-se uma hipercomplexidade, um amálgama entre os princípios clássicos e contemporâneos, como modelos que convivem simultaneamente.

Este

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