O Princípe Nicolau Maquiavel
Artigo: O Princípe Nicolau Maquiavel. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: ccos • 31/8/2014 • 4.256 Palavras (18 Páginas) • 417 Visualizações
O PRÍNCIPE DE MAQUIAVEL
1. Introdução
Bem conhecido tem sido um dos destinos das obras clássicas: o de enfeitar
prateleiras de bibliotecas cujo propósito é a decoração do ambiente, na medida em que
exibi-las funciona como indicador de prestígio social. Lê-las, estudá-las, proceder a sua
exegese, relacioná-las a um determinado contexto da história e examinar criticamente
as contribuições momentâneas ou duradouras que contém é tarefa a qual cada vez
menor número de pessoas tem se dedicado. É assim que comentários com base em
estereótipos, em chavões, no “achismo” ou no “ouvi dizer” costumam tomar o lugar da
investigação séria e ocupar largo espaço no imaginário social, deturpando e tornando
inteligíveis relevantes contribuições. Há também o caso citações que feitas a esmo,
descontextualizadas, torcem totalmente o sentido original de uma formulação teórica
notável, levando a que obras de pesquisadores do porte de Darwin, Marx e Freud,
entre outros, sejam primeiro transformadas em caricaturas e depois temas de
animados debates pseudo-intelectuais.
A respeito do exposto lembra Claude Lévi-Strauss, expoente da antropologia em
meados do século XX, as liberdades que tomaram alguns de seus críticos:
“Entre os críticos contemporâneos, o Sr. Rodinson não é
certamente o único a achar normal refutar um autor a partir de
alguns fragmentos. Outras liberdades são mais raras;
notadamente a que consiste em utilizar falsas citações. É no
entanto, o que faz o Sr. Rodinson em seu último artigo pondo em
itálico e entre aspas três linhas que ele me atribui e cuja
referência dá em nota (Race et Histoire: pg. 40). Remeta-se ao
1 Cassirer cita a máxima romana: “A sorte de um livro depende da capacidade de seus leitores”.
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texto: elas não estão aí e não me lembro de tê-las jamais escrito
(Levi-Strauss, 1970: p. 357).
Pior ainda o destino de uma pequena/grande obra escrita em Florença: “De
Principatibus” (1513)2, de autoria de Niccolo di Bernardo del Machiavelli (1469/1527).
Pequena obra quanto à extensão e grande quando ao conteúdo. O manuscrito passou
inteiramente despercebido durante a vida do seu autor. Publicado por seus filhos em
forma de livro anos após a sua morte, a rejeição a O Príncipe logo nasceu e cresceu.
Rejeição que marcou a trajetória do livro durante séculos e que tendo o maquiavelismo
como centro produziu muita condenação e pouca luz. De modo geral, lido de má-fé,
sem método ou simplesmente citado sem ao menos ter sido consultado, O Príncipe
transformou-se num símbolo da trapaça, o número um da galeria dos livros malditos.
2. A Trajetória d´O Príncipe
A trajetória inglória de O Príncipe remonta a 1559 quando foi colocado no
Índex pelo Papa Paulo IV. Em 1564 o huguenote Inocêncio Gentillet publicou “Contre
Nicholas Machiavel” acusando-o de inspirador do massacre da noite de São
Bartolomeu. Logo em seguida o Padre Luchesini escrevia um ensaio intitulado “Saggio
sulle sciocchezze di Machiavelli”. (Ensaio sobre as sandices de Maquiavel). Eduard
Meyer, examinando a literatura Elisabeteana do século XVII, contou nada menos que
trezentos e noventa e cinco referências feitas a Maquiavel sempre com sentido
pejorativo: crime, covardia, brutalidade, etc. “Ele era o causador de todos os males, o
autor de todas as desgraças. Na Inglaterra chegaram a afirmar que o nome dado ao
diabo procedia do seu. “Nick Machiavel hed neer a trick. Tho gove his name to our old
Nick”. (citado por Ferrara, 1952:254).
No século XVIII, Frederico II publicou “O antimaquiavel”. Para termos uma idéia
do conteúdo estereotipado deste livro basta citar as primeiras palavras da introdução:
“Constitui O Príncipe de Maquiavel, em matéria de moral,aquilo
que constitui a obra de Espinosa em matéria de fé: Espinosa
solapou os fundamentos da fé, não se propondo nada menos do
2 Originalmente Principatibus (Principados) era o título do manuscrito. Tornou-se mais conhecido como II
Principe (O Príncipe). Existem diversas edições da obra publicadas no Brasil.
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que destruir toda a religião; Maquiavel corrompeu a política, e
teve em mira destruir os preceitos da sã moral”. (Frederico II,
1967: pág. 144).
Prefaciando o livro, Voltaire, protegido do então príncipe herdeiro da Prússia,
maquiavelicamente criticava o “venenoso Maquiavel”.
Apesar das limitações impostas pelo contexto teórico de suas épocas alguns
espíritos argutos, entre os quais Bacon, Espinosa, Hélder, Rousseau, Hegel e Marx,
tentaram compreender escritos de Maquiavel, entre os quais O Príncipe, fora dos
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