Uma revisão crítica do livro o negro no futebol brasileiro. Mário Rodrigues Filho
Resenha: Uma revisão crítica do livro o negro no futebol brasileiro. Mário Rodrigues Filho. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: sancthuz • 15/5/2014 • Resenha • 3.173 Palavras (13 Páginas) • 465 Visualizações
Que o futebol é um esporte que nasceu inglês, todo mundo sabe. Que encontrou o seu berço esplêndido na terra de Iracema, todos também sabem. Que o futebol tem um padrasto genial e torcedor ululante na figura inesquecível de Mário Rodrigues Filho (1908-1966), muitos sabem, e isto é fato.
Mas saber que ele foi o inventor do futebol como espetáculo épico como todos conhecem, sociólogo do esporte bretão e pai da crônica futebolística, isso poucos sabem.
Para quem não sabe, vale a pena ler e conhecer a obra do escritor e filósofo da bola Mário Filho, autor de O NEGRO NO FUTEBOL BRASILEIRO, livro editado pela primeira vez em 1947, e que ganha nova edição, pela Editora Mauad X. Empírico e rapsodo da bola, Mário Filho criou o jornalismo esportivo como conhecemos hoje, concebeu e nomeou o Estádio Municipal do Maracanã, inaugurou o clássico Fla-Flu e criou o Torneio Rio-São Paulo, que se tornaria o Torneio Roberto Gomes Pedrosa (vulgo “Robertão”), embrião do Campeonato Brasileiro.
MITO FUNDADOR
Ciente de que o Brasil era uma geléia geral e que o futebol era algo mal assistido, Mário Filho decidiu intervir. Se ninguém se habilitara a contar a história do começo, ele mesmo se debruçaria sobre o assunto: alguma coisa como teoria e prática do futebol-arte.
Em seu livro, ele revela: o primeiro clube a aceitar um jogador negro foi o Bangu, e o carioca Vasco da Gama foi o precursor a colocar um time racialmente misto em campo. Por mais incrível que pareça, no começo, o futebol dos grandes clubes era interdito aos negros.
Para poderem jogar, eles usavam toucas para esconder o cabelo crespo e se maquiavam com pó-de-arroz para clarear a pele. Para entrarem pela porta da frente, eles tinham que se passar por pessoas brancas.
O próprio apelido de “pó-de-arroz”, não é gratuito: ele nasceu da necessidade de certos jogadores que, por mais geniais e convincentes que fossem, rescindissem do fato de serem brancos para demonstrarem sua arte.
Foi a partir da questão da nacionalidade e do fetiche particular de Mário Filho pelo futebol que O NEGRO NO FUTEBOL BRASILEIRO veio à lume.
Escrito com texto vigoroso, importante material histórico e de caráter épico, o livro é uma referência de pesquisa da história do esporte bretão. Principalmente porque a bibliografia a respeito do assunto é rara e restrita, e a obra de Mário Filho é, antes de tudo, o seu mito fundador. É pelo fato de ser oriundo de um tempo em que a sociologia brasileira engatinhava (Casa Grande e Senzala, por exemplo, é de 1933) e advinha de um pensamento ora ufanista, ora pessimista (vide Afonso Celso, Nina Rodrigues ou Paulo Prado), Mário colocou a sua visão particular.
Como dizem alguns, ele atribuiu ao seu livro uma aura acadêmica. Particular porque, com exceção de estudos formais sobre sociologia, em quando ele começou a escrevê-lo, não havia o que consultar, a não ser arquivos de jornais e o material que ele começava a documentar no seu revolucionário Jornal dos Sports.
O livro é audacioso. A despeito de uma pretensa objetividade ao analisar os fatos, Mário Filho se aproxima um pouco do pensamento que seu irmão viria a imprimir na crônica esportiva, com um verniz de imaginação. Esse é o fator questionado por seus detratores. A discussão teórica sobre o futebol foi superestimada ao paroxismo de que O Negro... se tornou um suporte teórico com fundo falso.
Como dizia Nelson Rodrigues, todos os eventos épicos tinham sempre o seu Homero, o seu Dante à mão, a fim de ser o seu rapsodo. O objetivo de Mário é justamente este: ser o Homero do futebol. Mario Filho pretendeu fazer a genealogia do esporte mais popular do Brasil e explicar a forma como negros e mulatos ingressaram no futebol carioca do início do século 20. Ele revela que, num País mulato, somente brancos ricos tinham o direito de correr atrás de uma bola importada. Mais: o que definia a formação dos times era a cor da pele e a composição da “assistência”, enquanto os cariocas se questionavam sobre a necessidade de incluir pretos num escrete.
Eles diziam: pra que negros, se times de brancos eram campeões no Rio? Fluminense, América, Botafogo e Flamengo. Mulatos ou negros inexistiam na paisagem futebolística. E não era apenas no Rio de Janeiro. Homens de cor eram segregados também no Rio Grande do Sul. Por conta disso, jogadores negros criaram a Liga da Canela Preta, no final da década de 20.
Negros só foram aceitos, a princípio, no Internacional que, com um time misto, criou a primeira revolução futebolística no estado, criando o mítico Rolo Compressor. O preconceito racial do Grêmio, por exemplo, só acabaria em 4 de março de 1952, com Osmar Fortes Barcellos, o Tesourinha, contratado pelo time tricolor. Até então ídolo da torcida colorada e reconhecido como um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro, apresentou-se na Baixada como primeiro reforço negro do clube, depois de fazer fama nos gramados do Inter e do Vasco da Gama.
No começo, futebol era um esporte classudo. Só os bem-nascidos tinham acesso a ele. Coisa de inglês. Negros e mestiços (ou creoles) só conseguiram ocupar seus espaços graças aos embranquecimentos artificiais. Foi o pó-de-arroz usado pelos jogadores mulatos que deu nome à torcida do Flu. Carlos Alberto, tricolor, usava o produto no rosto para camuflar-se. O lendário Friedenreich alisava o cabelo. Obstinado, Robson era “pó-de-arroz”. Crivado de olhares preconceituosos, uma vez ele disse: "Eu já fui preto e sei o que é isso”.
O NEGRO NO FUTEBOL BRASILEIRO é cheio de historietas desse tipo. Mário Filho é capaz de emocionar, não sem nos deixar vermelhos de vergonha. Principalmente porque, apesar de Mário Filho, o preconceito ainda vive. Por incrível que pareça, Mário também é considerado mentor desse “preconceito”.
Em A Invenção do País do Futebol – Mídia, Raça e Idolatria, os autores Ronaldo Helal, Antonio Jorge Soares e Hugo Lovisolo entendem que o livro pioneiro de Mário se equivoca justamente no enfoque sociológico, ao afirmar que o negro teria sido o criador da ginga, do drible, do estilo brasileiro de se jogar futebol.
INVENÇÃO E CONSTRUÇÃO
Para eles, a utilização de O NEGRO NO FUTEBOL BRASILEIRO por sociólogos criou uma espécie de interpretação única, com os ideais da construção de uma nação brasileira com menos antagonismos entre as raças. Antonio Jorge Soares reconhece a qualidade do livro, mas diz que o livro foi utilizado de maneira equivocada pelos cientistas sociais. De fato, quando os estudiosos decidiram se debruçar
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