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Judith Butler traz reflexões teóricas acerca do Segundo Sexo de Simone de Beauvoir

Por:   •  30/10/2018  •  Abstract  •  1.395 Palavras (6 Páginas)  •  241 Visualizações

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Judith Butler traz reflexões teóricas acerca do Segundo Sexo de Simone de Beauvoir, na qual a autora analisa criticamente alguns pontos importantes da obra beauvoiriana no que trata da construção do gênero na sociedade e a ideia de “corpo vivido” a partir de um contexto histórico. Butler ainda faz um paralelo de Beauvoir com Jean-Paul Sartre em que percebe as semelhanças analíticas desta com a filosofia existencialista presente no livro O Ser e o Nada do autor. Mais ao final, Judith Butler procura preencher as lacunas que encontra em Beauvoir utilizando de determinadas ideias de Monique Wittig e de Michel Foucault a partir do questionamento de restrições binárias na definição de gênero – algo que para a autora Beauvoir não conseguiu alcançar.

Butler (1986, p. 35) inicia sua colocação baseada em uma das máximas de Simone de Beauvoir “não se nasce mulher, torna-se” e apresenta a formulação teórica da autora em que distingue sexo de gênero e sugere que este é uma perspectiva adquirida gradualmente. A distinção entre sexo e gênero é uma pauta crucial dos esforços feministas para desmitificar a ideia de que essa anatomia trata-se de destino em que “sexo é entendido como o aspecto invariante, anatomicamente distinto e factual do corpo feminino, considerando que gênero é o significado cultural e forma que esse corpo adquire” (Butler, 1986, p. 35). A autora centraliza a principal ideia beauvoiriana de que gênero não é natural.

Por meio dessa ideia,

“o termo 'feminino' designa um conjunto fixo e idêntico de fatos corporais naturais (uma presunção, a propósito, que é seriamente desafiado pelo continuum das variações de cromossomos), e o termo 'mulher' designa uma variedade de modos pelos quais esses fatos adquirem significado cultural (Ibid., p. 36).

Deste modo, Butler sinaliza que o gênero está intrinsicamente ligado à interpretação do corpo dado de forma cultural, como uma modalidade de atribuição e percepção de possibilidades. E destaca que o verbo “tornar” é ambiguo na teoria beauvoiriana em que é mais do que uma construção de identidade como também um processo de contrução do eu em sua existência, utilizando-se de Sartre na encarnação do ser mulher ao assumir determinado estilo e significado do próprio corpo. Trata-se, então, de adquirir habilidades e da ideia de projeto não de um corpo-objeto, e sim e de um “corpo vivido”.

Atualmente, em certa medida, tem-se “gênero como passivamente determinado, construído por um sistema personificado de  patriarcado ou linguagem falogocêntrica que precede e determina o assunto em si” (Ibid., p. 36). Butler, dessa maneira, procura demonstrar como Beauvoir em sua ideia de “tornar-se” um gênero reconcilia uma ambiguidade interna entre projeto e construção. Neste caso, ambos são ao mesmo tempo escolha e aculturação e mantém uma relação opositiva indeterminada e ocorre de forma reinterpretativa de uma papel existencial em que, segundo Butler, a escolha do gênero é consequentemente “a incorporação  de responsabilidades dentro de uma rede de normas culturais profundamente enraizadas”  (Ibid., p. 37).

Na sessão seguinte, Judith Butler (1986, p. 38) trata de como Beauvoir absorve as ideias de corpos sartreanos e fantasmas cartesianos num esforço em radicalizar o primeiro ao estabelecer uma ideia corpórea de liberdade. Ainda que a argumentação de Sartre está em que “o corpo é coextensivo com identidade pessoal ("eu sou meu corpo"), ele também sugere que a consciência está em certo sentido além do corpo ("Meu corpo é um ponto de partida que eu sou e que ao mesmo tempo eu supero)” (Ibid., p. 38). Butler indica ser necessário conceber essa auto transcedência do corpo como um fenômeno não estático e sim intencional, de força direcionada e modo de desejo. Igualmnete relaciona o uso do termo “existir’ por Sartre e “tornar-se” por Beauvoir, em que considera o segundo uma extensão e concretização da formulação sartreana a partir do qual Beauvoir “se apropria da necessidade ontológica do paradoxo, mas a tensão em sua teoria não reside entre estar "dentro" e "além" do corpo, mas no movimento do natural ao corpo aculturado”  (Ibid., p. 39).

Na concepção de Butler (1986, p.39) ao “misturar a fraseologia sartreana com Simone de Beauvoir, poderíamos dizer que o “existir” em um corpo em termos culturalmente concretos significa, ao menos parcialmente, tornar-se gênero”. Ela atenta que o “sexo” vivido ou experimentado já é uma experiência de gênero, concluindo que torna-se gênero a partir de um local que não pode ser identificado ou ainda afirmado que existe.

Dando continuidade em sua ánalise, ela provoca criticamente a ideia beauvoiriana de gênero como uma escolha. Dá-se assim, a partir do momento em que é de entedimento que essa escolha é uma interpretação das normas de gênero que devem ser reorganizadas e afirma que “esta não é uma tarefa prescritiva que devemos nos esforçar para fazer, mas na qual temos nos esforçado durante todo o tempo” (Ibid., p. 40). A autora cita Michelle Doeuff que procura analisar até que ponto esse pensamento não seria uma culpabilização do oprimido em escolher voluntariamente essa posição enquanto Butler aponta que o fenômeno da vitimização de Beauvoir é essencialmnete contigente de modo a lembrar que as normas de gênero persistem unicamente porque os seres humanos mantêm-se dando vida a estas. Deste modo, ela defende que Beauvoir sabe que não trata-se apenas de escolhas até porque a origem de sistemas opressivos são complicados, e sim de que tais normas são insistentemente assumidas no presente por meio de estratégias individuais mais ou menos disfarçadas – um voluntarismo performativo.

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