O Ornitorrinco de Francisco de Oliveira
Por: Delci Teixeira Coutinho • 26/9/2022 • Resenha • 1.456 Palavras (6 Páginas) • 130 Visualizações
O ornitorrinco: será isso objeto de desejo?
Na sociedade brasileira o mais arcaico convive com o mais moderno. Um país que guarda profundas aberrações, com a mais extrema miséria dividindo a paisagem com condomínios de luxo. Este país é comparado com o ornitorrinco pelo sociólogo Francisco de Oliveira. O ornitorrinco é um fenômeno estranho da natureza, um tipo indefinido entre mamífero e réptil. Um animal que não se definiu na evolução. Para Oliveira, o Brasil é o ornitorrinco. Uma nação onde o atraso tornou-se parte da sua estrutura e passou a ser mesmo parte de seu funcionamento.
O Ornitorrinco é uma espécie de equívoco de Deus. Tem um rabo de réptil, mamas que não tem peitos, mas escorrem pelos, esporão venenoso, bota ovo e tem bico de pato. Para o autor só Darwin(1809-1882) o reconheceu como bicho. Francisco de Oliveira utiliza o Ornitorrinco para descrever a sociedade brasileira no estágio em que chegou. Ela convive em seu corpo várias idades da evolução, tendo os muito ricos e os miseráveis, os apartamentos de 1000 metros quadrados e as favelas de 10 metros quadrados. Diferenças abissais, que Chico de Oliveira aponta que a sociedade brasileira não é fruto do atraso.
Nessa perspectiva, Francisco pontua que é cultural atribuir tudo ao passado, e que evidentemente o peso do passado é imenso, afinal nos legou o escravismo por anos, uma vez que a sociedade brasileira se forma pelo trabalho escravo. O autor com sua obra ainda deixa evidente que parte da nossa forma de ser deve-se a preeminência dessa forma de escravidão que se penetrou por todos os povos da sociedade brasileira.
ESCRAVISMO – REBAIXOU A DIGNIDADE DE HOMENS E MULHERES
Francisco mostra que essa herança é pesada, mas o ornitorrinco (Brasil) não é um produto do atraso. A ideia é que sobre essa formação do atraso, montou-se um sistema econômico que tem setores mais avançados funcionalizando-a.
SETORES MAIS AVANÇADOS FUNCIONALIZAM O ATRASO
A esperança é que a industrialização fosse capaz de derrogar de uma vez por todas os estigmas do atraso brasileiro e daquilo que ele nos legou. Logo, as formas superiores do capitalismo, corresponderia a formas superiores de política e de sociabilidade. A história política pregou na sociedade brasileira uma peça formidável, porque o capitalismo foi capaz de armar esse bicho estranho funcionalizando aquilo que era atributos do atraso.
O ATRASO QUE FUNCIONA
A favela era uma solução precária dos povos viverem na cidade e que a promessa moderna era a de substituir a favela por casas, residências com o mínimo de dignidade. A favela ao invés de extinguir-se, expandiu grandiosamente, acolhendo não camponeses, mas tornando-se um lugar dos pobres da sociedade brasileira.
Para Francisco de Oliveira funcionar a pobreza é tonar o atraso o ovo do ornitorrinco com suas mamas. O ornitorrinco funcionaliza a pobreza. Para os socialistas do século XIX e do século XX a pobreza era um desafio do século XX e do princípio do século XXI. A pobreza é funcional para o funcionamento do sistema.
A INCLUSÃO QUE EXCLUI
Francisco, na época da escrita do Ornitorrinco pontua a quantidade de desempregados vendendo as sobras das feiras e produtos dos contrabandos do Paraguai. Ressalta que essas pessoas não estão desocupadas, elas estão desempregadas. O capitalismo logra essa façanha.
DESEMPREGADOS, MAS NÃO DESOCUPADOS
O Capitalismo logra a essa façanha de se tornar aquilo que Karl Marx (1818-1883) pensava como exército de reserva. O Capitalismo consegue tornar a população desempregada em funcional para o seu funcionamento.
O autor fala que os piedosos trazem uma ideia de INCLUSÃO SOCIAL, como se no mundo da mercadoria houvesse alguém excluído. O mundo da mercadoria inclui a todos, mesmo esses que estão desempregados, estão incluídos no circuito da comercialização. Nenhum dos produtos provinham da atividade pessoal. São todos produtos industrializados, ou seja o Brasil refuncionalizou a miséria, desemprego, migração (campo-cidade), e migração dentro da própria cidade.
Francisco pontua ainda que os bem intencionados criam ONGs para socorrer a pobreza dando dignidade a essas pessoas e os constituindo como cidadãos.
ESTADO DE EXCEÇÃO
Na sociedade brasileira, o estado de exceção virou regra. Para o sociólogo Francisco de Oliveira é um problema grave que tem precedente perigoso. O estado de exceção foi pensado pelos constituintes de Weimer como uma espécie de vávula escape para romper a força renovadora, pensando na proteção da democracia. Todos os estados modernos possuem em suas constituições o Artigo 48 dessa Constituição de Weimer. Esse artigo trata em situação excepcional a regra de poder cedida para dar lugar a uma solução que assegure a permanência de valores e regras democráticas. O capitalismo contemporâneo burlou e transformou a exceção em regra. Para o autor, vivemos em um estado de exceção. A cidade é por excelência esse estado de exceção, sendo o lugar em que a norma transmutou em sua burla permanente. Essa burla vem de baixo, considerando o desemprego uma fatalidade e que o mesmo não é conjuntural, mas que veio para ficar. No Brasil, como exemplo desse estado de exceção temos a manutenção da pobreza, funcionalizando-a a favor do capitalismo.
É UM ESTADO QUE RENUNCIOU A PROMESSA DA MODERNIDADE DE ELEVAR TODOS OS CIDADÃOS À CONDIÇÃO DE IGUALDADE.
O Brasil se constituiu fora da moeda. Há uma repetição das dependências dos avanços, desenvolvimentos e conquistas de outros países. O sociólogo Francisco faz uma dura crítica, pontuando que o Brasil perdeu a autonomia e a capacidade de criar ele próprio o seu próprio caminho.
A sociedade brasileira perdeu a autonomia de criar ela própria o seu caminho. O capitalismo contemporâneo detesta a política. Ele se constitui como exceção exatamente nesse aspecto, ao colonizar internamente a política.
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