Dez teses sobre movimentos sociais
Por: alinesantos74 • 1/6/2016 • Artigo • 6.807 Palavras (28 Páginas) • 560 Visualizações
Linha de Pesquisa: Processos políticos e realidade histórica dos movimentos sociais
1. As Teorias dos movimentos sociais: um balanço do debate - Ângela Alonso
Resumo: este artigo apresenta as três principais teorias de explicação dos movimentos socais, constituídas nos anos 1970; a Teoria de Mobilização de Recursos, a Teoria do Processo Político e a Teoria dos Novos Movimentos Sociais. Em seguida, mapeiam-se as reformulações de que essas teorias foram objeto, seja em reação às críticas recebidas, seja para fazer face às mudanças empíricas das últimas décadas, que acentuaram as dimensões cultural e transnacional do ativismo.
Nos anos 1960, tanto na Europa, sede do totalitarismo, quanto nos Estados Unidos, a pátria da sociedade de massas, ressurgiram as mobilizações. Não se baseavam em classes, mas sobre etnia (o movimento pelos direitos civis), gênero (o feminismo) e estilo de vida (o pacificismo e o ambientalismo). Não visavam a revolução política, no sentido de tomada do poder, nem cabiam nos dois grandes sistemas teóricos do século XX, o Marxismo (conjunto de concepções elaboradas por Karl Marx 1818-1883e Friedrich Engels 1820-1895, que influenciaram profundamente a filosofia e as ciências humanas da Modernidade, além de servir de doutrina ideológica para os países socialistas, reunião dos movimentos de natureza política, econômica, social, cultural etc., fundamentados nessas concepções) e o funcionalismo (procura explicar aspectos da sociedade em termos de funções. Para ele, cada instituição exerce uma função específica na sociedade e o seu mau funcionamento significa um desregramento da própria sociedade. A sua interpretação de sociedade está diretamente relacionada com o estudo do fato social, que, segundo Émile Durkheim, apresenta características específicas: exterioridade e a coercividade. O fato social é exterior, na medida em que existe antes do próprio indivíduo, e coercivo, na medida em que a sociedade se impõe, sem o consentimento prévio do indivíduo). Tratava-se de “movimentos”, no sentido de ações coordenadas de mesmo sentido acontecendo fora das instituições políticas. Eram jovens mulheres, estudantes, profissionais liberais que buscavam não mais as condições de vida e a redistribuição de recursos, mas a qualidade de vida e a afirmação da diversidade de estilos de vivê-las. Eram movimentos sociais, não eram revoluções.
Este novo fenômeno demandava nova explicação. Nos anos de 1970, três famílias de teorias dos movimentos sociais se apresentaram:
1. Teoria da Mobilização de Recursos (TMR);
2. Teoria do Processo Político (TPP);
3. Teoria dos Novos Movimentos Sociais (TMNS).
A TMR, pensada por McCarhy e Zald (mais importante que identificar as razões seria explicar o processo de mobilização), aplicou a sociologia das organizações ao seu objeto, definindo os movimentos sociais por analogia com uma firma. A racionalização plena da atividade política fica clara no argumento da burocratização dos movimentos sociais, que gradualmente criam normas, hierarquia interna e divisão do trabalho. Quanto mais longevos, mais burocratizados os movimentos se tornariam. A longevidade dependeria da capacidade dos movimentos vencerem a concorrência em torno de recursos materiais e de aderentes a serem garimpados num mercado de consumidores de bens políticos.
A TMR avalia os movimentos sociais igualando-os a um fenômeno social como outro qualquer, dotado das mesmas características que os partidos políticos. A explicação privilegia a racionalidade e a organização e nega relevo a ideologias e valores na conformação das mobilizações coletivas. A TMR, por causa destas características gerou antipatia na esquerda, foi pouco influente na Europa e América Latina, só teve impacto na América do Norte.
A TMR recebeu muitas críticas:
a) Foi contra as teorias excessivamente culturalistas e inflou a faceta racional e estratégica da ação coletiva.
b) Supõe-se a presença de crenças e processos cognitivos na formação da ação coletiva, mas não se sabe o modo de operação.
c) Pressupõe um ator individual, sem levar em conta o problema da formação de uma identidade coletiva.
d) Prima por uma análise conjuntural, sem vincular os movimentos a macroestruturas ou processos de longo alcance.
Este enquadramento macro-histórico aparece nas duas outras teorias a TTP e a TNMS. Estas teorias se insurgiram contra explicações deterministas e economicistas da ação coletiva e contra a ideia de um sujeito histórico universal. Estas teorias repelem a economia como chave explicativa e combinam política e cultura na explicação dos movimentos culturais. Contudo a TPP investe numa teoria da mobilização política enquanto a TNMS se alia numa teoria da mudança cultural.
A TPP foi constituída nos Estados Unidos, mas engloba casos europeus em suas análises. Tilly, o grande pensador desta teoria, construiu uma sociologia política histórica, que combina tradições e cuja ambição é identificar os mecanismos que organizam os macroprocessos políticos no Ocidente, por meio de comparação entre casos. Tilly critica a tradição sociológica por ter segregado o estudo das disputas entre elites da análise dos movimentos populares, pois ambos são racionais e pertencem a uma única classe de fenômenos. A distinção entre eles é de grau de organização e de uso da violência. A prevalência de uma dessas formas (disputas entre elites e movimentos populares) depende de dois parâmetros: um político, outro histórico-cultural.
O parâmetro político e dado pelo conceito de Estrutura de Oportunidades Políticas – EOP. Argumenta-se que quando há mudanças nas EOPs, isto é, nas dimensões formais e informais do ambiente político, se abrem novos canais para expressão de reinvindicações para grupos socais fora da política. Estas mudanças na EOPs podem ocorrer: pelo aumento de permeabilidade das instituições políticas às reivindicações da sociedade civil, provocadas por crises na coalizão política no poder; por mudanças na interação política entre o Estado e a sociedade (redução da repressão a protestos e aliados potenciais).
Em EOP favoráveis, grupos insatisfeitos organizam-se para expressar suas reinvindicações na arena pública. Como na TMR, a TPP, supõe a coordenação do movimento para produzir um ator coletivo, mas estes agentes coletivos não são preexistentes, eles se formam durante o processo contencioso. A TPP adiciona um elemento cultural à explicação, a solidariedade (pertencimento a uma categoria e a densidade do vinculo dos membros do grupo entre si). Porém a solidariedade, não gera ação, precisa de estruturas de mobilização: recursos formais (organizações civis) e informais (redes sociais). A mobilização é o processo pelo qual um grupo cria solidariedade e adquire controle coletivo sobre os recursos necessários para sua ação. Mas tudo isso, diferente da TMR, só configura um movimento social diante de oportunidades políticas favoráveis. A TPP delimita as possibilidades de escolha dos agentes entre cursos de ação. A mobilização baseia-se num conflito entre partes, uma delas ocupando momentaneamente a posição do Estado, e a outra em nome da sociedade. Os atores migram entre estas posições de “detentores de poder” e “desafiantes”. Um movimento social é definido, então, como uma “interação contenciosa”, que envolve demandas mútuas entre desafiantes e detentores do poder, em nome de uma população sob litígio.
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