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ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA: Uma relação entre Maquiavel, Hobbes e Locke

Por:   •  30/10/2019  •  Ensaio  •  1.591 Palavras (7 Páginas)  •  297 Visualizações

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ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA: uma relação entre Maquiavel, Hobbes e Locke

Fábio Daniel dos Santos Cardoso

Começo com muito gosto tal reflexão, pois tanto a matéria quanto o filme foram de demasiado valor para a vida, não só acadêmica como pessoal. Neste breve texto, abordaremos uma discussão um tanto quanto abstrata, por tanto, passível de muito atenção ao fazê-la. Relacionaremos Maquiavel, Hobbes e Locke ao filme Blindness.

Por ordem cronológica, começaremos com Maquiavel, muito visível na figura do Contador, pois o mesmo não tem a ambição de ser o comandante do meio, mas tem severo desejo de que o governante siga firme, claro, pelos seus conselhos. Para ele, como para Maquiavel (se me for permitida tal erudição), tal regime pode e deve continuar, caso ele esteja do lado governante e não do lado governado, ainda mais se tal governo seja totalmente autoritário e centralizador de poder, oprimindo assim uma grande parcela do população e as privando de certos direitos, ou os provendo mediante de condições impostas pelo mesmo.

Claro, não é de todo mal se no fim, seus meios acabem justificados, o que não acontece com a monarquia instaurada na zona de isolamento. O líder então, temido e não amado acaba, por uma revolta do povo, acaba deposto e os habitantes acabam livres, sem o agente dominador de sua liberdade, porém ainda sem a sua visão, parte importantíssima para a continuação desta reflexão.

Nós, quando paramos e pensamos estar na mesma situação que os integrantes do filme, talvez não demos tal importância pois ser algo, talvez, tão longe de nossa realidade. Acontece que nós vivemos isso todo dia, estamos na maior parte do tempo cegos para o que não nos importa e extremamente atento para o que é nos dado em forma de distração. Um exemplo de tal afirmativa aplicado no filme, se dá quando o Ladrão ignora totalmente o fato do homem ter tido uma cegueira súbita e se preocupa mais com se dar bem no final das contas, esquecendo assim o

problema do próximo e pensando em beneficiar apenas a si mesmo, e isso é bem mais comum do que absurdo.

A frase clássica de Hobbes, diz que “o homem é o lobo do homem”, nos faz entrar na segunda parte de nossa discussão em relação ao regime absolutista instaurado na unidade de isolamento. Como é de comum conhecimento, Hobbes era favorável a monarquia, estabelecendo que o indivíduo abriria mão de sua liberdade em troca de segurança (vulgarmente falando), o que acarreta num monopólio da fora em nome do bem estar maior, o que fica evidente ser um grande equívoco na situação do campo de concentração onde tais cegos estão.

O Rei da Ala 3, por sua vez, detém o monopólio dos recursos e os distribui mediante a certo pagamento, seja em bens ou em trabalho, muitas vezes sendo arbitrário e desleal, não pagando o certo, pelo certo. É desolador ver o povo se desfazer de seus bens mais preciosos, muitas vezes de sua vida ou sua dignidade, em troca da manutenção de sua vida. O que nós temos aqui é a concessão do direito de viver, por meio das mãos do Rei, que os mantém seguros dos demais, mas não seguro dele, o que nos leva a pensar se, de fato, tal regime seja saudável.

O conceito de liberdade nos é muito abstrato até hoje. Parando para refletir o que somos livres e o que nos é regulado pelo governo, sobre o embasamento ético e moral, sobre as leis de deus, liberdade nos parece um pouco distante. Claro, não há dúvida que tais regulamentos sejam de extrema necessidade, dado que o homem em seu estado de natureza, principalmente para Hobbes, faz a guerra. E o que seria a guerra além de um estado de caos? Podemos notar que a vontade é a guia no pensamento Hobbesiano de natureza humana e que, o ser humano livre e desejante, pode vir a sobrepor o seu desejo à vontade do outro, o privando assim de liberdade no final das contas, fato amplamente observado na relação Primero Homem Cego e Ladrão. No instante onde o Primeiro Homem Cego percebe que o Ladrão levou seu carro, ele deseja do fundo de seu âmago que o mesmo tenha o um fim igual ao dele e ele acaba tendo. É óbvio que nem o Ladrão, nem ninguém, gostaria de perder uma parte tão importante de si, me arrisco a dizer, o instrumento mais importante de liberdade, a visão. Porém, o que acontece ali é a sobreposição

da vontade de um, na vida do outro, o querer amargo e instantâneo concretizado com privação de liberdade, o que me leva a pensar se tal fenômeno de cegueira coletiva não tenha acontecido de forma similar em todos os casos, seja explícito ou implícito, pois a única pessoa que enxerga em todo esse meio, não teve um desentendimento com ninguém, embora possamos pensar que a Mulher do Médico tenha sido privada de sua liberdade para cuida e seguir seu marido, na verdade foi sua opção.

Tocado no assunto Mulher do Médico, entramos na nossa parte derradeira da discussão, pois ela é a chave para todas as peças se encaixarem, sendo assim, o personagem mais completo e complexo de todo o filme.

Para quem não tem um arcabouço teórico, principalmente dos três autores com que estamos trabalhando, o filme é agoniante do início ao fim, o que não é para quem entende como as coisas funcionam intrinsicamente no mesmo. Após assistir várias e várias vezes, algumas nuances, talvez devaneios, passearam na minha mente como um sopro fresco numa tarde de verão. Uma dessas reflexões foi a da figura da Mulher do Médico, como o Estado. Pode parecer ousado de minha parte, mas tal pensamento martela na minha cabeça quase como uma verdade. Veja bem: o próprio nome da personagem não indica que ela seja uma protagonista, e sim alguém que está do lado, é importantíssimo, mas não toma os holofotes. Mantém a ordem e a convivência sadia, mesmo que isso signifique o sacrifício de sim mesma muitas vezes, cuidando dos seus e mantendo o mínimo do direito individual, mas nunca tomando o lugar de destaque do Médico, relação muito fácil com o conceito de parlamentarismo de Locke. Dado momento, enquanto a mulher do Médico luta para conseguir comida, ou seja, adquirir o sustento básico dos seus, foi o ápice deste meu pensamento, fazendo-me atentar para os demais atos de tal personagem no decorrer do filme.

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