Virtú e Fortuna - O Príncipe
Por: Eduardo Ferreira dos Santos • 29/11/2018 • Resenha • 2.133 Palavras (9 Páginas) • 164 Visualizações
VIRTÚ E FORTUNA EM “O PRÍNCIPE”
Eduardo Ferreira dos Santos
Nicolau Maquiavel, na construção de “O Príncipe” externa a ideia de construir uma “Itália” unificada e vigorosa, e para isso apresenta a necessidade de uma forte liderança (exercida por seu monarca) com determinação e sem medir esforços, nem hesitação, nas ações que deva tomar em favor do povo e da soberania nacional. Seu nome (maquiavélico) passou a ser adjetivo, não muito agradável, e sinônimo de ardiloso e astuto. Ele expõe a necessidade de avaliar acontecimentos históricos, para contextualização e estudos que possam representar a base nas decisões necessárias no tempo atual. Estuda também a sociedade de maneira calculista e fria, sabendo que não se deve medir esforços para obtenção do poder. Na obra Maquiavel traz dois “novos” conceitos, Virtù e Fortuna, que mudam a concepção política de sua época, deixando o uso das análises a partir de moral e religião para uma nova forma que se atenha aos fatos.
A Virtù seria a capacidade de controle da conjuntura do governo. Possuindo-a é possível solidificar um governo estratégico capaz de superar os problemas que venham a surgir, sendo uma maneira, inclusive, de manutenção da paz (além, é claro, do poder). Ponto fundamental a ser lembrado é que, para constituição da Virtù, Maquiavel diz ser necessário optar pela vida pública, em detrimento da vida – fazer política passa a ser/ter uma técnica e ter objetivo próprio. Neste sentido, a obtenção e manutenção do poder será relativizada, de acordo com a Virtù do conquistador. Define ainda o que guia o ser humano na batalha política como “o desejo de conquistar é coisa verdadeiramente natural e ordinária e os homens que podem fazê-lo serão sempre louvados e não censurados”. Maquiavel trata sempre de Principados (vivem sob a liderança de um príncipe) e Repúblicas (que vivem livres), pois são estes os conceitos existentes na Itália de sua época. Neste caso, diz que aqueles sem Virtù, quando conquistam um principado não o fazem com muito esforço, pois a conjuntura foi-lhes, de alguma maneira favorável, porém, terão muito custo para manter este local. Ainda sobre os principados, destaca que aqueles liderados pela mesmo príncipe por muito tempo, podem perde-lo pela ausência de Virtù, já que em tempos gloriosos não “enxergaram” que as situações poderiam alterar-se durante estagnação econômica e/ou social. Por isso, deve o príncipe conduzir-se sempre pela Virtù, para manter o poder, pois
“Mas sendo minha intenção escrever algo de útil para quem por tal se interesse, pareceu-me mais conveniente ir em busca da verdade extraída dos fatos e não a imaginação dos mesmos, pois muitos conceberam repúblicas e principados que jamais vistos ou conhecidos como tendo realmente existido. Em verdade, a tanta diferença de como se vive e como se deveria viver, que aquele que abandone o que se faz por aquilo que se deveria fazer aprenderá antes o caminho de sua ruína do que o de sua preservação, eis que um homem que queira em todas suas palavras fazer profissão de bondade, perder-se-á em meio a tantos que não são bons. Donde é necessário, a um príncipe que queira se manter, aprender a poder não ser bom, e usar ou não a bondade, segundo a necessidade”. (Maquiavel)
É preciso ao Príncipe ter muito cuidado também com a relação confusa entre vícios e Virtù, que em muitos casos podem confundir-se, pois haverá casos em que deverá sujeitar-se a prática de situações que pareçam vícios, mesmo que a ação seja infame a sua pessoa – e caso este seja necessário a manutenção do poder. Ainda tratando da questão de ações que possam marcá-lo, o Príncipe, não de preocupar-se em se o julgam severo, pois, segundo Maquiavel, até situações de crueldade podem fazê-lo venerável.
Ainda sobre a Virtù, é preciso lembrar que na política não há perenidade, mas sim investigação histórica e necessidade de adaptação, portanto, não poderá o Príncipe agir sempre com as mesmas regras e toda e qualquer circunstância. Deve ser as vezes cruel, em outras generoso, ser honrado em algumas situações, assim como mentir quando necessário, sabendo quando ceder e quando ser inflexível.
Com o exposto, Maquiavel demostrou que fazer política, possuindo Virtù (e Fortuna), não seria mais uma questão de força e violência, mas a conquista de saber como utilizar de forma virtuosa esta força, para que as conquistas sejam duradouras (com fama, honra e glórias). Vale destacar, por fim, a questão de muitos resumirem, arcaica e grosseiramente, a filosofia maquiveliana como "os fins justificam os meios". Essa questão é um erro, pois para Maquiavel o Estado não é um fim e ele muitas vezes mostrou-se defensor de conceitos opostos a este pensamento, como honestidade e lealdade, por isso mesmo, objetivava buscar regras legais e eficazes de governo.
Já Fortuna seria o acaso, a sorte, favorável ou desfavorável de cada indivíduo, não sendo, portanto, obstáculo, mas sim uma disputa política a ser superada. É também uma maneira de aquisição de poder, mas sem a garantia de manutenção e continuidade. Votando ao exemplo dos principados, aqueles que os conquistam apenas pela Fortuna terão grande dificuldade em sua manutenção, pois esta será uma situação sempre instável. Cruzando tal fator com a devoção a vida pública, Maquiavel fala ainda que estes conquistadores devem viver com vida privadas, pois
“Não sabem, porque, se não são homens de grande engenho e Virtù, não é razoável que, tendo vivido sempre em ambiente privado, saibam comandar; não podem, porque não têm forças que lhes possam ser amigas e fiéis. Ainda, os Estado que nascem rapidamente, como todas as demais coisas da natureza que nascem e crescem depressa – não podem ter raízes e estruturação perfeitas, de forma que a primeira adversidade os extingue; salvo se aqueles que, como foi dito, assim repentinamente se tornaram príncipes, forem de tanta Virtù que saibam desde logo preparar-se para conservar aquilo que a Fortuna lhes pôs no regaço, formando posteriormente as bases que os outros estabeleceram antes de se tornar príncipes. (Maquiavel)
No capítulo XXV, “De quanto pode a Fortuna nas coisas humanas e de que modo se pode resistir-lhe”, Maquiavel trata do conceito de Fortuna, dizendo que grande parte das pessoas acreditam que as definições do mundo são ações de Deus e da Fortuna. Se um Príncipe pensar desta maneira, irá fracassar, pois a Fortuna represente a fração imprevisível, onde o Príncipe poderá até exercer certo controle – utilizando-se da Virtù. Portanto, a Fortuna não deve ser desprezada, mas encarada como desafio a ser domado e administrado com a Virtù.
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