Resenha Retalhos

Resenha – Retalhos

        Através da transcendência ou plena assimilação das noções de mundo embutidas no individuo pelo ciclo social na fase de crescimento constitui-se o tal amadurecimento. A jornada até esta condição alterada, que sugere mais estabilidade, plenitude e definição em geral é tortuosa e cheia de meandros particulares que também dilapidam gradualmente a persona. Partindo da premissa de que tudo é experiência, e que a definição de nós mesmos em determinado momento qualquer, é a soma de todas elas, mesmo o amadurecimento é um estágio transitório ou de formação contínua.

        Em Retalhos, Craig, enfrenta sua cruzada pessoal pra se tornar adulto, e como ela começa cedo. Em cada canto da própria casa, em cada interação com os pais, amigos, os circulos sociais forçados, os espontâneos e opcionais, as relações com o irmão, o papel da religião. Tudo isso somado a uma necessidade urgente de crescer e se descobrir, libertar e corresponder a expectativas de várias direções.

Dessa forma a convergência do turbilhão de processos resulta nos mais diversos tipos de reações em Craig. Como a gradativa desilusão religiosa, a dissolução da fé, o afastamento do irmão, e uma angústia crescente com a ascensão de amores. Em Raina, Craig encontra o estopim do seu amadurecimento, a baliza decisiva do seu processo de crescimento, durante o qual irá descobrir a própria sexualidade, as benesses do amor e também a sua arrebatadora força destrutiva.

Toda a o odisséia particular de Craig é traçada, nesta novela gráfica, com muita atenção a entremeios emocionais, e busca uma singeleza na construção de sentido com longos momentos contemplativos, uso algo esparso de textualidade e flutuações livres pela cronologia própria da vida do personagem. Assim, as linhas do tempo ganham também, com intervenções de passagens bíblicas, contornos ainda mais ilustrativos da dramaturgia de Craig que ganham em sinceridade e autenticidade.

No fim das contas o aspecto mais forte é mesmo o da honestidade com que Craig conta sua própria história. Sem rodeios ou excesso de devaneios narrativos, o autor imprime sinceridade latejante nas passagens, reforçando os tons dramáticos, principalmente nos excertos mais intensos como na retratação de seu abuso pelo baby-sitter. Somado a narrativa não-linear, ganha também em inventividade. Ainda que não seja inovador, arrebatador, ou mesmo muito maduro de si mesmo, constrói com sutileza uma história simples e de propósitos muito bem definidos.