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Bacon e o método experimental

Por:   •  15/9/2016  •  Trabalho acadêmico  •  2.125 Palavras (9 Páginas)  •  1.117 Visualizações

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BACON E O MÉTODO EXPERIMENTAL*

 

 

 

 

 

“Todos aqueles que ousaram proclamar a natureza como assunto exaurido para o conhecimento, por convicção, por vezo professoral ou por ostentação, infligiram grande dano tanto à  filosofia quanto à ciência. Pois, fazendo valer a sua opinião, concorreram para interromper e extinguir as investigações.”

 

Sir Francis Bacon (1561-1626), “Prefácio do Autor”, Novum Organum

 

 

In Benjamin Farrington:

 

Bacon escreveu: “O que me interessa é a vida e os assuntos humanos, com todos os seus dissabores e dificuldades. A isto me proponho melhorar, mediante ideias construtivas e autênticas”. A história de Francis Bacon (1561/1626) é a de uma vida consagrada a uma grande ideia. Consiste, simplesmente, em que o conhecimento deveria dar seu fruto em obras, que a ciência deveria ser aplicável ã indústria, que os homens deveriam se organizar com vistas a melhorar e transformar suas condições de vida. Do ponto de vista desta ideia nova, Bacon colocou em exame toda a cultura humana, a fim de descobrir a causa desta Ter produzido um fruto muito escasso em obras .

Bacon ocupa um lugar importante na história da ciência, mas sua contribuição não foi estritamente na história da ciência. O que lhe interessa em especial é saber o lugar que ocupa a ciência na vida social. Nem o filósofo da Antiguidade, nem o escolástico medieval, consideram a possibilidade de melhorar, de uma maneira drástica: as condições materiais da vida social. Como outros contemporâneos seus, Bacon impressiona-se com os efeitos produzidos por alguns poucos inventos práticos, no que diz respeito a sorte da

humanidade.

“É aconselhável – escreve – observar a força, o efeito e as consequência dos descobrimentos (...). Porque estes três inventos – a imprensa, a pólvora e o imã – fizeram mudar por completo a face do mundo e o estado de coisas existente; o primeiro, no campo da literatura; o segundo, no da guerra; e o terceiro, no  da navegação. A partir daí produziram-se inúmeras mudanças até o ponto de que nenhum império, nenhuma seita, nem estrela  exerceram o poder e o domínio da espécie humana sobre o universo, sua meta é, sem dúvida alguma, uma classe mais sadia e nobre do que as outras. Agora, o império do homem sobre as coisas depende por inteiro, tanto das artes mecânicas, como das ciências. Porque não podemos dominar a natureza a não ser obedecendo-a” e “o objetivo verdadeiro e legítimo das ciências é simplesmente este: que a vida humana seja enriquecida mediante novas descobertas e forças.”

Ainda que o objetivo de Bacon fosse prático requeria, para sua realização, uma reorganização da ciência. Deste ponto de vista, Bacon podia e efetivamente apresentou sua grande ideia como uma reforma lógica, um tipo realmente novo de processo indutivo. O princípio de toda sua vasta erudição era a ideia de ampliar, não a capacidade de argumentação, mas sim a capacidade de atuação. Para que isto fosse possível, insistiu que esta atuação prática dependia de uma mudança nas formas de pensamentos tradicionais. Convencido disso, identificava constantemente os dois processos, insistindo que o que resultava na prática era verdadeiro na teoria; que o progresso no poder e o progresso no saber são dois aspectos de uma mesma coisa.

Esta afirmação da identidade entre a teoria e a prática trouxe como consequência a conversão de Bacon em um dos pioneiros da ciência histórica. A lógica tradicional se preocupava com as ideias eternas, com a definição da verdadeira essência das coisas. Bacon concentrava sua atenção num progresso situado no tempo. Seu tema era a história da civilização, considerada como o progresso do homem, na medida em que crescia o seu domínio sobre a natureza. O conhecimento da natureza que o homem possuía havia sido obtido no curso desta luta, a fim de submetê-la a seus fins.

É nesse sentido que devemos entender a crítica de Bacon a filosofia anterior: “Platão corrompeu a filosofia natural com sua teologia tão completamente quanto Aristóteles corrompeu-se com sua lógica (Novum Organum)”. Porque, dizia Bacon, “quando a filosofia é arrancada de suas raízes na experiência, de onde brotou e cresceu, converte-se numa filosofia morta.” E a ciência deveria ser conhecida por suas obras: “É mais pelo testemunho das obras do que por sua lógica, ou inclusive pela contemplação, que se revela e estabelece a verdade. Depreende-se disso que o melhoramento da sorte da humanidade e da razão são uma e mesma coisa.”

A matéria prima para a ciência contemplativa de Aristóteles era obtida mediante a contemplação da natureza. A matéria prima para a filosofia ativa de Bacon só podia ser obtida mediante o exame da ação humana sobre a natureza. A lógica aristotélica ajudava a pensar; sua meta era a consequência lógica. A lógica de Bacon era um guia para a ação; sua pedra de toque estava em se funcionava ou não.

Esta ruptura com a tradição filosófica implicava uma mudança de atitude com relação a grandes perguntas que, durante dois mil anos, permaneceram às portas da filosofia europeia. É possível conhecer a verdade? Podemos julgar os objetos exteriores por meio dos sentidos? Até que ponto podemos confiar neles? Os metafísicos dão diferentes respostas a estas perguntas. (...) Nessa matéria, Bacon estava ao lado do homem prático, ainda que não tivesse adotado esta posição sem que antes houvesse refletido sobre o assunto. Pensava que era um erro começar pela questão da validade do nosso conhecimento. Porque esta questão era, talvez, por onde deveríamos terminar. A questão básica, para ele, residia na prova e na demonstração prática: “...esta questão de se o conhecimento é possível ou não, deve ser resolvida não na argumentação, mas sim provando-a”.

O método baconiano contém duas partes distintas: uma “destrutiva” e a outra “construtiva”. A primeira trata de purificar o entendimento humano dos obstáculos que o bloqueiam no acesso à verdade: é a crítica aos ídolos ou falsas noções. A segunda, compõe-se do método experimental e das tabelas de investigação. Ao apresentar sua história da ciência, Bacon apontava já para o fato de que toda história mostra que a ciência é o resultado da intervenção humana sobre a natureza e não simplesmente  sua mera observação. Enquanto os homens limitam-se a recolher os frutos que a natureza lhes brindava, não podiam ter mais que um conhecimento elementar de botânica. Porém, quando o homem passou à agricultura e à horticultura, quando produziu e encarregou-se das sementes e das árvores frutífera, quando as projetou, propagou e aperfeiçoou, alcançou um novo estágio de conhecimento botânico. Do mesmo modo, a mineralogia e a química para o homem, que funde os metais e fábrica o vidro, encontra-se, em um nível elevado que a dos homens que só aprendem no polimento de pedras e sua escolha. Não se cria ciência somente pela via do pensamento, mas sim pensando naquilo que se põe de manifesto (na natureza) atuando.

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