O Autor Inveterado

As infinitas linguagens da infância

A criança é "feita" de múltiplos pensamentos e maneiras de brincar, falar e escutar, mas a escola e a cultura "lhe separam a cabeça do corpo" e roubam quase toda essa variedade. Esse é o tom de As Cem Linguagens da Criança (320 págs., Ed. Artmed, tel. [phone], 57 reais), um livro sobre a prática na Educação Infantil realizada em Reggio Emilia - província do norte da Itália - e escrito a 100 mãos. Diretores, educadores, crianças e pais são representados formalmente pelos editores e educadores Lella Gandini, Carolyn Edwards e George Forman.

A primeira e a segunda parte da obra contextualizam a experiência, destacando uma entrevista com Loris Malaguzzi (leia o trecho abaixo), idealizador da pedagogia que valoriza o pensamento dos pequenos e as linguagens utilizadas por eles.

A terceira parte transpõe a teoria para a prática, mostrando como a preocupação com os espaços e as reflexões sobre o papel e as ações do professor cooperam para a elaboração da capacidade simbólica das crianças. A construção de um dinossauro em tamanho real é um exemplo de projeto que revela um empreendimento pedagógico que exige muita perícia de professores e pais, todos sempre a serviço das ideias da garotada.

A última parte traz projetos feitos com turmas com idade a partir dos 2 anos, relatados por professores de uma escola nos Estados Unidos que adota os mesmos princípios, comprovando a eficácia do modelo de Reggio Emilia.

À primeira vista, a obra revela produções que por si só já são de encher os olhos d'água. Mas é a leitura atenta que revela aos educadores mais de 100 modos para cuidar do corpo, da inteligência e da sensibilidade dos pequenos.

Por que ler Conduz o leitor à filosofia reggiana.

Sobre os autores Lella foi a primeira a levar informações sobre Reggio Emilia para os Estados Unidos. Depois, Carolyn e George seguiram o mesmo caminho, estudando a abordagem por nove anos.

Silvana Augusto, autora desta resenha, é professora do Instituto de Educação Superior Vera Cruz e formadora do Instituto Avisa Lá, ambos em São Paulo, SP.

Clássico do mês

Trecho do livro

"Gandini: De que forma você vê a aprendizagem das crianças ocorrendo dentro do contexto dos relacionamentos ricos que descreve?

Malaguzzi: Em minha opinião, os relacionamentos e a aprendizagem coincidem dentro de um processo ativo de Educação. Ocorrem juntos por meio das expectativas e habilidades das crianças, da competência profissional dos adultos e, em termos mais gerais, do processo educacional. Devemos incorporar em nossa prática, portanto, reflexões sobre um ponto decisivo e delicado: o que as crianças aprendem não ocorre como um resultado automático do que lhes é ensinado. Ao contrário, isso se deve em grande parte à própria realização das crianças como uma consequência de suas atividades e de nossos recursos. É necessário pensarmos sobre o conhecimento e habilidades que as crianças constroem independentemente e antes da escolarização. Essa base de conhecimentos não pertence à "pré-história" mencionada por Vygotsky (como se fosse uma experiência separada), mas ao processo de desenvolvimento social das crianças. Em qualquer contexto, elas não esperam para apresentar questões a si mesmas e para formar estratégias de pensamento, ou princípios, ou sentimentos. Sempre, e em todo lugar, as crianças assumem um papel ativo na construção e aquisição da aprendizagem e da compreensão. "

De 4 a 31 de março, os leitores que entrarem em contato com a Editora Artmed e mencionarem a parceria com NOVA ESCOLA ganham 15% de desconto na compra de um exemplar.

II

AS 100 LINGUAGENS DA CRIANÇA EM

REGGIO EMILIA

Michele Cristine Silva Hissa

região de Reggio Emília, na Itália, desenvolveu após a guerra uma proposta pedagógica que hoje é sinônimo de excelência em educação infantil.

Essa proposta valoriza o desenvolvimento intelectual das crianças, assim como a representação simbólica que as crianças pequenas fazem do mundo. A arte tem um papel fundamental nessa representação e por isso é objeto constante dessa

proposta pedagógica. O objetivo principal da pedagogia de Reggio Emilia é desenvolver a criatividade e as habilidades simbólicas da criança de forma elevada.

Esse foi o tema da exposição As 100 linguagens da criança - a educação para a infância em Reggio Emilia, título do livro homônimo de Carolyn Edwards, Lella Gandini e George Forman, lançado em 1999 pela Artmed. Organizada inicialmente por Loris Malaguzzi (1920-1994) e colaboradores, a exposição vem sendo realizada desde 2005 e é amostra de um trabalho de 30 anos implementado por Malaguzzi. A competência da criança na construção do conhecimento é o foco da exposição, que traz a experiência dos centros educacionais do município de Reggio Emilia, na Itália.

Dentre os trabalhos expostos encontramos textos, imagens, desenhos, pinturas, esculturas em argila, maquetes, luz e sombra. Painéis que documentavam, por meio de fotos e textos, vários trabalhos dos alunos desses centros educacionais. As escolas de educação infantil dessa região primam pela valorização da arte como recurso pedagógico. Esse elemento esteve presente em todos os trabalhos expostos. As fotografias mostraram crianças realizando diversas atividades e trabalhos realizados pelos alunos usando diversos materiais: tecidos, sucata, tintas, entre outros.

Registro de uma criança usando o rosto para

expressar diferentes emoções.

Registro de um projeto realizado pelas crianças intitulado “Parque de diversão para passarinhos”.

Outro elemento marcante no trabalho das crianças foi o uso do corpo: destacaram-se, desta forma, fotos de crianças encenando um diálogo usando os pés como personagens, fotos de uma criança “experimentando” as mais diversas expressões faciais. O jogo de sombras também é bastante usado pelas crianças, seja para estudar os animais (usando as mãos as crianças os representam), seja para estudar seus movimentos através do estudo da própria sombra.

Encontramos ricas vivências das crianças em trabalhos artísticos, como o “parque de diversões para