Resenha Persépolis
Por: Elias F Marques Júnior • 30/4/2024 • Resenha • 1.135 Palavras (5 Páginas) • 71 Visualizações
PERSÉPOLIS. Direção: Vincent Paronnaud; Marjane Satrapi. Produção: Xavier Rigault; Kathleen Kennedy; Marc-Antoine Robert. Roteiro: Vincent Paronnaud; Marjane Satrapi. [S. l.]: Diaphana Films; The Kennedy/Marshall Company; Diaphana; 2.4.7 Films; France 3 Cinéma; EUROPA FILMES, 2007. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tSMDioYUbzw &t=1469s. Acesso em: 4 abr. 2024.
Elias Ferreira Marques Júnior
Resenha Crítica
O filme intitulado “Persépolis”, lançado em 2007, é uma adaptação da obra autobiográfica de mesmo título, a qual retrata a história de Marjane Satrapi. Dirigida pela autora da obra original, juntamente com Vincent Paronnaud, a animação em 2D possui um estilo próprio, que recorda as ilustrações dos quadrinhos do livro adaptado, o que favorece a introdução de cenas lúdicas dentro de um enredo tenso e complexo, oferecendo, assim, uma momentânea leveza humorística. Ademais, é utilizada uma transição da paleta de cores para o preto e branco como forma de demarcação temporal das recordações, reservando-se a cromatizada ao momento presente da personagem principal. Destaca-se, ainda, a grande presença da narradora durante as cenas, o que auxilia na compreensão dos aspectos emocionais da personagem, bem como na contextualização de cada etapa.
De um ponto de vista histórico, esta obra traz uma descrição singular do movimento revolucionário iraniano que destituiu o último Xá, que pertencia a dinastia Pahlavi, e lançou as bases para a proclamação da República Islâmica do Irã. Neste intervalo, abre-se uma janela para rememorar a participação inglesa na destituição da dinastia Qajar, que antecedera a Pahlavi. No âmbito cultural, esta mudança na forma de governo levou a uma desocidentalização do Irã, o qual, devido a seu vínculo com a Inglaterra e os Estados Unidos, seguia um processo de modernização aos moldes ocidentais. Esta virada se deu pela unificação entre religião e Estado, na qual os valores religiosos passaram a ser radicalmente impostos a todos os habitantes, configurando-se como uma forma de governo mais opressora que a anterior. Outro evento de grande relevância histórica retratado foi a ocorrência da guerra entre Irã e Iraque, que fomentou um endurecimento do regime estabelecido, usufruindo-se da aliança entre sentimentos nacionalistas e ensinamentos de ordem religiosa. Este momento é retratado como um período de intensa perseguição e pobreza, conclusão constatável pelas cenas de busca em residências e pela escassez de produtos no mercado iraniano, o que se contraporá à liberdade comportamental e à abundância de itens no mercado observadas nas cenas em Viena.
Do ponto de vista da educação, enquanto sistema de ensino, percebe-se sutilmente o seu emprego na legitimação do governo do Xá, quando é posto por Marjane que, segundo sua professora, o Xá teria sido escolhido por Deus para ocupar aquela função. Por outro lado, a função alienadora da escola é vivamente destacada durante o regime Islâmico, no qual o sistema educacional tenta encobrir o caráter autoritário do Estado enquanto inculca as regras comportamentais islâmicas nos estudantes. Contrasta com este cenário, o sistema educacional de Viena, para onde a protagonista é mandada por receio de punições, no qual se percebe um liberalismo marcado pela pluralidade de pensamento, apesar de o filme focalizar nas divisões não institucionais e na experiência extraescolar em detrimento da descrição da linha institucional de ensino. Após o retorno de Marjane ao Irã, ironiza-se a intervenção do regime islâmico na academia, sendo exemplificada uma aula de artes sobre a forma humana, a qual convencionalmente envolveria a nudes, mas que, devido às restrições religiosas, é realizada com a modelo quase completamente encoberta por vestes islâmicas. Nesta esfera, realiza-se, depois, uma crítica à exclusividade regulatória das vestes femininas, o que é um reflexo da mentalidade patriarcal instalada no governo.
Tomando agora a educação na perspectiva de desenvolvimento humano, ou seja, em um espectro mais amplo, pode-se verificar a influência que os diversos fatores já expostos exerceram sobre a formação de Marjane. De início, observa-se um relacionamento mais harmônico entre ocidentalização cultural e a religiosidade, apresentada na simultaneidade entre o sonho de ser uma profetisa e a admiração por Bruce Lee, explicitando a influência da forma de governo ocidentalizada exercida pelo Xá. Com a vivência do movimento revolucionário, nota-se uma primeira virada comportamental na tenra idade de Marjane, de modo que ela passa a imitar palavras de ordem, típicas de movimentos revolucionários, e a incitar práticas agressivas contra outras crianças. A convivência com seu tio revolucionário comunista, liberto após a destituição da monarquia, conduz-lhe à criação de um forte vínculo com ele, fortalecendo sua tendência rebelde. Esta propensão ao inconformismo é manifestada de forma contundente na sua vivência escolar, especialmente na contraposição ao negacionismo acerca das repressões estatais, uma vez que ela experimentou a dramática situação de seu tio, que fora novamente preso. Neste ponto, abre-se um parêntese para ressaltar a indiscriminação nos atos repressivos do regime islâmico, já que a personagem principal, ainda em sua infância, deixou seu país por medo de punições relacionadas a sua atitude contestadora.
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