História Moderna
Por: eliedi • 21/9/2016 • Trabalho acadêmico • 6.169 Palavras (25 Páginas) • 225 Visualizações
A Mulher na Idade Moderna:
Pressupostos e visões de um ser diabolizado.
Eliza Terra da Silveira
Resumo: O presente trabalho tem por finalidade analisar como as mulheres, na Idade Moderna, eram vistas tanto pela sociedade, quanto pelas instituições vigentes na época, assim como os pressupostos que deram origem a tais estranhamentos. Para tal pretende-se abordar questões que acabaram por transformar o gênero feminino em um ser diabólico, que gerava ao mesmo tempo desejo e medo ao sexo oposto.
Palavras-Chave: Mulher, Visão, Idade Moderna, Sexualidade, Diabólico.
O sexo feminino, em diferentes momentos históricos foi considerado uma fonte de malevolência, onde a sexualidade feminina era temida e o corpo da mulher, com seus mistérios da maternidade, assim como da menstruação era algo obscuro e intrigante para o sexo oposto e até mesmo para a ciência. Muitas acusações impostas em relação à mulher são de longa data, porém, foi na Idade Moderna, com a difusão da imprensa que tais ideias se difundiram, gerando preconceitos que para nós parecem infundados, mas que na época eram justificados tanto pela ciência quanto pela Igreja, permeando o inconsciente da população vigente e causando sensações de medo, desejo, pecado e repulsão.
O objetivo desse trabalho, portanto, é buscar respostas para tais pensamentos que ainda hoje mantém raiz em nossa sociedade. Para tal faz-se necessário tecer uma análise sobre os diversos modos de vida dessas populações, seus pressupostos, afirmações, justificativas e medos.
Analisando a história de povos antigos, podemos constatar que a mulher foi de certa forma, motivo de exaltação. A Idade da Pedra nos deixou muito mais representações femininas do que masculinas e na Grécia Antiga ela foi representada, como a deusa Maia da fecundidade, como Atena da divina sabedoria, entre tantas outras. Tais confirmações de exaltações da mulher nos levam a questionar em qual período e por quais razões a mulher passou de um ser exaltado e admirado para um ser diabolizado.
Segundo Jean Delumeau, tal veneração do homem pela mulher foi sendo substituída ao longo das eras pelo medo que ele sentiu do sexo oposto, especialmente através do mistério da maternidade que, segundo a psicanalista Karen Horney[1] religa a mulher “muito mais estritamente que seu companheiro, à grande obra da natureza”. Dessa forma, o elemento materno representa a natureza que dá a vida e o elemento paterno à história. Assim, o homem, com o intuito de se valorizar, definiu-se como um ser racional, fonte de luz, em oposição à mulher, instintiva e obscura[2].
Delumeau explica que Freud, o pai da psicanálise, também se firmava na opinião do medo. Sua tese era a do medo da castração e no desejo da mulher de possuir um pênis. Tal afirmação está em parte correta, pois há vários dossiês clínicos, mitologias e histórias que confirmam o medo da castração no homem[3].
Ainda segundo Delumeau há mais de “trezentas versões do mito da vagina dentata entre os indígenas da América do Norte, mito que se reencontra na Índia, por vezes com uma variante igualmente significativa: a vagina não tem dentes, mas está cheia de serpentes.” No entanto, a tese sobre o desejo da mulher em possuir um pênis não tem fundamento e só demonstra o desejo de se impor uma superioridade masculina[4].
O segundo fator abordado por Delumeau que nos ajuda a entender como o sexo feminino foi sendo transformado em um “agente de satã na terra” se remonta ao fator menstrual que, por ser algo ainda misterioso, causava repulsa ao sexo oposto, levando-os a interpretar tal processo biológico da mulher como algo impuro, ligando sua imagem a toda espécie de males.
No decorrer dos séculos, essas ideias foram tomando forma e a mulher então passou a ser acusada de ser a introdutora do pecado na Terra. Seja como
Pandora grega ou Eva judaica, ela cometeu a falta original ao abrir a urna que continha todos os males ou ao comer o fruto proibido. O homem procurou um responsável para o sofrimento, para o malogro, para o desaparecimento do paraíso terrestre, e encontrou a mulher.[5]
A Igreja: uma forte propagadora da inferioridade do sexo feminino?
Como podemos observar nos tópicos acima, a Igreja não foi a fundadora de tal imagem deturpada da mulher. Mas, com toda a certeza, os representantes de tal instituição, se apoderaram de tais pensamentos ajudando-os a se proliferar no decorrer dos séculos.
Nos Evangelhos da Bíblia, podemos encontrar várias passagens em que Jesus defende a igualdade entre os sexos. Quando os fariseus lhe perguntaram se é permitido repudiar sua mulher por qualquer motivo, Jesus responde: “Não leste que o Criador, desde a origem, os fez homem e mulher e disse: ‘Assim então o homem deixará seu pai e sua mãe para ligar-se à sua mulher e os dois farão uma só carne? ’ Dessa forma, eles não serão mais dois, mas uma só carne. (Mateus XIX, 1- 9, e Marcos X, 1-9). [6]
No entanto, a Igreja sempre teve grande dificuldade em se pregar tal tese. Tal objeção se remete ao contexto cultural em que o cristianismo se difundiu: um contexto patriarcal de uma longa tradição de desapego à realidade terrena.
Analisando-se o Novo Testamento podemos notar que o apóstolo Paulo, também preconizou a igualdade entre os sexos, como quando escreveu: “(“Não há nem judeu nem grego [...], nem escravo nem homem livre, nem homem nem mulher: pois todos vós não sois senão um em Cristo Jesus” [Epístola aos Gálatas III, 8]).”[7]
Porém, o mesmo apóstolo também foi um grande propagador da imagem da mulher como um ser inferior e incapaz de se governar sozinha, sendo desta forma subordinada ao homem. Em uma passagem referindo-se ao relato da Criação, escreveu: ‘“não foi o homem, evidentemente, que foi criado para a mulher, mas a mulher para o homem” (I Coríntios XI, 9)’[8]
Tais passagens revelam contradições, que nos remontam à dificuldade da Igreja em se admitir a igualdade preconizada por Jesus nos Evangelhos. Essas dificuldades têm sua raiz justamente no medo oriundo da mulher e no forte contexto patriarcal em que o apóstolo Paulo e os membros da Igreja viviam.
Assim como o apóstolo Paulo, há vários outros registros bíblicos que, influenciados pelas culturas patriarcais, denotam uma visão depreciadora da mulher. Santo Agostinho, a fim de se conciliar a igualdade nos ensinamentos de Jesus com tal visão desvalorizadora firmou-se na tese de que todo ser humano
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