OS DEBATES DA NOVA HISTÓRIA CULTURAL: MICHEL FOUCAULT E A ARQUEOLOGIA COMO MÉTODO DE ANÁLISE
Por: rphlino • 7/11/2018 • Trabalho acadêmico • 4.395 Palavras (18 Páginas) • 326 Visualizações
DEBATES DA NOVA HISTÓRIA CULTURAL: MICHEL FOUCAULT E A ARQUEOLOGIA COMO MÉTODO DE ANÁLISE
Raphael Cesar Lino
Introdução:
O presente texto é resultado de uma escolha temática dentro das discussões epistemológicas do movimento historiográfico conhecido como Nova História Cultural, apresentados na disciplina Teoria e Método do curso de pós-graduação em história da unesp, FCL de Assis – segundo semestre de 2015. Desse modo, nos aprofundamos na influência do filósofo francês Michel Foucault na historiografia, especificamente em alguns pontos elaborados em sua fase conhecida como Arqueologia do saber.
Devemos enfatizar que as relações de Foucault com a história foram variadas, polêmicas e provocativas, no entanto não é nosso objetivo aqui discutir o teor de tais celeumas, e sim apresentar em linhas gerais alguns aspectos de seu método arqueológico do ponto de vista teórico, especialmente porque ele se baseia numa determinada concepção de história e de tempo distinta da historiografia tradicional. Foucault foi um filosofo que se aproximou da história e com ousadia colocou em xeque várias certezas trazidas pelos historiadores até então.
Desse modo, este pequeno texto propõe inicialmente apresentar um panorama do que é a nova história cultural, descrevendo aspectos gerais para que possamos defini-la e reconhece-la dentro da história da historiografia. Posteriormente, apresentaremos de modo mais aprofundado a arqueologia do saber de Foucault, dialogando algumas vezes com historiadores que se aproximaram de seu pensamento, foram influenciados por ele ou fizeram críticas aos seus postulados. Finalmente, encerraremos com uma pequena conclusão a fim de apresentar um balanço geral do que foi discutido.
A nova História Cultural – um breve comentário
A expressão “Nova História Cultural” foi introduzida pela historiadora norte-americana Lynn Hunt, em um livro datado de 1989 que reunia uma coleção de artigos apresentados em um seminário na Califórnia, o tema desse seminário era “História francesa: texto e cultura”. O termo “nova” compreende as novas proposições lançadas pela nova história francesa, contudo, o termo “cultural” deve ser pensado a partir de novas concepções, e também, da expansão da esfera da cultura. Primeiramente, o termo Nova História Cultural encontrou espaço nos produções norte-americanas, só posteriormente ele iria alcançar o universo francês, devido ao fato que esse tipo de história concorreu com a história das mentalidades e do imaginário social.
Nesta trajetória observamos que o deslocamento das mentalidades para cultura implicou uma forma distinta de compreender este último termo, aproximando-se de um viés antropológico, que marca uma importante característica da nova história cultural:
Muitos historiadores aprenderam a usar o termo “cultura” no sentido amplo [...] Alguns deles, especialmente na França, nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, frequentaram seminários de antropologia, tomaram de empréstimo alguns conceitos e construíram uma abordagem que veio a ser conhecida como “antropologia histórica” muito embora “história antropológica” talvez fosse mais apropriada. (BURKE, 2005, p.44).
Confirmando as afirmativas de Burke, de que a virada cultural atingiu fortemente não somente os historiadores dos Annales, Lynn Hunt afirma que o modelo de explicação cultural abarca uma mudança na concepção de história que não se restringe a esses historiadores, ele se insere também, dentro da história de inspiração marxista, e, portanto, questiona o próprio lugar da cultura diante das concepções da vida social e do real.
Nos últimos anos, contudo, os próprios modelos de explicação que contribuíram de forma mais significativa para a ascensão da história social passaram por uma importante mudança de ênfase, a partir do interesse cada vez maior, tanto dos marxistas quantos dos adeptos dos Annales, pela história da cultura. (HUNT, 1992, 5).
É grande a influência de Michel Foucault entre os historiadores da Nova História Cultural, ao ponto de que Peter Burke o elegerá como um dos quatros notáveis teóricos dessa modalidade histórica. Foucault caminhou paralelamente à história dos Annales, contudo, sua produção atingiu a historiografia da terceira geração da mesma forma que sofre influência da mesma, “ele tinha algo a ensinar-lhes, como já vimos, mas havia o que deles aprender, também.” (BURKE, 1991, p. 117). Para Burke, a obra de Foucault é responsável por lançar três ideias que influenciaram a produção historiográfica do período.
A primeira seria a crítica que Foucault faz à ideia de teleologia na história, do progresso e das continuidades, seu método privilegia ao contrário a ruptura, as descontinuidades, “sua abordagem em termos de “genealogia”, um termo que ele tomou de Nietzsche, destaca os efeitos dos “acidentes” em lugar de traçar a evolução das ideias ou as origens do atual sistema.” (BURKE, 2005, p.74).
O segundo ponto apontado se refere à noção de episteme apresentada por Foucault. Tal conceito busca entender como se organizava os saberes de uma determinada época, suas relações, e seus limites. Junto dessa nova abordagem Foucault lança um novo método de análise do discurso, que compreenderia “tudo o que possa ser pensado, dito ou escrito em um dado período.” (BURKE, 2005, p.75).
O último aspecto levantado por Burke diz respeito ao fato de Foucault apresentar uma história que inclui prática e teoria. Deve-se entender que a noção de prática, segundo Burke, estaria relacionada a um nível micro das relações de poder.
Jacques Le Goff aponta para as novas teorizações acerca dos documentos apresentadas pelos historiadores dos Annales, O documento não é mais visto de forma inocente pelos historiadores, ele seria um “produto de uma certa orientação da História” (LE GOFF, 1991, p.34), aproxima-se assim da concepção de Foucault, que concebe a análise documental de forma a transformá-lo em um monumento, e dessa forma, trabalhá-lo em seu nível mais superficial.
François Dosse localiza Foucault como o grande expoente da história serial, devido ao fato de que, a história para ele é recortada, analisada a partir dos fragmentos, não interessada em compor uma totalidade ela leva a cabo o projeto de dividir o real em séries. Esse novo jeito de pensar a história não mais como progresso, e a partir de suas próprias rupturas, não permite pensá-la também, como uma relação de causalidade. Assim, Foucault ao negar a história preocupada com a eterna busca elas origens enfatizará, segundo Dosse, a “singularidade dos acontecimentos”.
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