Fichamento "Textos do Locke"
Por: João Pinto • 7/9/2022 • Resenha • 2.327 Palavras (10 Páginas) • 112 Visualizações
LOCKE, John. “Textos de Locke”. In: WEFFORT, Francisco (Organizador). Os Clássicos Da Política, volume 1, São Paulo: Ática, 1989, p. 91-110.
Do estado de natureza
Locke inicia sua argumentação mobilizando a ideia central de seu pensamento: todos os indivíduos são dotados de uma “liberdade inata”, uma “liberdade intrínseca” à condição humana. Além dessa “liberdade natural”, como também em decorrência dela, o homem tem o direito de ordenar deliberadamente as próprias ações e usufruir e regular livremente as próprias posses.
Para Locke, “considerar em que estado todos os homens se acham naturalmente, sendo este um estado de perfeita liberdade” (p. 91) é pré-requisito para “compreender corretamente o poder político e depreende-lo de sua origem” (p. 91). Por esta razão, o autor inicialmente discorre sobre o “estado de natureza” – “Quando os homens vivem juntos conforme a razão, sem um superior comum na Terra que possua autoridade para julgar entre eles” (p. 93).
Essa liberdade, porém, não pode ser confundida com licenciosidade, pois “sendo todos iguais e independentes, nenhum deve prejudicar a outrem na vida, na saúde, na liberdade ou nas posses” (p. 91). Por isso, todos os homens devem zelar não apenas pela observância, mas também pela execução dessa “lei da natureza” – “por meio da qual qualquer um tem o direito de castigar os transgressores dessa lei numa medida tal que possa impedir a sua violação” (p. 91).
Locke considera que o governo civil é o remédio acertado para os inconvenientes do estado de natureza (quando homens legislam em causa própria), entretanto critica fortemente o poder concedido aos monarcas absolutos, pois, no pensamento de Locke, isso enseja que estes homens (que, naturalmente, não são em nada diferentes dos outros) não apenas exerçam poder absoluto sobre outros, mas também legislem em causa própria, o que piora ainda mais a situação de um modo geral.
Do estado de guerra
Locke compara o exercício do poder absoluto por um indivíduo sobre o outro com uma situação em que o primeiro ameaça a vida do segundo. O autor diz: “tenho motivos para concluir que aquele que se apoderar de mim, sem meu consentimento, fará uso de mim, tal como lhe aprouver quando eu estiver em seu poder e destruir-me-á também quando lhe der na veneta” (p. 93). Por isso, no pensamento de Locke, “aquele que tenta colocar a outrem sob seu poder absoluto, põe-se por causa disto num estado de guerra com ele” (p. 93).
O autor se opõe à concepção de que o estado de natureza possa se confundir com o estado de guerra, ou que, necessariamente, o primeiro levará ao segundo. Para Locke, o estado de natureza pode existir perfeitamente sem que haja, concomitantemente, um estado de guerra. Apenas se houver uma ameaça de um indivíduo sobre outro, não existindo qualquer superior comum sobre a Terra (um governo civil, por exemplo) a quem a vítima possa apelar, é que se instala entre ambos um estado de guerra. Contudo, é para evitar esse estado de guerra que homens se reúnem em sociedade, deixando o estado de natureza.
Da propriedade
No pensamento de Locke, aquilo que o homem retira da natureza e transforma a partir de seu trabalho passa a ser seu por direito. O autor defende que “o ‘trabalho’ do seu corpo e a ‘obra’ das suas mãos são propriamente seus” (p. 94). Também nesse sentido, para ele, é o trabalho que atribui a maior parte do valor à terra.
Locke fala da criação do dinheiro, um bem que possibilita propriedade de longo prazo, tendo em vista que itens essenciais à vida humana como alimento, vestuário, transporte, etc; em geral, são de curta duração e não permitem a acumulação de posses. Mas, com o dinheiro, os metais e as pedras preciosas, essa acumulação torna-se possível, o que possibilita também a acumulação de posses em terras.
Da sociedade política ou civil
O autor, a partir do entendimento de que o homem tem um direito natural a possuir e usufruir o fruto de seu trabalho, defende também que este homem tenha também o direito de defender suas posses, mesmo que para isso tenha que usar força e, se necessário, até mesmo força letal contra alguém que queira usurpar-lhe as propriedades ou a vida. Contudo, diz Locke, “haverá sociedade política somente quando cada um dos membros renunciar ao próprio poder natural, passando-o às mãos da comunidade em todos os casos que não lhe impeçam de recorrer à proteção da lei por ela estabelecida” (p. 96).
E aqui deparamos com a origem dos poderes legislativo e executivo da sociedade, que deve julgar por meio de leis estabelecidas até que ponto se devem castigar as ofensas quando cometidas dentro dos limites da comunidade, bem como determinar, mediante julgamentos ocasionais baseados nas circunstâncias atuais do fato, até onde as agressões externas devem ser retaliadas; e em um e outro caso utilizar toda a força de todos os membros, quando houver necessidade. (p. 96)
Com tudo isso, e considerando que para Locke o objetivo da sociedade civil consiste em evitar e remediar o que ele chama de “inconvenientes do estado de natureza”, mais uma vez o autor traz à tona sua crítica à monarquia absoluta, definindo-a como “incompatível com a sociedade civil” (p. 96).
Do começo das sociedades políticas
Locke segue discursando sobre o pacto social a partir do qual os homens, abrindo mão de suas liberdades naturais, unem-se sob os laços da sociedade a fim de gozarem da segurança possibilitada por ela. Nesse caso, os homens assumem a obrigação para com todos os membros da sociedade de se submeter às decisões da maioria. Se assim não for, o pacto social perde seu sentido.
Essa submissão à vontade da maioria é o que torna a sociedade possível, pois “Se o assentimento da maioria não fosse aceito como razoável enquanto ato de todos submetendo cada indivíduo, nada, senão o consentimento de cada um, poderia fazer com que qualquer coisa fosse o ato de todos” (p. 97). Esse “consentimento de cada um”, porém, é quase impossível de se conseguir devido aos afazeres da vida cotidiana das pessoas. Por esta razão os homens se submetem ao poder político constituído em sociedade. E, uma vez unidos em comunidade, os homens estão, perpétua e indispensavelmente, obrigados a ser e ficar inalteravelmente súditos dela, não podendo voltar novamente ao estado de natureza, a não ser em virtude de alguma calamidade que venha a dissolver o governo sob o qual vivem, ou então, havendo em algum caso particular ato público que dispense o indivíduo de ser membro dela daí em diante.
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