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O COTIDIANO RITMADO E O SOM DOS ESCRAVOS

Por:   •  19/5/2015  •  Trabalho acadêmico  •  897 Palavras (4 Páginas)  •  648 Visualizações

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2. O COTIDIANO RITMADO E O SOM DOS ESCRAVOS.

2.1 OS CANTOS DE TRABALHO.

Além das danças e batuques apresentados anteriormente nessa pesquisa, o canto de trabalho também era muito explorado pelos escravos africanos, como meio para expressar suas indignações.

Os cantos de trabalho são canções intimamente ligadas a tarefas específicas, seja na agricultura, na mineração, na indústria, no comércio, entre prisioneiros, entre escravos, essas músicas expressavam o sentimento do trabalhador, seja em condição escrava ou não, trazendo harmonia ao serviço, mesmo que às vezes pesado. Os cantos nas lavouras traziam uma harmonia mais ritmada à tarefa, e eram destinados a diminuir o tédio cotidiano e ao aumento da produtividade. Como todos os trabalhadores cantavam e trabalhavam no mesmo ritmo, a produção podia ser aumentada conjuntamente. Assim podemos entender que o canto de trabalho sincronizava o movimento em grupo e colocava dinâmica ao serviço.

Apesar de algumas músicas serem trazidas da África Ocidental, muitas das letras cantadas pelos escravos africanos, não condiziam com o cotidiano vivido no Brasil, muito diferente da vida em seu país de origem.

O trabalho realizado aqui, forçado, de escravidão e exploração, necessitava de uma expressão um pouco diferente, e seria essa adaptação ao cotidiano atual que viria a romper com a tradição africana das lavouras, causando a mudança do costume. Um exemplo é a mudança nas letras das canções, onde anteriormente eram dirigidas a deuses e forças espirituais, com a intenção de conseguir uma melhor colheita ou para efeitos naturais favoráveis as lavouras, que diante à situação de exploração, tratavam de temas relacionados ao descontentamento do escravo ou a entoação de versos onde os trabalhadores conversavam entre si enquanto faziam o serviço. O uso da mistura das linguagens entre o português e algumas palavras africanas criava como que um novo dialeto, próprio dos trabalhadores, que muitas vezes comunicavam-se por metáforas através das músicas, assim os exploradores não entenderiam o que estavam cantando.

2.2 A ANÁLISE DAS LETRAS, A EXPRESSÃO ORGANIZADA.

A primeira letra a ser analisada é de uma canção negra encontrada “pela professora Angélica Resende em 1899, na Fazenda São Francisco, no interior de São Paulo” (TINHORÃO, 2005) e pelo que podemos entender era um meio de comunicação única e exclusivamente entre os negros, uma vez que mais ninguém entendia o que eles falavam ou cantavam. De acordo com Tinhorão (2005) esta é a letra:


“Solo) “Na fazenda da Cachoeira,

Tem cabrito, tem boiada,

Tem carneiro, tem porcada,

Urubu tá comendo foia...

Coro) Lá, lá, ri, la, lá, ilê...

Solo) Urubu tá comendo foia...” (bis)”

Em análise da apresentada letra, pode-se perceber a insatisfação do negro em trabalhar nesta fazenda, no caso a da Cachoeira, ele expõe a sua realidade vivida naquele lugar e a situação na qual era submetido. Pois bem, quando eles cantavam “Na fazenda da Cachoeira, tem cabrito, tem boiada, tem carneiro, tem porcada” revelam através da letra a riqueza desta família que ali residia, todas as suas posses e ostentações, e em contraposição revela sua posição de desigualdade e descriminação quando faz referência a si e aos seus companheiros de trabalho como urubus que estão comendo folhas, mas que folhas seriam essas? Ora, pois, se não eram folhas de couve jogadas aos negros para que se alimentassem e assim pudessem voltar o quanto antes aos seus respectivos afazeres.

Para além de uma análise demasiadamente simplista, podemos entender que nesta pequena canção contém inúmeras verdades que durante anos tentamos como país determinado a construir uma nação, esconder, mas que desde nossos primórdios estava escancarado e cantarolado pelas ruas. O fato dos negros cantarem enquanto trabalhavam, não significava felicidade, mas como já mencionado, era uma forma de comunicação e assim quem sabe de tentar aceitar sua situação nesse novo país, ou de criar expectativas de mudanças futuras. Seja qual fosse essa intenção dos negros, de aceitar ou tentar mudar, sabemos qual o fim desta história.

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