O MÁRMORE E A MURTA: SOBRE A INCONSTÂNCIA DA ALMA SELVAGEM
Por: Anna da Silva • 30/7/2020 • Resenha • 903 Palavras (4 Páginas) • 1.350 Visualizações
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
ANA RAQUEL RODRIGUES DA SILVA
Trabalho apresentado à Universidade Federal de São Paulo como requisito parcial para conclusão do Curso de Extensão Povos Indígenas Entre Olhares
Orientação: André Machado
Guarulhos
2018
Resenha:
DE CASTRO, Eduardo Viveiros. O mármore e a murta: sobre a inconstância da alma selvagem. In DE CASTRO, E. V. A inconstância da alma selvagem. Editora Cosac Naify, 2014. p. 181- p. 264.
Publicado a primeira vez pela Revista de Antropologia da Universidade de São Paulo, o terceiro capítulo do livro “A Inconstância da Alma Selvagem” de Eduardo Viveiros de Castro diz sobre esta inconstância, figurada na imagem da estátua de murta em alusão ao texto de Antônio Vieira. O mármore e a murta aborda os conflitos trazidos aos catequizadores na tentativa de moldar os hábitos e costumes indígenas em seu interesse e de como esta dita inconstância dos Tupinambás do Século XVI molda característica importante do comportamento dos grupos indígenas amazônicos.
Embora tenha cunho antropológico no sentido de expor a cosmovisão dos povos indígenas, a obra de Viveiros tem grande importância ao leitor interessado em fontes históricas, principalmente a literatura jesuítica escrita pelos próprios padres. Importante salientar que estas fontes trazem em si uma visão duramente fundamentada no pensamento de sua época de produção. É interessante como as análises críticas são trazidas pelo autor, colocando a maneira pela qual os estudos sobre os indígenas e sobre a sociedade brasileira ainda são demarcados por esta visão deturpada da inconstância.
Costurando a narrativa e fundamentando a leitura em diversas citações ao longo do texto, Viveiros nos mostra as cartas dos padres da Companhia das Letras e a perpetuação de um discurso fundamentado na dificuldade de “marmorizar” a alma “selvagem” maleável como diz a metáfora. Marmorizar, aqui ganha sentido de catequizar, de aprender a fé cristã. O que não esperavam os “karabas” é que mesmo após catequizados, voltavam a praticar os rituais litúrgicos ancestrais. Aqueles que ainda depois de crer eram incrédulos, ausentes de leis e reis. A ausência de um poder centralizado era entendido como uma “ausência de sujeição” dos Tupinambás, tanto política quanto religiosa.
Em um belo trabalho antropológico, o autor nos possibilita adentrar o pensamento ameríndio partindo do perspectivismo expresso nos hábitos, como a convivência com animais e sua espiritualidade, a guerra ou o práticas antropofágicas. Estas características do pensamento selvagem, que demarcam a multiplicidade das sociedade ameríndias no século XVI, tal qual sua continuidade até a contemporaneidade.
Em contraponto à inconstância está a constância da vingança, como escreve Viveiros. Esta vingança tida como raiz dos maus costumes era expressa nos hábitos como bebedeiras, canibalismo, poligamia, sendo a guerra temática recorrente inclusive nas palavras dos xamãs. Um exemplo é o rito de passagem para os homens, executar em cerimonial um prisioneiro. A tomada e execução de cativos de guerra conferia status aos guerreiros Tupinambás pela acumulação de nomes. Este status era materializado pem adornos, escarificações, direito de discursar em público. Ser guerreiro tinha posição de destaque pela posição que a própria
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