PLATÃO: A ORGANIZAÇÃO ECONÔMICA, INSTRUMENTO DA SALVAÇÃO DAS ALMAS
Por: Ruan Lacerda • 13/1/2017 • Dissertação • 11.466 Palavras (46 Páginas) • 735 Visualizações
PLATÃO: A ORGANIZAÇÃO ECONÔMICA, INSTRUMENTO DA SALVAÇÃO DAS ALMAS
Henri Denis
1 - A CRISE SOCIAL E INTELECTUAL EM ATENAS NO SÉCULO IV A.C.
O Estado Ateniense foi constituído pela reunião de quatro tribos que viviam no território da Ática. A organização antiga na base do clã e da tribo desapareceu pouco a pouco, ao mesmo tempo que se desenvolviam a propriedade individual do solo, o comércio, o uso da moeda.
Na primeira época do Estado Ateniense, os cidadãos dividem-se em três classes: eupátridas ou nobres, geomores ou agricultores, demiurgos ou artesãos. O poder político pertence aos nobres, que descendes dos antigos chefes de clãs. É entre os nobres que são recrutados os arcontes, que dirigem a cidade (aliás, esta é muito pequena, compreendendo apenas algumas centenas de milhares de pessoas). Os nobres chamam a si uma grande parte das melhores terras e os simples camponeses empobrecem. Endividam-se e, incapazes de pagar, podem ser reduzidos à escravatura.
Desenvolve-se uma luta entre eles e a classe dos nobres. A revolta dos camponeses pobres leva no século VI à anulação das dívidas por Sólon (arconte no final desse século).
Em 594, Sólon dá uma nova constituição ao Estado. A cidade é dirigida por um conselho de 400 membros. Os cidadãos são doravante divididos em quatro classes segundo a importância do rendimento que tiram das suas terras. As funções mais elevadas são reservadas às classes superiores.
Depois de Sólon, os camponeses pobres aliam-se aos artesãos e aos mercadores, cujo papel não deixa de aumentar. Esta coalizão quebra o poder dos nobres e essa vitória do povo é consagrada pelas reformas de Clístenes (508 a.C.).
A partir de agora o Estado é administrado pela assembléia do povo e por um conselho de quinhentos membros eleitos. Os cidadãos são divididos em cem demos, segundo o lugar da sua residência.
Na cidade ateniense existem então 120 000 cidadãos, numa população de 400 000 pessoas, que compreendem também os escravos e os estrangeiros (metecos). Os cidadãos mais numerosos são pequenos camponeses que cultivam a sua terra, por vez com a ajuda de um ou dois escravos. A sua situação é freqüentemente precária. Os homens em excesso exilam-se e fundam colônias noutras costas. Ao mesmo tempo, o comércio com o exterior toma um desenvolvimento crescente. Para sustentar essa política de expansão, a cidade desenvolve um grande esforço militar, aliando-se com outras cidades. No século IV, uma luta decisiva opõe Atenas a Esparta. É a Guerra do Poloponeso (431-404), na qual Atenas é finalmente vencida.
O equilíbrio econômico e social da cidade está a partir de então cada vez mais comprometido. O comércio faz então surgir uma camada de novos ricos. A propriedade fundiária concentra-se. Numerosos camponeses pobres têm de abandonar a terra. Na cidade não trabalham, porque o trabalho assalariado está reservado aos escravos, cada vez mais numerosos. Constitui-se uma plebe de desempregados, ao mesmo tempo que se acumulam grandes fortunas num pequeno número de pessoas. Há uma oposição permanente entre ricos e pobres que perturbam profundamente o funcionamento das instituições democráticas. A cidade está enfraquecida e entra numa era de decadência geral.
Uma das causas da decadência de Atenas foi a sua inferioridade militar perante Esparta. Mas a superioridade de Esparta estava ligada a uma organização social muito sua.
Cerca de 550 a.C. encontram-se em Esparta, ao lado de 25 000 cidadãos, 100 000 hilotas, camponeses escravizados e 250 000 periecos, homens livres, mas sem direitos políticos, que se entregam as atividades comerciais e artesanais . Para manter a supremacia da minoria, Quílon organiza-a então em comunidade militar. Cada cidadão dispõe de uma propriedade fundiária inalienável, que é cultivada por hilotas, e consagra-se ao serviço do estado. Dos 7 aos 20 anos, é educado nas armas. Dos 20 aos 60 anos, faz parte de uma companhia militar e é constantemente mobilizado.
O cidadão é obrigado a casar-se. Só são conservadas as criança bem constituídas. O patrimônio familiar é transmitido ao filho mais velho. Os filhos não têm meios de existência são expulsos da classe dos cidadãos e tornam-se periecos .
Os cidadãos não podem entregar-se ao comércio, nem possuir metais preciosos. Em princípio, todos conjuntamente formam a Assembléia, que detém a soberania . de fato, esta pertence à gerúsia, senado formado por 28 membros que se cooptam, e aos dois reis chefes do exército. A gerúsia propõe todos os anos à Assembléia cinco éforos que dirigem o Estado.
A igualdade dos sexos está bastante desenvolvida, parece, entre os cidadãos de Esparta. Encontram-se lá igualmente práticas comunitárias características, principalmente as refeições em comum.
Alias, estas instituições estão em vias de degenerescência e nos séculos III e II serão conduzidas lutas sociais duríssimas por aqueles que quererão restabelecer a antiga igualdade espartana.
Para ter um quadro quase completo dos fatos que puderam exercer influência sobre os filósofos gregos é necessário assinalar, finalmente a existência no mundo grego, mesmo na época do seu esplendor, de revoltas violentas das camadas sociais mais desfavorecidas.
Em Mégara, em 640, os camponeses pobres, sob a direção de Teagenes, tomam conta do Poder e dos bens dos proprietários ricos.
Cerca de 421, a população de Samoa insurge-se contra os geomores. Pela mesma época estala também uma revolta em Quios. Os escravos desempenham nela um papel importante e durante longos anos dominam os campos, sob a direção de Drimakos.
Produziram-se também outros movimentos, oriundos das camadas mais baixas da sociedade. O seu caráter comum é que se traduzem quase unicamente em pilhagens, sem que as revoltas se mostrem capazes de construir uma organização social duradoura.
O século V a.C. é o grande século de Atenas e da Grécia, aquele que vê despontar tantas obras-primas imortais. Mas é também aquele em que foram abalados os fundamentos tradicionais da vida social.
A civilização grega, desempenhou um papel decisivo na tomada de consciência pelo homem da sua dignidade própria.
Nos estados mais antigos, os homens são fundamentalmente os servidores do chefe do Estado, e a dignidade que se reconhecem não passa de uma participação no prestigio do chefe.
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