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Religião E Política Na Evangelização Dos Indígenas, Séculos XVI e XVII

Por:   •  21/11/2023  •  Dissertação  •  2.109 Palavras (9 Páginas)  •  40 Visualizações

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As colônias portuguesas, em especial o Brasil, não foram pensadas com o objetivo de povoamento, muito menos com o desejo de disseminar o cristianismo em um novo continente. A criação do Brasil foi e sempre será um projeto mercante. Slemian e Pimenta, em O ‘nascimento político’ do Brasil (2003, p. 11-12), denotam que os papéis dentro do Império português eram bem delineados: “enquanto uma delas (metrópole) controlava a administração-geral e as instâncias máximas de poder político [...], as outras deveriam fornecer matérias-primas, gêneros de exportação e mercados consumidores para a metrópole”. De um lado, Portugal e todo seu poder, do outro as colônias numa existência meramente subserviente.

O povoamento surge como derivado dos objetivos mercantes, como uma necessidade dado o tamanho e potência do Brasil. Caio Prado Jr. aponta em O sentido da colonização que:

Para os fins mercantis que se tinham em vista, a ocupação não se podia fazer como nas simples feitorias, com um reduzido pessoal incumbido apenas do negócio, sua administração e defesa armada; era preciso ampliar estas bases, criar um povoamento capaz de abastecer e manter as feitorias que se fundassem e organizar a produção dos gêneros que interessassem ao seu comércio. A idéia de povoar surge daí, e só daí. (PRADO JR; 2000, p. 24)

Assim, aqueles que migraram para o Novo Mundo não o faziam por outra razão se não com o propósito de enriquecer com o que aquela nova terra havia para oferecer. Na verdade, como bem notado também por Prado Jr., a América tropical não era a primeira opção dos europeus. Esses preferiam as zonas temperadas, onde o clima mais se assemelhava àquele da Europa; e se vinham por escolha própria, era para fugir de condições políticas ou econômicas – quase sempre ambas – que lhes assolavam em sua terra natal. Como resultado disso, a América do Norte é fundada à imagem e semelhança da Europa. Um lugar de refúgio para aqueles que precisavam deixar suas origens (PRADO JR; 2000, p. 26 e 27).

Já nos trópicos, o clima quente se apresenta tanto como empecilho como atrativo. Se por um lado não apetece aos europeus residir em um continente tão dissonante daquele do qual vieram, são as condições naturais que os repelem que possibilitam o cultivo e obtenção de gêneros escassos na Europa. Era necessário apenas que na terra se empenhassem para que tirassem proveito de todo seu potencial, mas o empenho laboral não é característica da qual os europeus eram afeitos. Se iam para os trópicos, era apenas com a intenção de ali tornarem-se senhores daqueles menos afortunados (PRADO JR; 2000, P. 28-29).

É com tal objetivo, objetivo exterior, voltado para fora do país e sem atenção a considerações que não fossem o interesse comércio, que se organizarão a sociedade e a economia brasileiras. [...] Virá o branco europeu para especular, realizar um negócio; inverterá seus cabedais e recrutará a mão-de-obra que precisa: indígenas ou negros importados. Com tais elementos, articulados numa organização puramente produtora, industrial, se constituirá a colônia brasileira. Este início, cujo caráter se manterá dominante através dos três séculos que vão até o momento em que ora abordamos a história brasileira, se gravará profunda e totalmente nas feições e na vida do país. (PRADO JR; 2000, p. 32)

Assim, instaurado o objetivo com o qual se via e vinha aos trópicos, era necessária força trabalhadora para fazer funcionar a máquina das colônias. Nos anos iniciais do Brasil, essa força será constituída pelos indígenas que ali já habitavam antes da chegada dos portugueses. Haverá, ainda, aqueles europeus de condições mais humildes que integrarão essa força ao chegarem nos trópicos. Deportados ou tendo vendido seu trabalho em troca de passagem para a América num desejo ávido para se refugiar das tribulações da Europa (PRADO JR; 2000, p. 29), eles não são, pois, senão um contingente muito pequeno e que não supre as necessidades das feitorias coloniais. Será preciso contar com a força que já era abundante naquelas terras.

Porém, visto que o Brasil prosperava e que a colônia ali instalada crescia progressivamente, não era possível que o lugar permanecesse sem a supervisão da Igreja. Além disso, escravizar os nativos não era tarefa fácil quando a cultura desses era tão divergente daquela europeia. Por isso, em 1549, vindos junto do primeiro governador-geral da colônia, Tomé de Sousa, chegaram os jesuítas.

Seu trabalho era zelar pela Igreja fixada no Brasil colonial e catequizar os nativos, mas não tardou para que denotassem um problema: sua missão evangelizadora era deveras complicada se os indígenas continuassem como parte integrante da máquina laboral. Seu status de escravos lhes servia de empecilho, pois trabalhando nos engenhos e sob jugo de seus senhores, os indígenas estavam submetidos a condições que não favoreciam sua catequização.

Foi estabelecido então um dilema, no qual prevaleceu a importância da Igreja sobre as necessidades da máquina comercial que era a colônia. Isso se deve também ao fato de que não apenas os indígenas compunham a vasta gama de escravos que trabalhavam nos engenhos. Grande parte desse contingente era de africanos, os quais o status de escravos não representava um impasse para os jesuítas, pois sua condição já era consensual antes mesmo da existência de um Brasil colonial.

Os indígenas então foram considerados livres pela Coroa e levados para assentamentos pelos jesuítas para que lá, longe da colônia e das más influências que os portugueses poderiam representar, eles pudessem ser catequizados. Receberiam a doutrina cristã, aprenderiam a ler e escrever, tudo em um ambiente imaculado onde as engrenagens de seu funcionamento giravam apenas para tornar os indígenas membros ideais da sociedade europeia e da Igreja. Era ignorada, obviamente, a opinião dos próprios indígenas quanto a ideia de uma nova cultura lhes sendo forçada em detrimento daquela que eles já possuíam.

Em se tratando de textos e documentos que evidenciem a chegada dos jesuítas e sua recepção por parte daqueles que deveriam catequizar, porém, não surpreende que os indígenas sejam retratados como excepcionalmente abertos à salvação que os missionários tinham para lhes oferecer.

Em A dispersão do saber missionário sobre as Américas de 1549 a 1610: o exemplo jesuíta, Jean-Claude Laborie chama a atenção para uma carta enviada por Manuel da Nóbrega – líder da primeira missão jesuíta no Brasil – para o P. Simão Rodrigues:

Todos estes que tratam comnosco, dizem que querem ser como nos, senão que nom tem com que se cubrão como nos, e este soo inconveniente tem. Se ouvem tanger à missa, ja acodem, e quanto nos vem fazer, tudo fazem:

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