A ESPECIALIZAÇÃO EM LINGUÍSTICA E ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA PORTUGUESA
Por: Anderson Almeida • 23/4/2020 • Ensaio • 1.396 Palavras (6 Páginas) • 220 Visualizações
[pic 1]UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA
DEPARTAMENTO DE LETRAS E ARTES
ESPECIALIZAÇÃO EM LINGUÍSTICA E ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA PORTUGUESA
O TEXTO, O LEITOR E A LEITURA NA PERSPECTIVA DA ANÁLISE DE DISCURSO PECHEUTIANA: UMA NOTA PARA TODOS OS PROFESSORES.
Anderson de Almeida Santos
O livro didático é tido como uma ferramenta de extrema importância no ambiente escolar, e por alguns professores, pois é tomado não apenas como suporte teórico, mas como um determinante nas atividades pedagógicas, sendo ferramenta de ensino e aprendizagem para muitos que os utilizam. Em vista disso, os discursos que circulam sobre o livro didático indicam diferentes pontos de vistas, através das formulações pelos sujeitos que enunciam em posições distintas na sociedade, e consequentemente, as suas filiações discursivas e ideológicas.
A Análise de Discurso de Linha Francesa, por diante AD, tem como objeto de estudo o discurso que se materializa em diversos textos. O analista do discurso se debruça sobre os textos para perceber o modo como esses se inserem dentro da atividade discursiva para compreendê-los.
Na AD, o texto é visto como a materialização do discurso e como um elemento que se apresenta tal qual uma peça dentro do conjunto de enunciados que constitui a atividade discursiva. É uma peça que permite o jogo da interpretação, o deslizamento dos sentidos. Assim, afirma Orlandi (2001, p.63):
O texto pode ser considerado como uma peça no sentido de engrenagem. É uma peça que tem um jogo, jogo que permite o trabalho de interpretação, do equívoco. Há um espaço simbólico aberto- possibilidade do sujeito significar e ressignificar indefinidamente que joga no modo como a discursividade se textualiza.
O texto está construído a partir de todo o já-dito, sendo manifestação do discurso, não podendo ser observado de forma isolada. A esse respeito, Orlandi (2001, p.64) afirma: [...] se vemos no texto a contrapartida do discurso – efeito de sentidos entre locutores– o texto não mais será uma unidade fechada nela mesma. Ele vai se abrir, enquanto objeto simbólico, para as diferentes possibilidades de leituras [...].
O texto como objeto simbólico está submetido a falhas, ao equívoco. Portanto, não se pode entendê-lo como um produto pronto e acabado, como um elemento completo e fechado em si próprio. Sobre essa questão, já afirmava: Pêcheux (1997, p.53) “todo enunciado é intrinsecamente suscetível de tornar-se outro, diferente de si mesmo, de se deslocar discursivamente para derivar para um outro.”
A concepção de texto na Análise de Discurso é o de que ele sempre comporta outros sentidos, outras significações, a ser capturado pelo leitor, pois no processo de leitura, o texto é submetido à opacidade da língua. Em relação a isso, Orlandi (2001, p.64) assevera que:
A multiplicidade de leituras, vista a partir desta relação imperfeita do texto com a discursividade, deixa de ser algo psicológico, da vontade do sujeito, e passa a ter uma materialidade: a textualidade, enquanto matéria discursiva, dá ensejo a várias possibilidades de leituras.
Deste modo, o texto é entendido como elemento do jogo discursivo, em que a multiplicidade de leitura é polissêmica, em que o sentido pode ser sempre outro, está sujeito ao deslizamento, ao equívoco, uma vez que os sujeitos discursivos anunciam de lugares diferentes, e isso interferem os efeitos de sentidos por ele proferidos. Assim, os sentidos relacionam-se com as formações discursivas e ideológicas que interpelam os sujeitos no momento em que eles entram em contato com um texto.
No entanto, apesar de toda a contribuição dada pelos estudos discursivos para a concepção de texto e sentido, é possível notar que grande parte dos livros didáticos utilizados nas escolas pelos professores, ainda, continua a tratar o texto como produto cujo sentido está cristalizado, materializado, e o leitor também é visto como um reprodutor do sentido solicitado pelo autor.
Se os sentidos derivam das formações discursivas às quais os sujeitos se filiam para se constituírem como tais, então não há um sentido único para o texto, há formas de significação desse texto em relação à discursividade da qual o mesmo se origina. Isto posto, a leitura tem como papel fundamental romper com a ideia de que existem sentidos preestabelecidos e estabilizados. Assim, a leitura é um trabalho simbólico, não é a simples captação de um sentido preestabelecido, estabilizado, ela possibilita diferentes modos de significação.
No jogo da leitura estão envolvidos alguns processos de relação com o sentido quais sejam: a inteligibilidade, a interpretação e a compreensão. Segundo Orlandi (1988) o inteligível refere-se ao processo pelo qual se atribui um sentido atomizadamente. Já interpretar é atribuir um sentido ao texto, levando em conta exclusivamente o cotexto, ou seja, as ligações entre os enunciados que compõem a textualidade. Interpretar é uma atividade mais relacionada à semântica interna do texto, sem levar em conta a exterioridade que o constitui. Por outro lado, a compreensão vai além da interpretação, pois para compreender “é preciso relacionar os diferentes processos de significação que acontecem em um texto, [...] é compreendê-lo enquanto objeto linguístico-histórico.” (ORLANDI, 2001, p.70). A atividade de compreensão é mais complexa, colocando o texto em relação com o processo de enunciação, com o contexto histórico no qual o mesmo se inscreve.
Ao pensar no modo como o texto vem sendo tratado na escola, é possível perceber que o mesmo é visto como uma unidade fechada. E a leitura termina caminhando do inteligível para o interpretável, não chegando ao nível da compreensão. Por isso, a atividade de leitura, vista como um evento discursivo, desloca a ideia tradicional de autoria e de que existe um sentido intencional gerado pelo autor ao produzir um texto. Assim, considerar que há um sentido único é deixar de lado a historicidade e a exterioridade que constituem a linguagem como elemento simbólico. Dado que, o sentido não pode ser controlado pelo autor, pois não existe um sentido preestabelecido, mas sentidos possíveis que são construídos pelos leitores nos gestos de interpretação.
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