O OLHAR SEMIÓTICO DE UMA FORMADORA DE OPINIÃO
Por: Carlos Wagner Rodrigues da Silva • 6/3/2021 • Artigo • 4.944 Palavras (20 Páginas) • 111 Visualizações
VEJA: OLHAR SEMIÓTICO DE UMA FORMADORA DE OPINIÃO
PROFA. DRA. ROSANA HELENA NUNES
Mesmo que os outros sejam o inferno, o homem está inelutavelmente preso ao outro naquilo que há de mais caracteristicamente humano, a linguagem. A alteridade é uma dimensão constitutiva do sentido. Não há identidade discursiva sem a presença do outro. (Fiorin[1], 1984, p.36)
Este texto centra-se no exame da representação das capas da revista VEJA, publicadas em períodos diferentes para refletir cenários diversos. O objetivo é o de discutir as possíveis leituras de enunciados verbais e visuais, estudando suas modalidades de expressão do ponto de vista do olhar linguístico, semiótico e semântico a fim de discutir como a produção das mensagens sincréticas das três capas pode representar opiniões ou inclinações ideológicas diversas que podem explicar os efeitos de verdade em determinados momentos históricos.
Sabe-se que a semiótica tem por objeto o texto e procura descrever e explicar o que o texto diz e como ele faz para dizer o que diz (Barros, 2002). Em outros termos, a semiótica apresenta-se como uma teoria da relação. E é a relação entre unidades que determina o valor de cada uma no interior do texto. Nesse estudo, interessa, basicamente, estudar como as linguagens foram hierarquizadas e trabalhadas dentro de certas técnicas para produzir certos efeitos de sentido, como é o caso da análise das capas. A ideia de efeito implica verificar que os sentidos foram construídos, ou seja, pensados para que pudesse causar certas impressões em relação àquilo que é veiculado (mídia impressa).
Para tanto, a primeira divisão teórica do texto é separar o plano de conteúdo – lugar dos conceitos – e o plano de expressão – lugar de trabalho das diferentes linguagens que irão, de algum modo, carregar os sentidos do plano de conteúdo.
Em se tratando de um texto sincrético, o trabalho tem por objetivo estudar a relação semi-simbólica como uma homologação entre diferentes linguagens que se articulam – o plano da expressão e o plano do conteúdo – tendo como corpus de análise as capas da revista da VEJA.
Pretende-se, pois, mostrar que essa homologação corresponde a um texto sincrético (a articulação dos dois planos para estabelecer um único sentido).
Para Greimas & Courtés (1979, p. 426), o termo sincretismo apresenta as seguintes definições:
1 – Pode-se considerar o sincretismo como o procedimento (ou seu resultado) que consiste em estabelecer, por superposição, uma relação entre dois (ou vários) termos ou categorias heterogêneas, cobrindo-os com o auxílio de uma grandeza semiótica (ou linguística) que os reúne. Assim, quando o sujeito de um enunciado de fazer é o mesmo que o do enunciado de estado (é o que se dá com o programa narrativo da aquisição por operação à atribuição, onde os dois sujeitos correspondem a dois atores distintos), o papel actancial que os reúne é o resultado de um sincretismo. Na frase “Eva dá uma maçã a Adão”, o sujeito frasal “Eva” representa o sincretismo dos actantes sujeito e destinador. O sincretismo assim conseguido acha-se ligado à utilização de uma unidade linguística (sujeito frasal) que pertence a um nível de geração mais superficial que os dos actantes: trata-se, pois, de um sincretismo a posteriori. Ao contrário, quando se define, por exemplo, a instância da enunciação como o lugar de uma indistinção original do “eu-aqui-agora”, a enunciação deve ser vista como um sincretismo a priori.
2 – Num sentido mais amplo, considerar-se-ão como sincréticas as semióticas que – como a ópera ou o cinema – acionam várias linguagens de manifestação; da mesma forma, a comunicação verbal não é somente de tipo linguístico: inclui igualmente elementos paralinguísticos (como a gestualidade ou a proxêmica), sociolinguísticos, etc.
Jean-Marie Floch (1985) (1995) (1997), como precursor dos estudos referentes ao semi-simbolismo, afirma que não há como separar em dois planos, um complementa o outro – a semiótica plástica e o sistema semi-simbólico sincrético permitem refletir sobre o modo como se constrói o plano da expressão e o plano do conteúdo.
Assim, para análise das capas, considerar-se-ão, para os enunciados verbais, categorias semânticas. No plano de conteúdo, seguir-se-á o percurso gerativo de sentido da semiótica greimasiana. E, para o plano da expressão, a análise das categorias plásticas. Por fim, a homologação entre os dois planos (conteúdo e expressão), ou seja, a relação semi-simbólica entre ambos.
O sincretismo na VEJA
A Veja, como uma formadora de opinião, representa o olhar do enunciador em relação ao enunciatário. Como ressalta Landowski (2002), ao desenvolver estudos sobre uma prática semiótica em situação, a determinação do sentido é atribuída à presença do outro, diante de nós, ao nosso lado, ou mesmo, em nós, e isso implica na forma de própria identidade do sujeito.
Desse ponto de vista, o sujeito não se torna diferente – eu ou nós - se considerá-lo como uma grandeza sui generis a constituir-se na sua própria “identidade”. Esse sujeito, ameaçado pela diferença, tem necessidade de um ele – dos outros (eles) – para chegar à existência semiótica. Considera-se que o “eu” apenas se define a partir do outro e, além disso, o que o outro apresenta como diferença perante o eu, configura-se na própria consciência coletiva, a emergência do sentimento de “identidade” como uma intermediação de uma “alteridade” a ser construída.
Para esse estudo, serão consideradas três capas a partir de duas abordagens. A primeira parte refere-se a algumas considerações a respeito da capa e marca VEJA como a criação de um ethos. (Maingueneau, 1997). A segunda, a análise semi-simbólica da capa à luz de Jean-Marie Floch (1985).
Sabe-se que a semiótica greimasiana apresenta o percurso gerativo de sentido, com três níveis (discursivo, narrativo e fundamental). Quando se trata de texto verbal, a subdivisão se dá por meio do plano de conteúdo e plano de expressão. Já com texto sincrético, a subdivisão ocorre, além dos dois planos de análise por meio dos três níveis, há a homologação entre ambos, a relação semi-simbólica por meio de categorias semânticas e categorias plásticas.
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