OS PROBLEMAS DE COMUNICAÇÃO INTER DIALETAL
Por: irag • 14/12/2017 • Trabalho acadêmico • 1.791 Palavras (8 Páginas) • 1.280 Visualizações
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PROBLEMAS DE COMUNICAÇÃO INTERDIALETAL
Stella Maris Bortoni-Ricardo
“[...]A língua portuguesa no Brasil apresenta uma ampla gama de variação que pode ser melhor compreendida se imaginarmos um continuum em cujas as extremidades se colocam, de um lado, os dialetos rurais falados em áreas isoladas, e, de outo, a variedade padrão falada em áreas urbanas pelos grupos sociais com alto nível de instrução. Ao longo do continuum distribuem-se, sem fronteiras definidas, variedades mais próximas ou mais distantes de normas culta ideal dependendo de diversos fatores condicionadores da variação da língua. [...]” (p.10)
“O corpus analisado consiste de ocorrências de problemas de comunicação no transcurso de entrevistas feitas com migrantes da zona rural radicados em Branzlândia, cidade satélite de Brasília. Procurou-se identificar, em cada exemplo selecionado, a natureza da dificuldade na comunicação, atentando-se também para as estratégias empregadas pelos falantes para pedir e fornecer esclarecimentos. [...]” (p.10)
“[...]Quero argumentar, contrariamente, que evento de fala, muitos semelhantes á entrevista sociolinguísticas ocorrem com bastante frequência no cotidiano dos migrantes entrevistados, como, por exemplo, numa consulta médica, no cadastramento na Secretaria de Serviços Sociais ou órgão do Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, por ocasião da matricula dos filhos na escola, num interrogatório da polícia ou no tribunal, etc. A dificuldade que alguns informantes demonstram em manter uma comunicação fluente e efetiva com os pesquisadores não deve ser vista, portanto, como fenômeno isolado, mas sim como manifestação de um problema rotineiro.” (p.11.)
“Ao considerar as determinações rituais que incidem sobre entrevista estruturada, é preciso levar-se com conta três importantes características do eventos, que estão relacionadas aos papéis sociais dos participantes, mais propriamente aos direitos e deveres relacionados a esses papéis. Essas características são a posição assimétrica dos interlocutores, sua disposição para a “convergência” na linguagem e a insegurança linguística de muitos informantes. A segunda e a terceira são, naturalmente, decorrência da primeira” (p12.)
“Do ponto de vista social, a situação é estruturalmente assimétrica, o pesquisador é um professor ou um estudante universitário, e o informante é um indivíduo pertencente a uma classe social inferior, analfabeto ou semialfabetizado. Os esforços do entrevistador de estabelecer uma relação amistosa e cordial com o informante podem amenizar a assimetria, mas não anulam. Ademais, de acordo com a determinações sistêmicas do evento, o entrevistador exerce função dominante pois cabe a ele o direito unilateral de fazer perguntas e introduzir tópicos.Ao contrário de outros tipos de diálogos, os papeis são bem definidos a priori e o informante, uma vez que tenha concordado de ser entrevistado dispõe de liberdade muito restrita de desconsiderar perguntas ou se recusa-las a responde-las.” (p.12)
“Uma segunda característica de entrevista como evento de fala é disposição dos participantes de convergir suas linguagem. A convergência na linguagem é parte de um processo de acomodação por meio do qual os falantes procuram minimizar diferenças em sua fala (cf.Glides,1980). Pode manifestar-se em diversa dimensões, tais como mudança de código ou registro, alterações de pronúncia, de intensidade vocal, de padrões proxêmicos, i. e. de proximidade física, ou e postura, ou até na seleção de tópicos da conversa. São evidencias de convergências por parte do entrevistado as frequentes ultracorreções em sua fala e a per e a permanente boa vontade de relatar episódios ou fornecer informações que julgavam relevantes para pesquisa.” (p.13)
“Dois episódios durante a entrevista com a mesma informante ilustram a mudança de registro como estratégia de convergência. Na primeira (1), a entrevistadora emprega as siglas INPS e FUNRURAL, mas antecipando a possibilidade de incompreensão, reformula a pergunta, acrescentando informações, ainda no primeiro lance (“move”; cf. Sacks ET AL., 1974). O recurso não foi suficiente, porém, para um total entendimento, e a informante pede clarificação (n°2). A entrevistadora, então, introduz a palavra ‘Instituto’, mais conhecida do que as siglas referidas antes (n°3).”(p. 14)
“Outra estratégia de convergência nas entrevistas foi o emprego do que Duncan (1974:166) denominou canais de retorno (“ back channels”), que são usados pelo ouvinte para demonstrar atenção e envolvimento na conversa. Podem ocorrer como um simples meneio de cabeça, na forma de uma interjeição (“um, rum”; “é”), ou de uma complementação de sentença [...] de breves pedidos de esclarecimento ou, ainda, de reformulação do pensamento anteriormente expresso pelo outro. Nas entrevistas, eram usados para manifestar concordância e funcionavam como um reforço positivo que encorajava o entrevistado e mantinha o fluxo da conversa.”(p. 15)
“Os esforços de convergência de ambas as partes não puderam evitar, contudo, muitos problemas de compreensão. Esses problemas decorrem em parte da insegurança lingüística do informante e, num círculo vicioso, podem contribuir para aumentá-la.” (p. 15)
“Nem todos os informantes manifestavam, abertamente, embaraço ou insegurança diante dos ocasionais desacertos na comunicação com o entrevistador. As mulheres, principalmente as mais velhas, eram as que mais frequentemente externavam essas atitudes. Não se referiam, porém, a diferenças de natureza lingüística; atribuíam seus problemas de incompreensão a falhas de memória ou a deficiência de suas ‘cabeças’.” (p. 15)
“Em todos os depoimentos pode-se perceber claramente a posição de desvantagem dos informantes tanto do ponto de vista social como da organização dialógica. Entretanto, os esforços de convergência dos entrevistadores tornam a situação mais cômoda para os entrevistados. Diante disso, é possível concluir que essa situação de desvantagem agrave-se quando o migrante se defronta, numa interação assimétrica, com um interlocutor que não estela disposto a convergir a linguagem, ou que nem sequer tenha consciência de diferenças dialetais.” (p. 16, 17)
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