Sim Senhor
Artigos Científicos: Sim Senhor. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: japzn13 • 13/11/2013 • 997 Palavras (4 Páginas) • 241 Visualizações
cauda do cometa espraiava-se pela madrugada, um corte vermelho que sangrava por cima
dos penhascos da Pedra do Dragão como uma ferida num céu cor-de-rosa e púrpura.
O meistre estava em pé, na varanda varrida pelo vento, do lado de fora dos seus aposentos.
Era ali que chegavam os corvos, depois de longos voos. Os excrementos das aves salpicavam as
gárgulas, que se erguiam a uma altura de três metros e meio, de ambos os lados; um mastim do
inferno e uma serpe,* dois dos mil exemplares que se empoleiravam nas muralhas da antiga fortaleza.
Quando chegara à Pedra do Dragão, o exército de grotescas esculturas de pedra costumava
deixá-lo incomodado, mas, com a passagem dos anos, foi se acostumando. Agora, pensava
nelas como em velhas amigas. Os três observaram juntos o céu, tomados por pressentimentos.
O meistre não acreditava em presságios. E, no entanto... Apesar de ser tão velho, Cressen
nunca vira um cometa com metade do brilho daquele, nem daquela cor, aquela cor terrível, do
sangue, da chama e dos crepúsculos. Perguntou a si mesmo se suas gárgulas já teriam visto algo
parecido. Já estavam ali muito tempo antes de ele chegar, e ainda lá permaneceriam muito depois
de ele partir. Se línguas de pedra falassem...
Que tolice. Encostou-se nas ameias, com o mar batendo lá embaixo e a pedra negra áspera
sob os seus dedos. Gárgulas falantes e profecias no céu. Sou um velho acabado que se tornou de
novo leviano como uma criança. Teria a sabedoria duramente conquistada ao longo de uma vida
inteira fugido com a saúde e a força? Era um meistre, treinado e acorrentado na grande Cidadela
de Vilavelha. A que ponto chegara, se a superstição lhe enchia a cabeça como se fosse um camponês
ignorante?
E no entanto... No entanto... Agora, o cometa brilhava até durante o dia, enquanto o vapor
cinza-claro se erguia da cratera quente do Monte Dragão, atrás do castelo. E na manhã anterior,
um corvo branco tinha trazido notícias da própria Cidadela, há muito esperadas, mas não menos
temíveis por isso, notícias do fim do verão, Tudo presságios. Demasiados para ser negados. Que
significa tudo isso?, ele quis gritar.
- Meistre Cressen, temos visitantes - Pylos falou suavemente, como se estivesse relutante
em perturbar as meditações solenes de Cressen. Se soubesse dos disparates que lhe enchiam a
cabeça, teria gritado. - A princesa deseja ver o corvo branco.
Sempre correto, Pylos a chamava agora princesa, visto que o senhor seu pai era um rei. Rei de
um rochedo fumegante no grande mar salgado, mas ainda assim rei.
- O bobo veio junto.
* Serpe: criatura mitológica semelhante a um dragão, mas de porte menor e mais longilíneo, com apenas
duas patas. (N. E.)
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O velho virou as costas à alvorada, mantendo uma mão pousada sobre a serpe a fim de se
equilibrar.
- Ajude-me a chegar até a cadeira e mande-os entrar.
Tomando seu braço, Pylos o levou para dentro. Na juventude, Cressen caminhara com vigor,
mas agora não estava longe do octogésimo dia do seu nome, e tinha as pernas frágeis e instáveis.
Há dois anos um tombo lhe causara fratura de um lado da bacia, da qual nunca chegou a ficar
curado totalmente. No ano anterior, quando tinha adoecido, a Cidadela enviara Pylos de Vilavelha,
apenas dias antes de Lorde Stannis ter fechado a ilha... para ajudá-lo nas suas tarefas,
tinham dito, mas Cressen sabia a verdade. Pylos viera para substituí-lo quando morresse. Não se
importava. Alguém teria de ocupar seu lugar, e em menos tempo do que teria gostado...
Deixou que o homem mais novo o acomodasse atrás dos seus livros e papéis.
- Vá buscá-la. É feio deixar uma senhora esperando.
O meistre acenou, um frágil gesto de pressa de um homem que já não era capaz de se apressar.
Tinha a pele enrugada e manchada,
...