Abuso Sexual Intrafamiliar - Dialnet
Por: Sandra Cristina • 21/8/2016 • Artigo • 6.026 Palavras (25 Páginas) • 532 Visualizações
Abuso Sexual Intrafamiliar: Concepções de Profissionais que Atendem Crianças que Foram Vítimas de Abuso |
Renata Schroeder Laner1 Denise Falcke2 |
Resumo O abuso sexual intrafamiliar é um fenômeno complexo, que pode acarretar consequências graves para o desenvolvimento infantil. Este trabalho buscou investigar as concepções de profissionais que atendem vítimas de abuso sobre esta realidade. Foi realizado um estudo qualitativo, com delineamento exploratório. Participaram cinco profissionais que trabalham em dois abrigos estaduais do município de Porto Alegre. Eles responderam uma entrevista semi-estruturada, na qual avaliaram a dinâmica familiar de crianças abusadas sexualmente por seu(s) familiar(es). Os dados foram trabalhados por análise de conteúdo. Os resultados revelaram que os profissionais possuem concepções equivocadas com relação à dinâmica do abuso sexual intrafamiliar, especialmente no que se refere às características da vítima e do abusador, e revelam sentimentos que podem dificultar o manejo das situações com as quais se deparam. Evidenciou-se a necessidade de intervenções de cuidado com o cuidador, para que os profissionais possam ser acolhidos em suas angústias e fortalecidos em suas atividades profissionais. |
Palavras-chave: Abuso Sexual; Incesto; Abrigo. |
Intrafamilial Sexual Abuse: Conceptions of Professional who Treat Children who have been Abused |
Abstract The intrafamilial sexual abuse is a complex phenomenon that causes serious consequences for child development. This work aimed to investigate the views of professionals that work directly with child victims of sexual abuse about this reality. A qualitative study was conducted. The exploratory study included five professionals that work in two state shelters in the city of Porto Alegre. They answer a semi-structured interview, which was identified as they assess the family dynamics of children sexually abused by their(s) family member(s). Interview data were processed through content analysis. The results revealed that professionals have misconceptions regarding the dynamics of intrafamilial sexual abuse, especially with regard to the characteristics of both victim and abuser. Furthermore, they show feelings which may complicate the management of situations they faced. The results show the need for interventions in the direction of care for the caregiver, so that professionals can be accommodated in their distress and strengthened in their professional activities. |
Key-words: Sexual Abuse; Incest; Shelter. |
Dados estatísticos têm evidenciado o quanto nosso país está servindo de palco para a violência contra crianças e adolescentes. Há registros referentes à violência, apontando que 96% dos casos de violência física e 64% dos casos de violência sexual, são cometidas por familiares, vitimizando, principalmente, crianças de até seis anos de idade (UNICEF, 2011). Baptista, França, Costa e Brito (2008) dizem que vem ocorrendo um aumento da freqüência deste tipo de violência, proporcionando dor e sofrimento a todos envolvidos. Deve-se considerar ainda que os dados[pic 5]
- Psicóloga, formada pela Unisinos. E-mail: relaner@gmail.com
estatísticos referentes à violência são subdimensionados, tendo em vista que muitos casos nem chegam a ser denunciados devido à fragilidade dos registros nos sistemas. Em se tratando de violência doméstica sexual ainda existe o denominado “complô de silêncio” que dificulta a denúncia (UNICEF, 2011). Braun (2002) expõe que, na maioria das vezes, essa violência fica sem registro em virtude do medo que a criança ou o adolescente sente pelo mal que pode lhe ser causado ao quebrar esse segredo.
- Doutora em Psicologia, Professora e Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), Terapeuta de Casal e Família. E-mail: dfalcke@unisinos.br
A violência sexual contra as crianças consiste em um ato ou jogo sexual em que o adulto coage a criança ou adolescente a estimulá-lo sexualmente, podendo ser realizada com pessoas do mesmo sexo ou do sexo oposto, lembrando que o adulto é sempre ré e a criança vítima (Caminha & Flores, 1994). Esta realidade não faz parte de determinados âmbitos sociais; tampouco é privilégio de um ou outro grupo da sociedade, e traz conseqüências de diferentes naturezas, sejam físicas, psicológicas e/ou sociais (Braun, 2002). Pelisoli, Teodoro e Dell’Aglio (2007) sugerem que uma família disfuncional, em que o abuso sexual faz parte de seu contexto, pode contribuir para que a criança abusada tenha sentimentos de menos valia, raiva, baixa auto-estima, agressividade exacerbada. Sentimentos e comportamentos que aparecem não só no meio familiar, mas na escola e em qualquer outro contexto do qual a criança faça parte.
O envolvimento dos profissionais da saúde e o cumprimento dos aspectos normativos são de fundamental importância para trabalhar com os casos de abuso sexual, porque envolve aspectos legais e psíquicos tanto da vítima, do(a) abusador(a), quanto da família envolvida, começando pela denúncia e complementando com tratamento terapêutico e outras ações que sejam necessárias (Furniss, 1993). Unindo-se estes conhecimentos às tecnologias diferenciadas e específicas dos profissionais responsáveis e atuantes no campo referente à atenção e à saúde, e interligando esta atuação a outras iniciativas, se produz a construção de redes de atenção aos adultos, às crianças e aos adolescentes submetidos à violência doméstica e sexual. Estas redes em questão devem atuar conjuntamente com o sistema de proteção de direitos de crianças e adolescentes, formando uma trama constituída em virtude de tal proteção (Brasil, 2006). Sendo assim, o objetivo deste estudo é conhecer as concepções de profissionais da saúde sobre como se dá a dinâmica do abuso sexual intrafamiliar, visando o planejamento futuro de intervenções para favorecer o trabalho dos profissionais que estão atuando diretamente com crianças vítimas de abuso sexual intrafamiliar, em virtude de aprimorar o atendimento oferecido às mesmas.
Abuso sexual intrafamiliar
O abuso sexual intrafamiliar é equivalente ao incesto. Tem sua ocorrência dentro da própria família. A pessoa incestuosa sente atração pela criança, com quem possui algum grau de parentesco (Caminha & Flores, 1994). É característico nas famílias disfuncionais, havendo possibilidade de histórias de violência doméstica sofrida pelo abusador, pai e/ou mãe ou ainda cuidadores negligenciados por suas famílias de origem, bem como histórico de dependência química (Silva & Kein, 1999).
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