Fichamento: Rituais de Sofrimento

Fichamento: Rituais de Sofrimento – Silvia Viana

Silvia Viana, em seu excerto do livro Rituais de Sofrimento, capítulo 3, inicia tecendo a falsa esperança pela qual os mais famosos Reality Shows passam aos participantes que ficam “à mercê” da subjetividade criteriosa que são dotados os programas, selecionando por meios misteriosos os premiados e punidos, mas ainda assim parte de um parâmetro: o carisma. Propriedade que ela pontua ser fator crucial para vencer, mostrar uma pessoa que é capaz de agradar ao público e ao mesmo os jurados, de maneira que cada indivíduo a possui diferentemente.

Ainda que haja como critério algo como um traço de personalidade, ela diz que ser único à seu próprio modo apresenta uma dicotomia de resultados e portanto o participante deve adotar de estratégias mesmo que não o queira e não o faça, pois isso também é uma estratégia, “o imperativo da pró-atividade” nesse ponto torna-se um dogma, independente do que faça deve se fazer algo buscando melhorar já que o potencial de cada indivíduo também se torna uma variável e, claro, uma maneira subjetiva e única de julgamento. Tudo para buscar compatibilidade ao público ou simplesmente para inspira-los, mas de toda forma, o participante deve tornar-se um espelho para o público.

Todos os programas a partir de sua criação genuína partem do mesmo princípio: sobrevivência. Esse é de fato o que permeia todas as ações, condutas, conversas, entrevistas, declarações, discussões, etc. A lei da sobrevivência busca a adaptabilidade do indivíduo ao meio, e é exatamente assim que os programas condicionam seus participantes, colocando barreiras e muros os quais eles devem criar meios de passar, sem questionar ou reclamar, afinal o proposto parte de uma ordem superior, a indústria, que de maneira generalizada deve ser acatada. Para além disso, prevê a escolha certa, mas desconhece os parâmetros para tal.

Posteriormente, pontua os sacrifícios aplicados pelos participantes desses muitos programas que, frutos de uma relação de igualdade entre capital e trabalho, objetificam e mercantilizam a si próprios como um ato de investimento no futuro. Seres humanos detém qualidades que devem ser observadas da mesma forma que dinheiro e este deve ser aplicado no mercado de forma a gerar mais dinheiro, investimento no sentido financeiro da palavra tornou pessoas mercadorias dispostas a se vender visando um benefício a longo prazo, tal qual investir na bolsa. Sendo assim, a regra de mercado aqui é válida e, portanto, a lei da oferta e procura também, dessa forma, os “vendedores” de seus “produtos” devem seguir o movimento do mercado e abdicar de noções de rigidez.

Frente a essa concepção de capitalização humana, ela põe em cheque também as mercadorias adotadas como também uma forma de investimento, mas na sociedade dita hedonista, transparece uma falsa ilusão de compra por prazer. As pessoas têm medo do consumir e a descaracterização dos produtos assumindo um duplo caráter, sendo A e B ao mesmo tempo, mas de forma que B tire o componente principal de A, esboça isso. No fundo o próprio consumo é um investimento e no meio disso, os Reality Shows têm papel fundamental em consagrar o necessário que cada classe tenha para continuar fazendo parte dela e, ainda, criar estereótipos a serem seguidos em busca de atingir um ideal aceito pela grande indústria. E mais que isso, a constante revalidação dessa mesma indústria é uma variável que deve ser levada em consideração no momento de estampar nos rostos de todos um padrão, afinal, tal como o capital não pode manter-se fixo, a indústria também não, e, as noções de garantia e temporalidade devem ser abdicadas, uma vez que o passado já não mais é o presente e, portanto, deve ser reestruturado o agora.