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As Evidências do Cotidiano Área de Atuação

Por:   •  18/3/2021  •  Resenha  •  2.006 Palavras (9 Páginas)  •  137 Visualizações

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As evidências do cotidiano

É comum em nosso cotidiano fazermos perguntas, afirmações e até avaliarmos coisas e pessoas. Quando os ânimos estão exaltados é corriqueiro gritarmos com outras pessoas, mas sempre tem alguém querendo acalmar os ânimos e chegar a um consenso, resolver o desentendimento forma justa. Em alguns momentos pegamos nossos pais e amigos fazendo comentários de que somos subjetivos em relação às namoradas por tanto escolhermos, logo vem às perguntas a fim de comprovar se a pessoa é ou não uma boa companhia. Através de simples perguntas como “que dia é hoje?” ou “que horas são?” ficamos na expectativa de uma resposta exata. O tempo passa e, por isso, pode ser medido em horas e dias e o que já passou é diferente do agora e o que virá também será diferente, o nosso passado pode ser lembrado, e o futuro, esse pode ser desejado e ao mesmo tempo temido, assim uma simples pergunta contem vários sentidos não questionados por nós.

Sonhar é diferente de estar acordado, no sonho o impossível e improvável se apresentam como possível e provável, além disso, o sonho se relaciona com o irreal, já a vigília com o que realmente existe.  Devido à capacidade de perceber e conhecer tal como muitas vezes diferenciamos a realidade da ilusão acredito, portanto, que a realidade existe fora de nós. Assim, ao acreditar que sei distinguir razão de loucura, acredito também que a razão se refere a uma realidade que é a mesma para todos, ainda que sejamos diferentes.

Acreditamos que nossa realidade é feita de causalidade, que as coisas, fatos, situações se encadeiam em relações causais que podemos conhecer e controlar para o uso de nossa vida. Acreditamos que as coisas ou pessoas podem ser comparadas, avaliadas e julgadas pela qualidade ou quantidade afirmando assim que ambas existem e que é possível conhecê-las e usá-las ao nosso favor. A nossa percepção alcança as coisas ora como são em si mesmas, ora como nos aparecem considerando, portanto, que o espaço existe e possui qualidade e quantidade e que, por isso, pode ser medido. Está presente em nossa crença que há diferença entre verdade e mentira, enquanto a primeira diz realmente como as coisas são a segunda distorce a realidade, no entanto consideramos a mentira diferente do sonho, da loucura e do erro, porque o sonhador e o louco se iludem involuntariamente, enquanto o mentiroso decide voluntariamente deformar a realidade e os fatos, acreditamos com isso que erro e mentira são falsidades diferentes porque somente na mentira há a decisão de falsear. Ao diferenciarmos erro da mentira, manifestamos silenciosamente que somos dotados de vontade e que dela depende dizer a verdade ou mentira, porém nem sempre avaliamos a mentira como algo ruim e que não seja aceitável. Quando distinguimos verdades e mentiras aceitáveis ou inaceitáveis não estamos apenas nos referindo ao conhecimento ou desconhecimento da realidade, mas também o caráter de todos, com isso ao possuir vontades as pessoas podem ser morais e imorais, pois cremos que ela é livre para o bem e para o mal. Consideramos então que quando alguém defende um ponto de vista, uma preferência ou opinião de forma incisiva chegando a brigar por isso esse alguém perde sua objetividade e acaba sendo ditado pela subjetividade, o nos torna a acreditar dessa forma que ambas existem e que a primeira diferente da segunda não deforma a realidade. Ao dizermos que alguém “é legal” por possui o mesmo habitat que o nosso estamos silenciosamente acreditando que a vida com outras pessoas nos faz semelhantes ou diferentes. Achando óbvio que todos os seres humanos que cultivam das mesmas regras e normas de conduta vivem na companhia de seus semelhantes e procuram distanciar-se dos diferentes, dos quais discordam, acreditamos com isso que somos seres morais e racionais pois regras, normas, valores e finalidades só podem ser estabelecidas por seres conscientes e dotados de raciocínio. Nossa vida cotidiana é feita de crenças silenciosas, da aceitação de evidências que nunca questionamos porque nos parecem óbvias.

A atitude filosófica

Imaginemos que alguém fizesse perguntas inesperadas como “o que é o tempo?”, que em vez de gritar “mentiroso!”, questionasse “o que é mentira?”, em vez de falar subjetividade dos namorados indagasse “O que é o amor?” se, em lugar de discorrer sobre “maior” e “menor” resolvesse investigar “o que é a qualidade?” e se, em vez de afirmar que gosta de alguém que possui as mesmas idéias preferisse analisar “o que é um valor moral?”, alguém que tomasse essas decisões estaria se afastando do cotidiano e de si mesmo passando a indagar o que são as crenças e os sentimentos que alimentam silenciosamente  nossa existência. Ao tomar essas decisões ele estaria disposto a conhecer, saber o porquê sentimos e o que são nossas crenças e sentimentos, esse alguém estaria adotando a chamada atitude filosófica. Assim, uma primeira resposta à pergunta “O que é filosofia?” poderia ser: a decisão de não aceitar como óbvias e evidentes as coisas, as idéias, os fatos, as situações, os valores, os comportamentos do nosso cotidiano, jamais aceitá-los sem antes havê-los investigado e compreendido.

A atitude crítica

A primeira característica da atitude filosófica é negativa, isto é, dizer não ao senso comum, aos pré-conceitos, pré-juízos, idéias, fatos estabelecidos e experiências. A segunda característica é a positiva, uma interrogação sobre o que são as coisas, fatos, situações, valores e comportamentos é uma interrogação sobre os porquês e sobre como tudo é assim e não de outra maneira, essas indagações são fundamentais na atitude filosófica. Dessa maneira a atitude crítica é a face negativa e o pensamento crítico a face positiva da atitude filosófica.

A filosofia começa dizendo que não sabemos o que imaginávamos saber, como afirmava Sócrates, o patrono da filosofia: “Sei que nada sei”, para seu discípulo Platão a filosofia começa com a admiração, já o discípulo de Platão, o filósofo Aristóteles acreditava que a filosofia começa o espanto.

Admiração e espanto significam: tomamos distância do nosso mundo, através do pensamento, olhando-o como nunca antes, como se não tivéssemos ninguém e nada ao nosso redor, como se fôssemos recém-nascidos e precisássemos perguntar o que é, porque somos e como somos para o mundo.

Para que filosofia?

Costumamos receber uma resposta irônica: “A filosofia é uma ciência com a qual e sem qual o mundo permanece tal qual”, ou seja, não serve para nada. Em nossa sociedade acostumamos a considerar que algo só tem direito de existir se tiver alguma finalidade. O senso comum não enxerga algo que os cientistas sabem muito bem, as ciências pretendem conhecimentos verdadeiros, obtidos graças a procedimentos rigorosos de pensamento e agir sobre a realidade objetivando obter progressos nos conhecimentos. Todas essas pretensões das ciências pressupõem que elas acreditam na existência de sua verdade, de procedimentos, tecnologia, na racionalidade dos conhecimentos que podem ser corrigidos e aperfeiçoados, tudo isso não é ciência, são questões filosóficas e a filosofia é quem as formula. Assim, o trabalho das ciências pressupõe a filosofia, mesmo que cientistas não sejam filósofos, porém ainda assim o senso comum continua a afirmar que a filosofia não serve para nada. Alguns entendem que para dar utilidade a filosofia seria necessária a possibilidade de usos técnicos ou obter lucros, para quem pensa dessa formar a filosofia seria um ensinamento moral ou ético, estudando as paixões, vícios, liberdade e vontade humana ensinando-nos a vivermos de forma justa, porém essa definição não nos ajuda, mesmo se disséssemos que o objetivo da filosofia é apenas uma vida moral e ética, ainda assim o estilo filosófico e a atitude filosófica permaneceriam os mesmos.

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