Sociedade HIBRIDAS
Exames: Sociedade HIBRIDAS. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: lelisgc • 16/9/2014 • 3.341 Palavras (14 Páginas) • 759 Visualizações
Organizações Hibridas
Para os visitantes da Amazônia brasileira, um passeio obrigatório é o "encontro das águas", um fenômeno que acontece na confluência entre o rio Negro, de água preta, escura, e o rio Solimões, de água barrenta. Em lugar de se misturarem no ponto da junção, as águas dos dois rios correm separadas, lado a lado, por mais de 6 quilômetros. O fenômeno se deve à diferença entre a densidade, a temperatura e a velocidade das águas dos dois rios. O rio Negro corre a cerca de 2 km/h a uma temperatura de 22°C, enquanto o rio Solimões corre de 4 a 6 km/h a uma temperatura de 28°C (PREFEITURA DE MANAUS, 2007).
Nesta Pensata, argumenta-se que um fenômeno similar está ocorrendo no mundo corporativo. Desde os anos 1990, a aceleração dos processos de mudança organizacional (KANTER, STEIN E JICK, 1992; WILSON, 1992), o crescimento dos processos de fusão e aquisição (GREGORIOU e RENNEBOOG, 2007; MARKS e MIRVIS, 1998; THE ECONOMIST, 1999a; THE ECONOMIST, 1999b; VASCONCELOS, CALDAS e WOOD, 2003), e os processos de privatização, especialmente nos países emergentes (RAMAMURTI, 2000), fizeram surgir o que se poderia denominar organizações híbridas, um novo "tipo ideal" (veja LAMMERS, 1988). No Brasil, diversos casos recentes podem ter gerado organizações híbridas, tais como a aquisição do ABN-Real pelo Santander, a fusão entre o Itaú e o Unibanco, o surgimento da Fibria, resultado da união entre a Aracruz Celulose e a Votorantim Celulose e Papel, e a criação da Brazil Foods, resultado da união entre a Sadia e a Perdigão.
Neste ensaio, procura-se apresentar as organizações híbridas como configurações resultantes de processos de mudança e que conservam, por muito tempo, no mesmo locus organizacional, características estratégicas, organizacionais e culturais distintas, originárias das matrizes que a constituíram, e que podem ser, eventualmente, antagônicas. Acredita-se que, além de chamar a atenção para um fenômeno relevante e ainda pouco estudado, este trabalho traz mais três contribuições: primeiro, enriquece o conceito de organizações híbridas; segundo, revela a dinâmica que permeia o fenômeno; e terceiro, identifica as oportunidades e desafios que o fenômeno representa para pesquisadores e executivos.
O texto está estruturado da seguinte forma: na segunda seção, após esta introdução, são apresentados, com base na literatura existente, os conceitos de hibridismo e de organização híbrida, procurando estabelecer a base para a revisão e a ampliação do conceito de organização híbrida; na terceira seção, delineia-se o conceito expandido de organização híbrida, listando suas causas, manifestações e consequências; e na quarta seção, conclusão, indicam-se algumas oportunidades e desafios que o conceito apresenta para pesquisadores e executivos.
TEORIA: REVISÃO DA LITERATURA ATUAL
Nas últimas décadas, os termos 'híbrido' e 'hibridismo', cuja origem ocorreu na biologia, foram apropriados pelos campos da sociologia e dos estudos culturais, sendo o hibridismo associado a uma qualidade, um estado ou uma condição existencial (veja BHABHA, 2003; HARAWAY, 2000; BURKE, 2003; GARCIA-CANCLINI, 2003a; 2003b). O fenômeno pode também ser observado, por exemplo, na música, quando há justaposição, em um determinado estilo, de elementos de outros estilos, como no caso do jazz e da bossa nova. Nesta seção, trataremos da apropriação dos termos em estudos organizacionais.
Organizações quase governamentais e híbridos que envolvem organizações sociais
No domínio da Nova Economia Institucional, o termo 'organização híbrida' é utilizado para referir-se a híbridos que operam entre o mercado e a hierarquia (WILLIAMSON, 1985; 1991), ou arranjos que combinam contratos e entidades administrativas de forma a garantir a coordenação entre parceiros que ganham com a dependência mútua, porém precisam controlar os riscos de oportunismo (MÉNARD, 2004, p. 347). No entanto, tal abordagem refere-se a arranjos interfirmas e não propriamente a organizações, que constituem o objeto deste trabalho.
Fora desse domínio, o termo 'organização híbrida' surgiu na literatura científica nos campos da gestão pública e das organizações sem fins lucrativos, na década de 2000, relacionado a organizações que operam na interface entre o setor público e o setor privado, atendendo tanto a demandas públicas como a demandas comerciais. Segundo tal literatura, exemplos de organizações híbridas incluem universidades públicas que prestam serviços de consultoria para empresas privadas e centros de pesquisa que desenvolvem estudos para laboratórios farmacêuticos (e.g, LAMB e DAVIDSON, 2004).
O termo 'organização híbrida' também é utilizado para designar organizações que combinam características de organizações sem fins lucrativos - tais como: voluntarismo, orientação para missão e foco na criação de valor social - com características de empresas comerciais - tais como: autointeresse, orientação para o mercado e foco na criação de valor econômico (veja ANHEIER e SCHRÖER, 2008; HUDNUT, BAUER e LORENZ, 2006; KOPPELL, 2003). As empresas norte-americanas Fannie Mae e Freddie Mac são exemplos de organizações híbridas desse tipo (THE ECONOMIST, 2008).
Híbridos, hibridismo e hibridização em estudos organizacionais
Além do termo organização híbrida, a literatura científica sobre organizações tem utilizado os termos 'híbrido', 'hibridismo' e 'hibridização' de forma variada. O primeiro grupo de referências trata dos modelos de gestão e examina os efeitos da disseminação global de certos discursos e práticas de gestão, e a formação de híbridos nos países que recebem tais discursos e práticas. O segundo grupo de referências trata especificamente dos modelos de governança e examina como certos modelos se disseminam, sofrem a influência da realidade local e formam híbridos. O Quadro 1 sumariza as principais contribuições da literatura para o entendimento desses fenômenos.
Comentários sobre a literatura existente
A análise da literatura existente permite deduzir que, nas organizações, o processo de hibridização e a condição híbrida contém um forte componente de indeterminação, pois pode desestabilizar os referenciais existentes e turvar as distinções entre cultura local e cultura corporativa. Em empresas transnacionais,
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