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A Resenha Globalizalção

Por:   •  8/4/2015  •  Resenha  •  5.281 Palavras (22 Páginas)  •  223 Visualizações

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OS REFLEXOS DO MUNDO GLOBALIZADO NAS RELAÇÕES DE TRABALHO NA INDÚSTRIA CALÇADISTA DE FRANCA/SP. Helen Barbosa Raiz ENGLER* Lívia Marinho de MOURA** Mateus BEORDO*** • RESUMO: A globalização, após a evidência da evolução tecnológica, alterou as facetas do mundo do trabalho e das relações sociais. A flexibilização do trabalho mudou completamente as relações antes existentes e trouxe uma competição acirrada entre os trabalhadores, indo muito além do “chão de fábrica” e modificando os padrões das relações de convivência na esfera privada e pública da sociedade que vive do trabalho. Devido às inovações tecnológicas e os padrões de formatação do trabalho, a produtividade aumenta, mas o número de postos de trabalho não acompanha esta tendência. O cenário atual do setor calçadista de Franca/SP é típico de quem passou, e passa, por todas estas nuances da globalização e tenta se “levantar” com a realização de uma reestruturação produtiva intensa, que aumenta a exploração do trabalho humano. Enfim, o rebatimento da globalização causa um trabalho estranho ao trabalhador e deixa seqüelas não somente no âmbito trabalhista, mas também nas suas relações sociais. • PALAVRAS CHAVE: globalização. relações de trabalho. indústria calçadista. Franca/SP. A globalização realiza a sua construção histórica há seis séculos e deixa ao longo deste caminho várias transformações, * Docente do Departamento de Serviço Social da Faculdade de História, Direito e Serviço Social e Professora do Programa de Pós Graduação em Serviço Social e Pesquisadora líder e Coordenadora do Núcleo de Pesquisa “Mentalidade e Trabalho: do local ao global” da Unesp – Campus de Franca; e-mail: helenengler@hotmail.com. ** Mestranda do Programa de Pós Graduação em Serviço Social e membro do Núcleo de Pesquisa “Mentalidade e Trabalho: do local ao global” da Unesp – Campus de Franca; e-mail: liviarpo@hotmail.com. *** Mestrando do Programa de Pós Graduação em Serviço Social e membro do Núcleo de Pesquisa “Mentalidade e Trabalho: do local ao global” da Unesp – Campus de Franca; e-mail: mbeordo@yahoo.com.br. 224 Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 principalmente a partir do surgimento da máquina a vapor e da indústria, que passa a sofrer constantes reestruturações. Através da relação do local com o global procuraremos estabelecer as correlações trazidas da dinâmica do mundo globalizado e do mercado de trabalho. Sendo assim, o presente trabalho possui como objetivos: estudar as características do trabalho terceirizado no setor calçadista e nas novas relações de trabalho na cidade de Franca/São Paulo e a partir deste enfoque analisar o convívio familiar do trabalhador domiciliar; detectar as conseqüências de se trazer a produção de calçados para dentro de casa; pesquisar a carga horária realizada pelos trabalhadores no setor calçadista terceirizado; verificar o que pensa o trabalhador a respeito da sua atual situação, ou seja, a retirada dos seus direitos trabalhistas; e pesquisar os trabalhadores informais no setor calçadista em Franca/São Paulo. No processo de construção desta pesquisa, primeiramente foi utilizado o amplo material bibliográfico disponível para conseguir abordar o tema. A cidade de Franca foi escolhida como universo desta pesquisa devido a seu grande potencial industrial no setor calçadista. Através do estudo realizado nesta cidade consideramos que nos proporcionará uma visão ampla das alterações que vivencia o mundo do trabalho e a sua reestruturação produtiva, vivida principalmente na indústria e esta cidade tem grande parte da população neste setor. O tema escolhido tem forte apelo social, tendo em vista a grande sacrificação sofrida pelos trabalhadores. As modificações ocorridas não atingem somente o âmbito trabalhista, mas como conseqüência atinge o ser humano e a sua cidadania, tornando um sujeito excluído de seus direitos. Atinge o nosso país que atualmente mostra-se incapaz de produzir políticas sociais bem projetadas e sérias para conseguir amenizar os resultados de sua própria política em favor dos organismos internacionais. A abordagem destas políticas sociais e da reestruturação produtiva torna-se a discussão deste tema muito ampla e importante, assim, como a análise das políticas públicas do município de Franca. Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 225 A utilização do estudo bibliográfico com a pesquisa de campo nos proporcionou, após a análise dos dados, um grande entendimento da realidade na cidade, da classe trabalhadora e do trabalho. Afinal, o objetivo de conhecer a realidade social da classeque-vive-do-trabalho da cidade de Franca torna a pesquisa importante. O resultado auxilia-nos na compreensão da sociedade e auxilia os profissionais do Serviço Social para o planejamento de políticas públicas eficazes. Para compreendermos o cenário contemporâneo, é necessário buscar elementos na história e procurar entender as várias nuances do mercado. Isto que detalharemos a partir de agora. A globalização realiza a sua construção histórica há seis séculos e deixa ao longo deste caminho várias transformações, principalmente a partir do surgimento da máquina a vapor e da indústria, que passa a sofrer constantes reestruturações. Após a evidência da evolução tecnológica alterou as facetas do mundo do trabalho e das relações sociais. O mercado deixou de ser local e adquiriu características globais. A flexibilização do trabalho mudou as regras até então existentes e trouxe uma competição acirrada entre os trabalhadores, indo muito além do “chão de fábrica” e modificou os padrões das relações de convivência na esfera privada e pública da sociedade que vive do trabalho. O cenário atual do setor calçadista de Franca/SP é típico de quem passou e passa por todas estas nuances da globalização e tenta se “levantar” com a realização de reestruturação produtiva intensa aumentando a exploração do trabalho humano. Enfim, o rebatimento da globalização causa um trabalho estranho ao trabalhador e deixa seqüelas não somente no âmbito trabalhista, mas também nas suas relações sociais. O presente trabalho possui como objetivos estudar as características do trabalho terceirizado no setor calçadista e nas novas relações de trabalho na cidade de Franca/São Paulo e a partir deste enfoque analisar o convívio familiar do trabalhador domiciliar; detectar as conseqüências de se trazer a produção de calçados para dentro de casa; pesquisar a carga horária 226 Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 realizada pelos trabalhadores no setor calçadista terceirizado; verificar o que pensa o trabalhador a respeito da sua atual situação, ou seja, a retirada dos seus direitos trabalhistas; e pesquisar os trabalhadores informais no setor calçadista em Franca / São Paulo. No processo de construção desta pesquisa, primeiramente foi utilizado o amplo material bibliográfico disponível para conseguir abordar o tema. A cidade de Franca foi escolhida como universo desta pesquisa devido a seu grande potencial industrial no setor calçadista. Através do estudo realizado nesta cidade consideramos que nos proporcionará uma visão ampla das alterações que vivencia o mundo do trabalho e a sua reestruturação produtiva, vivida principalmente na indústria e esta cidade tem grande parte da população neste setor. O tema escolhido tem forte apelo social, tendo em vista a grande sacrificação sofrida pelos trabalhadores. As modificações ocorridas não atingem somente o âmbito trabalhista, mas como consequência atinge o ser humano e a sua cidadania, tornando um sujeito excluído de seus direitos. Atinge o nosso país que atualmente mostra-se incapaz de produzir políticas sociais bem projetadas e sérias para conseguir amenizar os resultados de sua própria política em favor dos organismos internacionais. A abordagem destas políticas sociais e da reestruturação produtiva torna-se a discussão deste tema muito ampla e importante, assim, como a análise das políticas públicas do município de Franca. A utilização do estudo bibliográfico com a pesquisa de campo nos proporcionará a análise dos dados e a elaboração do relatório final com as “conclusões desta pesquisa”. Afinal, o objetivo de conhecer a realidade social da classeque-vive-do-trabalho da cidade de Franca torna a pesquisa importante. O resultado auxilia-nos na compreensão da sociedade e auxilia os profissionais do Serviço Social para o planejamento de políticas públicas eficazes. A globalização pode ser dividida em três etapas. A primeira é marcada pela expansão mercantilista, que ocorre entre 1450 a 1850, resultado da procura de novas rotas Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 227 marítimas para as Índias surgindo assim um grandioso comércio entre Europa, África e América, dando início à colonização, exploração de “novas terras” e escravização do homem, colocando-o em condições sub-humanas. A segunda, que vai de 1850 a 1950, é caracterizada pelas principais evoluções no campo da política e no técnico. A Inglaterra tem acelerada industrialização a partir do século XVIII que introduz a máquina a vapor no transporte terrestre e marítimo. Logo após, surge o telégrafo e a aviação que contribuem para reduzir distâncias. A industrialização atinge vários países e criam-se impérios na busca pela hegemonia do poder. Atualmente vive-se a terceira fase, surgida após 1989, é considerada a globalização recente, sendo a de maior impacto na sociedade francana, predomina a mais avançada evolução tecnológica em busca de maior obtenção de lucros através da exploração dos países periféricos e a sua mão-de-obra barata. A partir daí é criado novas estruturas para as sociedades e o processo produtivo, os mercados consumidores e trabalhistas deixaram de ser locais e adquiriram características globais. Para Ianni, a globalização é caracterizada por um processo civilizatório, pois ele rompe, remodela e recria as formas sociais de vida e de trabalho. João Furtado discorre sobre as mudanças trazidas pela globalização: Mudaram também as relações entre os grupos sociais, após a retirada do Estado e a condenação de todas as conquistas do Estado do Bem-Estar, o desemprego em massa, a propagação das modalidades de contrato de trabalho precário e o enfraquecimento das organizações do mundo do trabalho, reforçando o poder do “pólo” dominante da sociedade. (FURTADO, João, 1999, on-line). José Carlos Pereira Peliano realiza uma avaliação dentro do mundo do trabalho como uma perda de qualificação coletiva que pode ser vista de três maneiras: 228 Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 A mais evidente, é dada pelo desemprego provocado pela entrada das novas tecnologias nos locais de trabalho. Levas de trabalhadores passarão a exercer suas especificações em condições precárias e insuficientes, já que suas qualificações não servem mais ao novo padrão de produção e trabalho. A segunda tem a ver com a histórica transferência de tarefas de trabalho (e do seu conhecimento) dos antigos trabalhadores para as novas máquinas e sistemas de máquinas. A terceira dá conta da mudança da base técnica: o novo trabalhador passa a monitorar a produção e as operações das máquinas; Enquanto o antigo executava seu trabalho ao tempo e em conjunto com as operações das máquinas. (PELIANO, José Carlos Pereira, on-line). Do ponto de vista dos operários, a reestruturação produtiva intensificou e ao mesmo tempo causou uma grande queda nos postos de trabalho, este se torna um dos motivos do desemprego estrutural e das novas relações de trabalho, como: trabalho parcial, temporário, em domicílio, entre outros. A cidade de Franca possui grande importância na produção do calçado, e sofreu com os impactos causados na sociedade e na própria reestruturação da produtividade. Este cenário mundial chegou à Franca que está localizada no nordeste do Estado de São Paulo, a quatrocentos quilômetros da capital, a cidade de São Paulo, e segundo dados do IBGE (2004), a população estimada é de 315770 habitantes. A cidade possui destaque no cenário brasileiro pelo importante cluster calçadista, voltado para a fabricação do calçado masculino, sendo conhecida como a “capital do calçado”. A sua história tem grande identificação com o setor de criação de gados e tratamento do couro. Em meados de 1800, já estavam instalados na vila sapateiros que confeccionavam sandálias, chinelos e botinas rústicas e também os seleiros que confeccionavam peças para montarias e carros de boi. A princípio o trabalho era artesanal, voltado para a subsistência e sem expressão econômica. Posteriormente terá sua expansão e favorecerá o surgimento deste segmento industrial. Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 229 Há uma intensificação migratória a partir de 1801 para região, principalmente do sul de Minas Gerais. Em 1805, surge a Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Franca. A expansão se dá principalmente pelo motivo da cidade ficar no caminho por onde passava a “Estrada dos Goyases”, que ligava São Paulo ao centro do Brasil, caminho obrigatório para quem ia ou voltava de Goiás, Mato Grosso e sul de Minas Gerais, e também por ser um importante entreposto comercial, principalmente de gado e de sal. Isso facilitava a difusão do artesanato de couro francano nestas regiões. Na década de 1820, consegue a sua emancipação de Moji Mirim e recebe a denominação de Vila Franca do Imperador. Desde a sua fundação até 1870, tem como principal atividade econômica à criação de gado; entre 1870 a 1960, está voltada para o café e após 1960 tem uma crescente e próspera industrialização, dirigida principalmente para a fabricação do calçado de couro. Em 1910, havia 18 fábricas de calçado que manufaturaram 25696 pares de botina e 11131 de chinelo, como informava o “Almanaque da Franca”. A maioria desta produção saiu da fábrica de Carlos Pacheco de Macedo que uma década depois a transforma na primeira indústria calçadista de Franca. Em 1921 foi fundada a Calçados Jaguar. A indústria utilizava máquinas importadas da Alemanha em todas as etapas de produção e ajustava-se a um mercado promissor e carente de produtos baratos. Ela consegue instaurar a produção em série acarretando na redução do tempo de fabricação, aumento da produtividade e consegue ofertar seus produtos a preços menores. A primeira fase desta industrialização termina em 1926 com o encerramento das atividades da Jaguar após séria crise financeira. O incentivo à fabricação do calçado tem início após a queda do café, em 1929, devido à existência de uma pequena mão-de-obra especializada no tratamento de artigos de couro e outros aliados; como a abundante matéria-prima, a necessidade do mercado interno, a expansão das exportações e o incentivo nacional de desenvolvimento da indústria. Antônio Carlos Coutinho cita: 230 Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 A manufatura de calçados em Franca começou a substituir o artesanato nos primeiros anos deste século, trazendo mudanças na forma de fabricação e na organização do trabalho. (COUTINHO, Antônio Carlos, on-line). Contudo a mecanização intensiva fica interrompida por 11 anos. Utilizavam pequenas máquinas e a maioria do processo era manual devido a grande parte das fábricas serem pequenas e sem capital suficiente para estas inovações tecnológicas. A partir de 1937 é retomada a industrialização por Antônio Lopes de Mello e inicia-se a segunda fase. Devido à competitividade a Calçados Mello teria que modernizar as linhas de produção e aumentar a produtividade. Mello começa a importar máquinas da alemã “Moemus”, mas devido o início da 2ª Guerra Mundial e conseqüentemente a dificuldade de reposição de peças, troca às máquinas alemãs pelas da norte-americana USMC (United Shoes Machinery Company), conseguiu a garantia de manutenção técnica com facilitação na compra pelo leasing, aluguel com opção de compra no final do arrendamento. Várias fábricas seguiram o mesmo caminho e sofrem remodelações. Miguel Sábio de Mello após os anos 40 lidera as transformações ocorridas em Franca e em 1942 constrói o primeiro prédio projetado para a indústria de calçado. Neste período de grande expansão da indústria que surge em 1941 o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Calçados e Vestuário de Franca. A grande industrialização ocorre a partir de 1950, quando o governo federal incentiva à indústria com a abertura de linhas de crédito para capital de giro, aquisição de máquinas e construção ou reforma de prédios, assim consolida-se o parque calçadista de Franca elevando a produção de calçado em uma taxa média de 3,2% ao ano. No início da década de 50 a produção era de 1,117 milhão de pares de calçado e já no final da década este número dobra para 2,388 milhões. No setor industrial a produção de calçados toma posição de destaque no faturamento com 48,7%, seguido pelo segmento de couros e peles com 17,8%. Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 231 Juntamente com esta expansão, que permanece após 1960, surge a emergente indústria de artefatos de borracha (saltos e solados) e no final da década o início das exportações dá um grande impulso para o setor, como modernização das máquinas, mudanças no processo de produção e outros avanços. No final da década de 60, o calçado francano entrou no mercado externo. (...) provocaram a modernização da maquinaria, mudanças no processo de produção, maior racionalização do trabalho, ganhos de produtividade, causaram melhorias consideráveis na qualidade dos produtos [...]. (COUTINHO, Antônio Carlos, on-line). Assim: “A fabricação de calçados passou a representar a maior base da sustentação econômica do município. A cidade possuía 360 indústrias calçadistas na década de 60 e 7200 operários (...)”. (COUTINHO, Antônio Carlos, on-line). A Samello se torna a maior fábrica da cidade e em 1965 inova com a implantação da primeira esteira transportadora de materiais da indústria brasileira de calçados. As exportações se efetivam na década de 70 e na década de 80 perdem os incentivos fiscais, mas já estavam estruturadas para o mercado externo que mantém até 1993 com a função de equilibrar as vendas do mercado externo com o mercado interno. Os países centrais sofrem com a falência do Estado do Bem-Estar, toda a estrutura que mantinha a economia e a questão social ficam abaladas pela perda da proteção do Estado, afetando também as relações trabalhistas. O país também sobre mudanças e reorganiza-se, inicializa a adoção de práticas neoliberais, e serão observadas melhor já na década de 90 com a política de Fernando Collor de Mello. A abertura do mercado expôs as indústrias à competição e para competir passaram a buscar novas maneiras de aumentar a sua produtividade e de diminuir o seu custo de produção, pois quanto menor o custo de produção mais competitivo será o produto. Em 1994, com o aumento do valor da moeda frente ao dólar, os exportadores perdem a competitividade e reduzem os negócios no exterior. Em 1995, a indústria sofre uma grande 232 Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 recessão. Nos dois anos seguintes consegue retornar a produção de calçados. A política econômica do governo de Fernando Henrique Cardoso traz uma mudança no processo de produção que substitui o modelo Fordista/Taylorista para o Toyotista, trazendo assim uma otimização dos custos com mão-de-obra e também na produção, pois realiza a produção de acordo com a necessidade do mercado. Como cita Ricardo Atunes: Novos processos de trabalho emergem, onde o cronômetro e a produção em série e de massa são “substituídos” pela flexibilização da produção, pela “especialização flexível”, por novos padrões de busca de produtividade, por novas formas de adequação da produção à lógica do mercado. (ANTUNES, Ricardo, 2005, p. 24). [...] ao contrario do fordismo, a produção sob o toyotismo é voltada e conduzida diretamente pela demanda. (ANTUNES, Ricardo, 2005, p. 34). Durante toda estas transformações entre trabalho artesanal e modernização da produção de calçados existe uma grande flutuação de trabalhadores na cadeia produtiva que fica por trás do parque industrial, especialmente no comércio e na prestação de serviços (principalmente nos trabalhos realizados nos domicílios, como as bancas de pesponto). Mudanças que refletem direta ou indiretamente na classeque-vive-do-trabalho, traz um aumento da pobreza, exclusão social e no âmbito trabalhista, a intensificação do trabalho, diminuição dos seus postos, redução dos salários, aumento da informalidade do emprego, desorganização sindical, terceirização, trabalho domiciliar e a precarização das condições trabalho, como perda de benefícios sociais diretos ou indiretos, as condições de saúde e na segurança. As empresas incentivavam as pessoas a saírem das fábricas e trabalhar em casa. Não era bem incentivo, se não saíssem elas eram demitidas. (NAVARRO, Vera Lúcia, 2006, p. 220). Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 233 Em geral o serviço terceirizado é feito na própria residência do trabalhador, pois este não tem condições de arcar com os custos de aluguel de um local adequado e seguro para a prestação deste serviço, pois o empresário não repassa este custo, sem condições ele acaba utilizando os cômodos de sua casa, às vezes o quarto, a sala, ou qualquer canto onde ele possa por a sua máquina de pesponto e uma mesa para colar peças. Com isso cama, guarda-roupa, sofá, fogão, máquina de pesponto, lata de cola, tíner, querosene, passam a dividir o mesmo espaço. Assim, o espaço residencial se mistura com o trabalho. Ao realizar sua atividade profissional em casa, o trabalhador expõe a sua família, inclusive filhos menores, não só a exploração do capital, mas também a vários males consequentes da utilização dos produtos químicos e até do próprio pó que solta o couro. Em geral, o pai pesponta, a mãe cola as peças e os filhos passam a cola no sapato. Como o local na maioria das vezes é inadequado para a realização deste tipo de serviço, o ar não tem boa circulação e sem perceber essas pessoas passam dias, meses e até anos, inalando os produtos químicos, afinal, se acostumam com o cheiro achando normal e sem perigo para a sua saúde, continuando o trabalho sem preocupação em utilizar equipamentos de segurança como máscaras e luvas adequadas para o manuseio de tais produtos, até mesmo porque a indústria não cede esse equipamento e o que ele recebe pelo serviço não lhe permite arcar com mais este custo. Outra conseqüência desta terceirização é a alta carga horária que o trabalhador se submete para obter maiores ganhos, chegando a trabalhar de 13 a 14 horas por dia, às vezes até mais, incluindo os finais de semana e feriados, chegam também a virar a noite. Muitas vezes param somente para uma rápida alimentação, pois as indústrias exigem urgência no serviço devido ao prazo de entrega do pedido ao cliente. O trabalhador passa a ser excluído da sua própria vida, pois não recebe um salário suficiente para a satisfação das suas necessidades, perdem a sua dignidade, os direitos trabalhistas e toda a família torna-se dependente do seu patrão. Agora, ele 234 Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 passa a ser mais um, em meio a tantos outros, a integrar o tão crescente mercado informal do trabalho. “Direitos e conquista históricas dos trabalhadores são substituídos e eliminados do mundo da produção”. (ANTUNES, Ricardo, 2005, p. 24). Em essência, o capitalismo é um sistema de mercantilização universal; e de produção de maisvalia. Mercantiliza as relações, as pessoas e as coisas. Ao mesmo tempo, mercantiliza a força de trabalho, a energia humana que produz valor. Por isso mesmo, transforma as próprias pessoas, tornando-as adjetivas de sua força de trabalho. (IANNI, Octávio, 1988, p. 18). As medidas adotadas atingem os aspectos sócioeconômicos da vida da população. Através da observação das mudanças e conseqüências que a reestruturação produtiva trouxeram que será realizada esta pesquisa para atingir a compreensão de como este processo atingiu o mundo do trabalho e a classe trabalhadora, que visa à valorização do econômico e desvalorização do social, deixando grande parte da população neste crescente sistema excludente. Enfim, o rebatimento da globalização causa um trabalho estranho ao trabalhador e deixa seqüelas não somente no âmbito trabalhista, mas também nas suas relações sociais. ENGLER, H. B. R.; MOURA, L. M.; BEORDO, M. The reflexes of the globalized world in the work relationships at shoe industries of Franca/SP. Serviço Social & Realidade (Franca), v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 • ABSTRACT: The globalization, after the evidence of the technological evolution, altered the facets of the world of work and of social relationships. The flexibilization of the work completely changed the relationships that existed before and brought an intransigent competition among the workers, going beyond the factory and modifying the patterns of the coexistence relationships in the private and public sphere of the society that lives from work. Due to the technological innovations and the patterns of work formatting, the productivity increases, but the number of workstations does not follow this tendency. The current scenery of the shoe factory sector of Franca/SP is typical of who passed, and still passes, for all these Serviço Social & Realidade, Franca, v. 19, n. 1, p. 223-240, 2010 235 nuances of the globalization and tries “to lift” with the accomplishment of an intense productive restructuring, which increases the exploration of the human work. Finally, the refutation of the globalization causes a strange work to the worker and leaves sequels not only in the labor extent, but also in their social relationships. • KEYWORDS: globalization. work relationships. shoe industry. Franca/SP. REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 10. ed. São Paulo: Cortez; Campinas/SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2005. 155 p. ANTUNES, Ricardo; SILVA, Maria Aparecida Moraes (Org.). O avesso do trabalho. São Paulo: Expressão Popular, 2004. 408 p. ANTUNES, Ricardo. 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