GRANDES PROJETOS URBANOS E PLANEJAMENTO TERRITORIAL
Por: Daniela Lupato • 1/3/2019 • Artigo • 7.996 Palavras (32 Páginas) • 305 Visualizações
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BoletimCampineirodeGeografia.v.1,n.1.,2011.
Grandesprojetosurbanos eplanejamentoterritorial
RosaMoura
rosamoura@ipardes.pr.gov.br
Resumo
Atemática proposta é abrangente e oportuna, visto que o país, ao sediar a Copa de 2014, entrega-se a um conjunto de ações, em resposta a exigências, que se consubstanciam em grandes projetos urbanos. Esses são entendidos neste trabalho como sujeitos numerosos e insubordinados, disseminados entre os lugares, mas decorrentes de um sistema técnico global. A abordagem se decompõem em uma reflexão teórico-conceitual, na análise da experiência brasileira, particularmente de projetos e do planejamento em Curitiba, nos resultados urbanos de megaeventos recentes e na ação de empresas e consultores que viabilizam produtos eficientes à acumulação e reprodução do capital, dissociados da prática do planejamento e gestão territorial.
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PALAVRAS-CHAVE : Grandes projetos, planejamento territorial, megaeventos, imagem urbana, ícones urbanos.
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Conferência ministrada na abertura da VI Semana de Geografia da UNICAMP - Grandes projetos e planejamento territorial no Brasil contemporâneo (outubro de 2010).
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RosaMoura
Introdução
Odebate sobre grandes projetos urbanos e planejamento se torna candente, particularmente no momento em que o Brasil é escolhido para sediar a Copa do Mundo de Futebol (2014) e os Jogos Olímpicos (2016), entre outros eventos esportivos de abrangência mundial. Como suporte a esses eventos, programas governamentais e grandes projetos estão sendo propostos com vistas a adequar a infraestrutura das cidades-sedes às exigências dos organizadores, patrocinadores, participantes e público em geral.
Estariam esses projetos consoantes às estratégias definidas pelo planejamento urbano e regional vigente no país e nessas cidades? Estaria a sociedade preparada para acompanhar sua implementação? Estaria sendo universalizada a distribuição dos seus benefícios? A esses questionamentos, a temática proposta na VI Semana de Geografia da UNICAMP complementa com outros ainda mais importantes: quais os conflitos e disputas territoriais existentes a partir do planejamento orientado aos grandes projetos? Há alternativas? É possível pensar um planejamento territorial democrático e para a totalidade do território brasileiro?
Está posto, assim, um debate necessário: “Grandes projetos e o planejamento territorial no Brasil contemporâneo”, para o qual se busca, neste texto, compor um panorama que reúne a perspectiva teórica e resultados de experiências concretas sobre a implementação de grandes projetos no Brasil. Espera-se instigar idéias, inspirar propostas e contribuir para que o debate seja o mais construtivo possível.
Objetosinsubordinados
Aoabordar o tema grandes projetos urbanos e planejamento territorial no Brasil contemporâneo, imediatamente vem em mente a constatação-síntese de Milton Santos (1999) de que vivemos o tempo dos objetos técnico-científicos- informacionais. Atores, sujeitos, numerosos e insubordinados, esses objetos se encontram em todas as partes, decorrem de um sistema técnico que funciona no nível global, obedecem a uma lógica que nos é estranha, sugerindo-nos o papel a desempenhar. São frutos de intencionalidades mercantis e simbólicas que transcendem o lugar, que são indiferentes a ele.
Para Santos, os objetos não são novos. Porém, os primeiros objetos provinham de uma técnica inventada pelo grupo, voltada a atender a uma função a serviço do grupo, para produzir o essencial à sua existência. Tinham sua finalidade na ação humana e se tornavam sistêmicos a partir de escolhas sociais. Os objetos atuais estão sendo criados para se relacionarem entre si. Voltam-se à
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finalidadede quem os concebe e implanta, que pode ser contrária às necessidades
de quem os recebe, e sua energia é a informação. Compõem sistemas técnicos (gênese, conteúdo, realização e funcionalidade técnicas), dos quais participam por
uma especialização extrema, particularmente quando criados sob intenções hegemônicas.
São invasores, altamente difundidos, orientados por um único sistema técnico que rege toda a atividade humana. Neles, subsistem sistemas técnicos anteriores, que levam à convivência antagônica de racionalidades duras, precisas e densas, e de racionalidades moles, tolerantes e tênues, revelando espaços burros e inteligentes. Mas as condições propriamente locais não são dissolvidas, dando margem à convivência dos tempos (do mundo e do lugar). Tal convivência é muito comum em países desiguais e dispostos à inovação a qualquer custo, como o Brasil.
A invasão dos lugares por esses objetos se dá a partir de uma descoberta global, sob avaliação para usos escolhidos por portadores de ações. O encontro dos sistemas de objetos impele o sistema das ações e o movimento decorrente gera a seletividade do uso, que se torna permitido apenas a alguns, resultando, portanto, na escassez para outros. Tal movimento do encontro dá materialidade ao território, possibilita a ação global, praticada por atores presentes em diversos lugares, agindo, “aqui e agora”, pelas mãos dos estados, organizações e firmas internacionais, como uma “nova mão invisível”.
Uma retórica comum (hegemônica) se faz presente nos objetos: discursos
parciais do uso e da sedução debilitam a capacidade de produzir um discurso
próprio ou do todo. Essa retórica imiscui informação e contra-informação, e serve
para legitimar a ação. Agindo hermética e codificadamente, instrui um processo
que cria o homem ignorante e as regiões que se desconhecem, pois desconhecem
os segredos dos objetos e as lógicas das ações. Perdem, portanto, as condições de comandar sua própria evolução.
Entre tais objetos encontram-se os master projects, grandes projetos urbanos
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