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A Justiça Social e Justiça Legal

Por:   •  17/2/2018  •  Resenha  •  1.698 Palavras (7 Páginas)  •  302 Visualizações

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO

Texto Justiça Social e Justiça Legal

O texto “Justiça Social e Justiça Legal: conflitos de propriedade em Recife”, de Joaquim Falcão, se inicia com a abordagem do conceito de justiça, a qual, ao menos em tese, seria uma só, de modo que não caberia subdivisões entre a justiça legal e justiça social. Nesse sentido a primeira, no campo do dever-ser seria um meio de materializar a segunda, tornando-se um contrassenso imaginar que a justiça legal pode servir como obstáculo à social.

Uma vez que a ideia de justiça social foi apropriada pelo Estado, o senso comum – sempre reforçado pela doutrina jurídica dominante na prática dos tribunais e advogados -  é conduzido a acreditar que a aplicação do direito positivo estatal é a forma de se praticar a justiça social. Isto se deve à “associação ao liberalismo como ideologia social, ao capitalismo como teoria econômica e ao positivismo dogmático como doutrina jurídica” – página. 95.

Aborda o autor três aspectos que fundamentam o reforço do senso comum acima mencionado. O primeiro deles é que as Constituições transformam ideias liberais em ideias legais. Em segundo lugar é mencionado a estrutura lógico-hierárquica da ordem legal. Por fim, sustenta que da ordem legal liberalmente submetida não existiria direito nem justiça.

O intuito do texto é justamente explorar o contrário desse senso comum difundido, no atual contexto brasileiro, com base em dados empíricos, a fim de abordar o pluralismo jurídico e a legitimidade política, com enfoque nos conflitos de propriedade.

Antes disso, contudo, o autor aborda a existência de duas correntes opostas que versam sobre o direito na sociedade contemporânea: a monista e a pluralista. A primeira defende a existência de apenas um único direito, qual seja o direito positivo estatal, enquanto a segunda defende a existência de vários direitos, sendo um estatal apenas um deles, sendo esta a corrente a qual o autor se filia, vide página 99.

“O pluralismo jurídico não se confunde pois com a defesa do direito não-estatal. Seu principal esforço teórico é explicar a convivência contraditória, por vezes consensual e por vezes conflitante, entre os vários direitos observáveis numa mesma sociedade” .

No que tange às invasões de terrenos urbanos, o autor destaca que há uma intensificação desde 1964 – momento de crise de legitimidade do regime político outrora vigente - momento em que o governo se deparou, basicamente, com duas situações para solucionar tais conflitos: ou convocava-se a força policial para desalojar os invasores, ou buscar formas de equacionar tais conflitos. É nesse momento que cabe correlacionar a legitimidade do governo à luz do pluralismo jurídico, pois a lei estatal alcançará eficácia, mais facilmente, na medida em que o regime político for legítimo.

Posteriormente, o autor associa os nove casos de invasão de propriedade ocorridos em Recife narrados a importância da possibilidade de se judicializar o conflito nos momentos de se conseguir lograr êxito na negociação entra as partes conflitantes. Considerando que o Código de Processo Civil apenas regulamenta a ação judicial, aborda o autor o nível de relevância da aplicação do mesmo.   Para isso, três aspectos são abordados: a legitimidade das partes; o tempo dos atos processuais e a publicidade processual.

Em relação a legitimidade das partes, destaca-se que o caráter coletivo das invasões e o quanto tal característica foi fundamental tanto para as soluções extrajudiciais, quanto para as judiciais. Em razão desse aspecto coletivo, diversos dispositivos processuais tiveram de ser ignorados, inclusive os prazos, por todos aqueles que participaram dessas ações – sejam partes, advogados, juízes ou até mesmo oficiais de justiça. Isso se deve ao fato de Código de Processo Civil outrora vigente ser essencialmente individualista e não conseguir regulamentar lides como as expostas no texto, as quais envolvem dezenas ou centenas de pessoas.

O caráter individualista do Código de Processo Civil outrora vigente tanto criticado pelo autor foi mantido no Novo Código de Processo Civil. Em que pese o esforço de doutrina significativa em seu processo de elaboração para atribuir-lhe mais normas que versassem sobre direito coletivo, estas foram barradas pelo legislativo.

Isto porque, a regulamentação de normas coletivas afeta diretamente “grupos de poder” da sociedade, os quais estão intimamente vinculados – tanto financeira, como politicamente – a esse processo legislativo, que é, acima de tudo, um procedimento essencialmente político interferido por lobbys desses grupos de poder.   Nesse sentido, o legislativo resolveu impedir o avanço do Código Processual vigente em matéria processual. Exemplo disso foi o veto ao art. 337 do CPC-15.

Por outro lado, a aplicação do atual código de processo civil provavelmente mostrar-se-ia mais útil na resolução desses conflitos de propriedade, ao menos no que tange ao estímulo do diálogo entre as partes, uma vez que o CPC-2015 tem como principal inovação o estímulo à autocomposição entre as partes, vide art. 139, V: “O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais”.

 O estímulo à autocomposição se encontra espalhado por todos o código de processo civil, muitas vezes até mesmo de modo implícito. Nesse contexto, merecem destaque os seguintes artigos

Art. 165: tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição;

Art. 334: Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência;

 Art. 381, inciso II: A produção antecipada da prova será admitida nos casos em que: a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito

Art. 471, inciso II: “As partes podem, de comum acordo, escolher o perito, indicando-o mediante requerimento, desde que: a causa possa ser resolvida por autocomposição”.

Outro instituto processual ampliado no Novo Código de Processo Civil que certamente colaboraria na resolução de conflitos de propriedade coletivos que envolvem extenso número de partes é a elaboração de negócios jurídicos processuais, incluindo-se a elaboração de calendários processuais. Obviamente, esse instituto processual somente seria viável quando a negociação entre as partes conflitantes se logrou minimamente útil, uma vez que esta é a base dos negócios jurídicos, como seu próprio nome intuitivamente já indica.

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