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A Proteção Dos Saberes Tradicionais

Por:   •  6/11/2024  •  Seminário  •  2.606 Palavras (11 Páginas)  •  26 Visualizações

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A PROTEÇÃO DOS SABERES TRADICIONAIS ATRAVÉS DE INSTRUMENTOS DO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL E DA PROPRIEDADE INTELECTUAL

INTRODUÇÃO

- O conceito de Patrimônio Cultural Imaterial foi consagrado na legislação brasileira através do art. 216 da Constituição Federal (Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.) e do Decreto 3.551/2000 do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) que instituiu o registro de bens culturais de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro e criou o programa nacional do patrimônio imaterial.

- Esses bens do Patrimônio Cultural Imaterial são organizados em quatro categorias, que correspondem a quatro livros:

  • Lugares: são aqueles que possuem sentido cultural diferenciado para a população local, onde são realizadas práticas e atividades de naturezas variadas, tanto cotidianas quanto excepcionais, tanto vernáculas quanto oficiais.
  • Celebrações: rituais e festas que marcam vivência coletiva, religiosidade, entretenimento e outras práticas da vida social.
  • Formas de Expressão: formas de comunicação associadas a determinado grupo social ou região, desenvolvidas por atores sociais reconhecidos pela comunidade e em relação às quais o costume define normas, expectativas e padrões de qualidade.
  • Saberes: conhecimentos tradicionais associados a atividades desenvolvidas por atores sociais reconhecidos como grandes conhecedores de técnicas, ofícios e matérias-primas que identifiquem um grupo social ou uma localidade.

- A natureza do patrimônio cultural é imaterial e volátil, compreendendo um processo histórico e uma dinâmica que desempenha um papel na autodeterminação das comunidades. A expressão patrimônio nesse caso vai além da noção de propriedade, pois ultrapassa um entendimento individualizado e tem uma importância coletiva para a construção da identidade social. Já o vocábulo imaterial trata de uma dimensão intangível, sendo complementar ao aspecto material.

- Quanto a expressão “saber tradicional”, podemos compreender como: “o saber e o saber-fazer a respeito do mundo natural e sobrenatural, gerados no âmbito da sociedade não urbano/industrial e transmitidos oralmente de geração em geração” (PRESTES, Fabiane da Silva; LAROQUE, Luís Fernando da Silva. Patrimônio Cultural Imaterial: Um Olhar Sobre Os Saberes da Medicina Tradicional Kaingang. Apresentado em XII Encontro Nacional de História Oral - História Oral, Práticas Educacionais e Interdisciplinaridade, Rio Grande do Sul, 2016).

- Na maioria das vezes, a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), que é o primeiro tratado mundial sobre utilização sustentável e repartição equitativa dos benefícios da biodiversidade, assinado na ECO92 e ratificado pelo Congresso Nacional em 1994, é utilizada como principal instrumento de proteção. Porém, entende-se que a relação vai além, podendo adentrar em aspectos históricos, sociais e até espirituais, se encaixando dentro do universo do Patrimônio Cultural Imaterial.

- Há também uma procura pela proteção por meio da Propriedade Intelectual, que apesar de apresentar algumas inadequações, é um caminho que traz respostas para alguns desafios apresentados no sistema que é disponibilizado pelo IPHAN.

- Nesse trabalho, portanto, vou explorar os saberes tradicionais diante dessas duas perspectivas: do Patrimônio Cultural Imaterial e da Propriedade Intelectual.

A PROTEÇÃO POR MEIO DO TÍTULO DE PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL

- Os saberes tradicionais podem ser tutelados por meio do amparo fornecido pelo Estado, fruto do título de Patrimônio Cultural Imaterial. Essa proteção surge com o registro realizado junto ao IPHAN e leva a planos complexos de proteção, através dos Planos de Salvaguarda, articulados junto às comunidades detentoras para suprir suas necessidades específicas.

- O processo de registro é regulado pelo já mencionado Decreto nº 3.551/2000 e, em respeito aos grupos detentores, todo o processo só ocorre mediante sua anuência. Além disso, deve-se observar os requisitos materiais e formais.

- Os requisitos materiais são a continuidade histórica e a relevância nacional. Já os requisitos formais são a descrição pormenorizada do bem junto com a documentação correspondente e menção de todos os elementos culturalmente relevantes.

- Após o registro, surgem as obrigações do Estado na documentação e ampla divulgação do bem.

- Interessante mencionar também o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) que é uma metodologia de investigação sistematizada, que é um procedimento que passa por três estágios: (I) levantamento preliminar; (II) identificação, (III) documentação.

- Acontece que essas ferramentas de proteção não necessariamente protegem esse patrimônio cultural de uma exploração econômica não autorizada de terceiros. Então, desde que foi lançado, o instituto do registro levantou várias discussões sobre a possibilidade de ampliar também para uma espécie de sistema de propriedade intelectual coletiva, só que isso não foi expressamente positivado no Decreto instituidor, apesar de algumas pessoas defenderem que implicitamente que o registro constitui direitos que protegem os bens da investida do Estado e de terceiros contra eles.

- É interessante citar o caso do modo de fazer da viola-de-cocho. A proteção da viola-de-cocho já era reivindicada pela comunidade artesã dos Estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul desde 1990, antes da criação da tutela do patrimônio cultural imaterial. Foi pleiteado o tombamento por falta de um instrumento mais adequado e apesar do IPHAN negar em nível federal, foi concedido em nível estadual e os artesãos também obtiveram vitória parcial no INPI para impedir o registro da marca mista com o nominativo da viola, pois isso iria de encontro com os direitos transindividuais e o interesse público. O modo de fazer da viola foi registrado no Livro dos Saberes em 2005, porém essa busca pela proteção desde muito antes já demonstra como as comunidades detentoras de bens culturais imateriais buscam por tal amparo jurídico.

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