ANÁLISE DE ARTIGO: NOTA SOBRE AS COOPERATIVAS QUE EXERCEM ATIVIDADE RURAL E RECUPERAÇÃO JUDICIAL"
Por: Ricardo Facis • 10/11/2017 • Trabalho acadêmico • 1.885 Palavras (8 Páginas) • 443 Visualizações
A atual crise econômica no Brasil traz à baila a maior incidência de empresas que enfrentam o cenário de falência e recorrem à recuperação judicial, o que levanta questionamentos de determinadas categorias sobre quem faria jus aos ditames da Lei 11.101/05 .
Indubitavelmente, um maior número de empresas encerrando suas atividades ocasionam não só agravo na crise econômica, mas uma crise social, em vista que os trabalhadores perdem seus empregos e não encontram oportunidades de reinserção no mercado, estendendo e expandindo o ciclo de crise.
Neste passo, o setor do agronegócio (incluindo as cooperativas que exercem atividade rural) também é atingido diretamente pela crise. O artigo em tela trata especificamente de tais cooperativas enquanto pessoas jurídicas, caracterizadas em lei como espécies de sociedade, com fulcro no art. 1093 e seguintes do Código Civil e da Lei 5.764/71, mas que não encontram respaldo legal para sua recuperação judicial.
Ocorre que há vedação expressa no inciso II do art. 2° da Lei 11.101/05 (LRE). Não só, o caput do art. 4° da Lei 5.764/71 prevê a não sujeição à falência das cooperativas, bem como o art. 982 do Código Civil prediz que uma sociedade cooperativa não possui natureza empresária.
Nos dizeres de Fabio Ulhôa Coelho, "(...) o legislador torna explícito o não cabimento da disciplina do regime jurídicofalimentar por se tratar de devedor civil, não empresário. É o caso das cooperativas, em que a lei, ao fixar que ditas pessoas jurídicas não se sujeitam à falência, limitase, a rigor, ao mero esclarecimento de algo que decorre já da própria inexistência de natureza empresarial naquelas pessoas. Mesmo se fosse a lei silente acerca do assunto, não estariam as cooperativas sujeitas ao direito falimentar".
Neste diapasão, nos ensina Gonçalves (p. 14) que, nos termos do Código Civil, cooperativas são consideradas sociedades simples, enquanto pessoa jurídica que exerce atividade civil (CC, art. 982). Ela não é empresária, estando sujeita às normas que lhe são próprias, dispostas nos arts. 997 a 1.038 do Código Civil, e não à Lei de Falências.
Outra distinção é que as sociedades empresárias adquirem personalidade jurídica com o registro de seus atos constitutivos (estatutos ou contratos sociais) na Junta Comercial, porquanto as sociedades simples adquirem personalidade jurídica com o registro no Ofício de Registro Civil das Pessoas Jurídicas (Lei n. 6.015/73, art. 115).
Contudo, Ivo Waisberg ataca em seu artigo cada um dos argumentos, explicitando que no caso da LRE, seu art. 2° deixa clara a excepcionalidade aplicável apenas a cooperativas de crédito, não se aplicando ao caso das cooperativas com atividade rural.
Por conseguinte, ainda que a Lei 5.764/71 exclua a possibilidade de falência de sociedades cooperativas, entende o autor que não haveria impedimento ao acesso de recuperação judicial por parte das mesmas, considerando a própria função social da empresa, o que nos parece um ponto relevante, considerando os princípios constitucionais da ordem econômica, consoante o art. 170 da Constituição Federal , que bem prediz a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa, assegurando maior justiça social.
Cumpre refletir sobre o que é empresa. Bem explica Gonçalves (p. 11) que "empresa é a atividade desenvolvida profissionalmente e com habitualidade, seja por um empresário individual, seja por uma sociedade empresária, de forma economicamente organizada, voltada à produção ou circulação de mercadorias ou serviços"; sintetiza, ainda o mesmo autor: "A empresa é um polo de convergência de vários interesses. Nela se encerram os anseios dos funcionários, do Fisco, da sociedade com o consumo e da economia como um todo".
Aparenta uma correlação clara com a atividade de sociedade cooperativa. Entretanto, cumpre ressalvar que o Código Civil é taxativo em considerar as cooperativas como sociedades simples, não reconhecendo sua natureza como empresária, mas de natureza civil, com características peculiares, podendo ter finalidade econômica, porém desprovida de lucro, afastando-as, assim, do regime falimentar.
Neste diapasão, são colocadas à margem da Lei de Recuperação de Empresas também as cooperativas rurais, pois o legislador entendeu que tais agricultores exploram propriedade rural para fins de subsistência familiar e esse tipo de atividade não é considerada empresarial, posto que não produz para suprir o mercado consumidor.
Neste sentido, confirma a seguinte ementa do Superior Tribunal de Justiça
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO FISCAL. COOPERATIVA SUJEITA À LIQUIDAÇÃO. EXCLUSÃO DA MULTA MORATÓRIA E DOS JUROS MORATÓRIOS. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI DE FALÊNCIAS. IMPOSSIBILIDADE.
1. As sociedades cooperativas não se sujeitam à falência, dada a sua natureza civil e atividade não-empresária, devendo prevalecer a forma de liquidação extrajudicial prevista na Lei 5.764/71, que não prevê a exclusão da multa moratória, nem a limitação dos juros moratórios posteriores à data da liquidação judicial condicionada à existência de saldo positivo no ativo da sociedade.
2. A Lei de Falências vigente à época - Decreto-Lei nº 7.661/45 – em seu artigo 1º, considerava como sujeito passivo da falência o comerciante, assim como a atual Lei 11.101/05, que a revogou, atribui essa condição ao empresário e à sociedade empresária, no que foi secundada pelo Código Civil de 2002 no seu artigo 982, § único c/c artigo 1.093, corroborando a natureza civil das referidas sociedades, e, a fortiori, configurando a inaplicabilidade dos preceitos da Lei de Quebras às cooperativas.
Por este viés, a atual legislação prevê que as sociedades cooperativas não se sujeitam à falência ou a insolvência civil. Considerando-as como sociedades simples, elas se dissolveriam através de liquidação extrajudicial, com a intervenção de órgão executivo federal, conforme art. 75 da Lei n° 5.764/71.
De outro bordo, como bem aponta o articulista, comumente somente os grandes produtores rurais (agronegócios) constituem empresas, estando registrados na Junta Comercial, mesmo que a grande maioria dos produtores sejam pequenos agricultores que desenvolvem em família suas atividades, não sendo, portanto, registrados, de modo que não são empresários e também não se sujeitam ao regime falimentar.
O autor critica severamente tal caracterização, dispondo que as cooperativas são um tipo societário próprio e não simples, devendo aplicar-se a elas apenas supletivamente a lei de sociedades simples, considerando sua natureza intrinsecamente empresarial, dado seu papel socioeconômico.
Em
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