CONTROLE E ATUAÇÃO JUDICIAL EM MATÉRIA DE POLÍTICAS PÚBLICAS
Por: Sara Marina Pierine Brizolla • 14/5/2018 • Artigo • 3.839 Palavras (16 Páginas) • 247 Visualizações
CONTROLE E ATUAÇÃO JUDICIAL EM MATÉRIA DE POLÍTICAS PÚBLICAS
Mateus da Jornada Fortes[1]
Sara Brisola[2]
INTRODUÇÃO
A ideia de controle judicial dos atos administrativos tem como ponto de partida discussão acerca da forma de limitação do poder estatal e a respectiva separação de funções. Há muito Platão, Aristóteles, Locke, Maquiavel e Montesquieu trataram da temática atinente à estruturação do Estado, dando ensejo ao modelo político atual que se inseriu na maioria das democracias, calcados em uma separação tripartite das suas funções.
No modelo brasileiro, a Constituição Federal expressamente adotou a tripartição de funções do Estado preconizada por Montesquieu (art. 2°), estabelecendo que os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário são independentes e harmônicos entre si. (BRASIL, 2016). Trata-se do sistema de controle recíproco, conhecido como freios e contrapesos (check and balances), através da limitação poder pelo próprio poder para a garantia do Estado Democrático de Direito. (MONTESQUIEU, 2004).
Ocorre que o Direito Constitucional contemporâneo, especialmente fruto do constitucionalismo do pós-guerra, traz em seu bojo um rol de direitos fundamentais a serem observados pelo Estado, o que tem provocado interpretações menos estanques acerca das funções estatais. A extensão dos direitos e garantias fundamentais inseridos na Constituição Federal de 1988 trouxe novas experiências jurídicas, com novos problemas a exigir novas respostas para a atuação de cada um dos poderes de Estado.
Sob esse viés, o cerne da questão perpassa por descortinar os limites da atuação estatal administrativa, mas principalmente sobre a possibilidade de intervenção judicial quanto à ela.
1. A atuação judicial em matéria de políticas públicas: ativismo judicial?
Ao se tratar da separação de funções estatais e dos seus limites, revela-se imprescindível analisar o papel do Supremo Tribunal Federal (STF). No moderno Estado Democrático de Direito a jurisdição constitucional brasileira tem sido uma importante garantidora dos direitos fundamentais dos cidadãos, o que não a isenta de questionamentos acerca do modo como age e tampouco em relação aos marcos de sua atuação.
O Poder Judiciário ostenta um papel de legitimação dos atos de outros poderes ao promover um sentimento público de que a Constituição foi obedecida (BLACK JR apud CAMPOS, 2014; MOREIRA, p. 178), no entanto por vezes decide sobre temáticas que não são consensos no meio social e tampouco passaram por uma deliberação nos órgãos democraticamente eleitos, trazendo um grande problema de legitimação para as decisões oriundas de um tribunal. Agravam-se as críticas à atuação do Poder Judiciário pelo fato de muitas vezes contrariar o texto constitucional sob o argumento de interpretá-lo ou por criar determinado direito sem a respectiva base legal ou constitucional expressa, amparado em princípios de baixa densidade normativa[3]. Dessa forma, em diversas decisões o STF interfere de forma ativa nas escolhas de outros poderes suprimindo-lhes o papel do âmbito das políticas públicas, criando direitos ao invés de aplica-los como posto (ESTEVES, p. 127) .
A possibilidade de protagonismos pelo Poder Judiciário se deve à estruturação do controle de constitucionalidade que permitiu um amplo acesso ao STF a partir do texto de uma Constituição prolixa. O fato de haver um grande espectro de matérias passíveis de serem analisadas pela jurisdição constitucional através de uma vasta gama de instrumentos jurídicos permite indagar sobre o tema ativismo judicial, numa perspectiva multidimensional (CAMPOS, 2014).
Imperioso referir que a concepção do que caracteriza ativismo judicial não é homogênea, sendo em grade parte criticada sob o argumento de que juízes ativistas representam uma ameaça para a democracia e para a separação de poderes. De outro lado, encontra-se os defensores da atuação judicial de maneira assertiva para garantia dos direitos fundamentais, especialmente em virtude da inércia e do abuso de poder por parte de outras instituições (CAMPOS, 2014).
Dessa forma, mostra-se relevante adentrar em algumas questões a fim de estabelecer um parâmetro mínimo de análise. O primeiro fator importante diz respeito à diferença entre judicialização e ativismo judicial. Parte da doutrina os separa ao passo que outro segmento não faze essa diferenciação, aceitando-os como sinônimos. O Min. do STF, Luís Roberto Barroso trata da judicialização como fruto do contexto constitucional brasileiro, não se tratando de um exercício deliberado de vontade política porque o Poder Judiciário é convocado a se manifestar. O ativismo está ligado a uma atitude ou escolha de modo específico, interpretando a Constituição de modo proativo expandindo seu sentido e alcance, sendo encontrado em momentos de retração de outros Poderes (BARROSO, 2010).
A aludido integrante da Suprema Corte brasileira assevera que a judicialização decorre do modelo constitucional pátrio, em três fatores: a) a redemocratização em 1988; b) a constitucionalização abrangente, trazendo para a Constituição inúmeras matérias deixadas para o processo político majoritário e a legislação ordinária; c) e o terceiro a adoção de um sistema de controle de constitucionalidade muito abrangente (BARROSO, 2010).
Sob outra perspectiva, Campos enquadra o ativismo judicial como decorrência da expansão dos textos Constitucionais, bem como a falta de deferência institucional aos outros Poderes da República. Dessa forma, concebe o ativismo em cinco diretrizes: (i) trata-se de uma questão de postura expansiva do poder político normativo dos juízes; (ii) não é possível classificar ativismo como legítimo ou ilegítimo; (iii) possui um caráter dinâmico e contextual de sua identificação e validade; (iv) a pluralidade de variáveis contextuais limitam e moldam ou favorecem o ativismo; (v) e a compreensão do ativismo como uma estrutura adjudicatória multidimensional (CAMPOS, 2014).
Lênio Streck alude que a judicialização é contingencial não sendo um mal em si, ocorrendo na maioria das democracias. O problema reside no ativismo considerado a vulgata da judicialização. Refere ainda tratar-se a judicialização de um problema de incompetência para a prática de determinado ato e o ativismo um problema de comportamento em que o juiz substitui os juízos políticos e morais pelos seus, e assim decide através de sua subjetividade (STRECK, 2017).
Para Marshall “ativismo jurisdicional é conceituado, como a recusa dos Tribunais em se manterem dentro dos limites jurisdicionais estabelecidos para o exercício de seus poderes” (MARSHALL apud VALE, 2015, p. 2).
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