DIREITO E PSICOLOGIA NUDGES
Por: Antonia Irandi Alcantara • 26/11/2022 • Trabalho acadêmico • 1.330 Palavras (6 Páginas) • 86 Visualizações
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE DIREITO DE RIBEIRÃO PRETO
DEYSE ALCANTARA DE LIMA (12686206)
DIREITO, PSICOLOGIA E NEUROCIÊNCIA: UMA RELAÇÃO INTERDISCIPLINAR
Vieses e heurísticas nas decisões judiciais
Prof. Sérgio Nojiri
RIBEIRÃO PRETO
2021
O presente trabalho tem como objetivo dissertar acerca dos vieses e heurísticas nas decisões judiciais. Para tanto, será utilizado o termo decisão judicial em sentido estrito, como aquela que encerra o processo judicial, ou seja, em última instância. Por sua vez, a estrutura contará com uma breve introdução ao assunto, um desenvolvimento por espécies de vieses e suas respectivas raízes heurísticas, além de uma conclusão opinativa.
1 INTRODUÇÃO
No interior do debate a respeito da figura do juiz no processo de tomada de decisão e sua respectiva conduta, existem diversos posicionamentos - tanto no campo jurídico quanto em outras áreas do saber, num processo de mútua influência. É possível elencar essas opiniões em dois grupos gerais: formalistas e realistas. O primeiro, seguindo a linha do pensamento jurídico tradicional, considera que “as regras e os parâmetros anteriormente fixados servem para impedir ou limitar as crenças e desejos pessoais do julgador, de forma a viabilizar um resultado racional e justificado do processo” (NOJIRI, 2017, n.p). Desse modo, “a lei seria racionalmente determinada e o magistrado a aplicaria ao caso concreto de modo mecânico” (LEITER, 1999, p. 1145). Já o segundo grupo defende existir impacto bastante significativo de fatores extrajudiciais no processo de tomada de decisão. Dessa forma, as respostas dos juízes aos casos que lhes são expostos seriam dadas com base em um processo intuitivo e somente depois seria aplicada uma deliberação racionalizada à análise (GUTHRIE, RACHLINSKI, WISTRICH, 2007, p. 102).
Com avanços das pesquisas em psicologia e neurociência, principalmente os estudos de Daniel Kahneman e Amos Tversky, as teses realistas foram corroboradas. Neste ponto, é importante esclarecer que tais influências cognitivas não se tratam de determinações sócio-biológicas, mas de perturbações à ideia de racionalidade intocável, acolhida pelo formalismo, pois possuem impacto considerável sobre o processo decisório. Retornando às pesquisas no campo da psicologia, Kahneman trabalha com a analogia entre sistemas interligados: um correspondente à automaticidade, intuição e emoção dos indivíduos; e outro ligado ao pensar lento e responsável pelo controle racional. O vínculo desses sistemas é estabelecido pelo controle que o segundo faz quanto ao primeiro. Apesar disso, é um controle que está sujeito a vieses, pois nem sempre um indivíduo usa a totalidade se sua capacidade deliberativa para resolução de questões complexas, sobretudo quando se torna parte de sua rotina. Portanto, se juízes são humanos e humanos são impactados por vieses e heurísticas, logo a decisão dos juízes é também fundamentada nesses. A partir daqui iniciamos um detalhamento sobre suas principais classificações e, posteriormente, analisaremos um exemplo particular.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 VIESES E HEURÍSTICAS: CONCEITOS E PRINCIPAIS CLASSIFICAÇÕES
Cabe agora estabelecer parâmetros conceituais para os termos em exame. A heurística, segundo Kahneman, é tecnicamente “um procedimento simples que ajuda a encontrar respostas adequadas, ainda que geralmente imperfeitas, para perguntas difíceis" (KAHNEMAN, 2012, p. 127). Não obstante a redução do tempo e do esforço nos julgamentos, elas podem levar a erros e vieses de pensamento (TONETTO [et al], 2006, p. 187), sendo estes “distorções cognitivas que costumam levar o intérprete a erros sistemáticos de avaliação e controle” (FREITAS, 2013, p. 225).
Daniel Kahneman distingue três heurísticas predominantes, que podem corresponder a diversos vieses, além de se relacionarem construindo vieses conjuntamente. São elas: disponibilidade, ancoragem e representatividade. A primeira concerne na desenvoltura com que o indivíduo se lembra de um determinado fato, exagerando ou subestimando a probabilidade de que um dado evento ocorra. Nesse sentido, “as pessoas julgam essa probabilidade pela facilidade de evocar exemplos em suas memórias.” (TONETTO [et al], 2006, p. 184). Em seu turno, a segunda refere-se a casos que envolvam estimativas e/ou valores, assim o valor inicial proposto tende a influenciar o valor final, de modo que a âncora age como uma sugestão. No que toca à terceira heurística, pode ser relacionada ao julgamento por estereótipo, baseado em modelos mentais de referência - sejam eles de raça, gênero, classe, etc.
Nessa linha, vieses cognitivos são gerados a partir de tais heurísticas, tanto individualmente quanto em conjunto. Pode-se sistematizá-los da seguinte forma, conforme Bazerman (1994):
[pic 1]
[pic 2]
[pic 3]
Dito isso e feitos esses apontamentos, o próximo tópico se ocupará em analisar mais especificamente de um viés ainda não retratado no presente trabalho.
2.2 ANÁLISE ESPECÍFICA - OWN-RACE BIAS
A partir da discussão apresentada, segue-se concisa exposição acerca do viés denominado own-race bias. Pode ser definido como um fenômeno que afeta a memória humana no que tange ao reconhecimento de rostos e características étnicas em geral, sendo que os que são da própria raça do juiz são mais lembrados do que aqueles de etnias menos familiares. Tendo como pressuposto sua origem na heurística da representatividade, dado que tal influência advém de um julgamento por estereótipo, fundamentado em um padrão mental de referência, pode-se depreender que somos mais capacitados para identificar pessoas da própria raça/etnia da qual fazemos parte. Urge ressaltar que esse padrão é baseado em preconceitos proveniente das esferas social e neurológica, segundo o estudo americano Thirty years of investigating the own-race bias in memory for faces.
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