Kelsen na caverna de Chauvet
Por: Carolina Pimenta • 11/5/2015 • Resenha • 1.073 Palavras (5 Páginas) • 555 Visualizações
Sociedade primitiva e xamanismo: Kelsen na caverna de Chauvet
Carolina Silveira Pimenta 11511DIR200
Descoberta por três exploradores no ano de 1994, localizada a 400 metros do rio Ardéche, no sul da França, e com 400 metros de comprimento, a caverna de Chauvet é considerada a maior descoberta arqueológica dos últimos anos e recebe este nome em homenagem a seu maior descobridor, Jean-Marie Chauvet. Sua importância na arqueologia se deve ao fato da mesma ser riquíssima em pinturas rupestres datadas de 32 mil anos atrás, ou seja, duas vezes mais antigas que quaisquer outras descobertas feitas até então.
Acredita-se que há presença humana em Chauvet desde a Era Glacial do Período Paleolítico, período este em que havia ainda Neandertais sobre a Terra. Entretanto, acredita-se que seres humanos não habitaram Chauvet, devido ao fato de não terem sido encontrados ossos humanos no meio dos diversos tipos de ossos presentes em seu interior, acreditando-se então na utilização da caverna apenas para fins culturais e sócio-normativos.
É necessário destacar a relação homem-natureza nessas culturas. É notório, ao longo do documentário uma espécie de fluidez/permeabilidade de conceitos para entender a arte rupestre ali representada. As categorias homem, mulher, cavalo, bisão, dentre outras podem se mesclar dentro daquilo que Kelsen, em sua obra Teoria Pura do Direito, classificou como animismo:
“O chamado animismo dos primitivos, a sua concepção de que nem só o homem tem uma alma, de que todas as coisas inanimadas - inanimadas segundo a nossa concepção - são dotadas de alma, de que nas coisas ou por detrás delas existem espíritos invisíveis mas poderosos, ou seja, de que todas as coisas são homens ou seres hominais, pessoas - toda esta concepção se funda na crença de que as coisas se comportam em relação aos homens tal como os homens se comportam entre si, isto é, segundo o princípio basilar da retribuição, segundo o princípio da pena e do prêmio. Na crença dos primitivos é destas almas ou espíritos que vêm a infelicidade do homem, como castigo, e a sua felicidade, como prêmio. (...) A essência do animismo é uma interpretação personalística, e portanto sócio-normativa, da natureza, uma interpretação que opera não segundo o princípio da causalidade, mas segundo o princípio da imputação.”
O documentário “A caverna dos sonhos esquecidos” (Cave of forgotten dreams), retrata claramente manifestações de animismo em Chauvet, sendo o mais claro trecho aquele que mostra a mesclagem entre a imagem de uma mulher e a de um bisão. Há entretanto outros trechos a ressaltar, como o que frisa a imagem de cavalos logo á entrada da caverna olhando para os visitantes e o crânio de um urso posto sobre uma pedra, formando uma espécie de altar, que apontava para a entrada da caverna, onde provavelmente eram feitos rituais.
Em seu livro fundamentos da história do Direito, Antônio Carlos Wolkmer destaca sobre os rituais primitivos e o Direito:
“(...) num tempo em que inexistiam legislações escritas, códigos formais, as práticas primárias de controle são transmitidas oralmente, marcadas por revelações sagradas e divinas. Distintivamente da ênfase atribuída à família feita por Fustel de Coulanges, H. Summer Maine entende que esse caráter religioso do direito arcaico, imbuído de sanções rigorosas e repressoras, permitiria que os sacerdotes-legisladores acabassem por ser os primeiros intérpretes e executores das leis. O receio da vingança dos deuses, pelo desrespeito aos seus ditames, fazia com que o direito fosse respeitado religiosamente, Daí que, em sua maioria, os legisladores antigos (reis, sacerdotes) anunciaram ter recebido as suas leis do deus da cidade. De qualquer forma, o ilícito se confundia com a quebra da tradição e com a infração ao que a divindade havia proclamado. Neste aspecto, nas manifestações mais antigas do direito, as sanções legais estão profundamente associadas às sanções rituais.”
Ainda em relação aos rituais, é notória uma técnica nas pinturas que causam sensação de movimento, especialmente quando à luz de tochas. Há várias delas representando animais (especialmente cavalos e bisões) com oito pernas e de acordo com o relevo da caverna. Intui-se então que haveriam rituais com dança à luz de tochas próximo à estas imagens, destacando a relação entre o direito primitivo e os sentidos. Sobre isto, Kelsen ressalta:
“Uma investigação das sociedades primitivas e da especificidade da mentalidade primitiva mostra que o mesmo princípio está na base da interpretação da natureza pelos homens primitivos. É mais do que provável que o primitivo ainda não explicasse os fenômenos naturais segundo o princípio da causalidade. Este princípio, como princípio fundamental da ciência natural, é, como ela mesma, aquisição de uma civilização relativamente avançada. O homem primitivo interpreta os fatos que apreende através dos seus sentidos segundo os mesmos princípios que determinam as relações com os seus semelhantes, designadamente, segundo normas sociais.”
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