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O DILEMA SOBRE A RESERVA DO POSSÍVEL E O MÍNIMO EXISTENCIAL SOB A ÓTICA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Por:   •  26/10/2020  •  Dissertação  •  1.210 Palavras (5 Páginas)  •  244 Visualizações

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O DILEMA SOBRE A RESERVA DO POSSÍVEL E O MÍNIMO EXISTENCIAL: SOB A ÓTICA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

 

Diego Caxias Fernandes[1]**

A Constituição de 1988 elencou a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (v. artigo1º, inciso III, da CF). Para o direito constitucional brasileiro contemporâneo, esse princípio é magno. Os demais ramos dos direitos são analisados a partir da Constituição e a Constituição a partir do inciso III, do art. 1º. Daí decorrem os objetivos fundamentais (art. 3º da CF/88), os direitos e garantias fundamentais (art. 5º da CF/88) e os direitos sociais (art. 6º da CF/88).

Com a conscientização da população acerca de seus direitos e o fortalecimento das instituições destinadas a assegurá-los (como, por exemplo, o Ministério Público e a Defensoria Pública) tornaram comum o ajuizamento de ações judiciais nas quais se demandam prestações materiais a serem oferecidas pelo Estado, com o objetivo de efetivar os direitos previstos no texto constitucional.

Nesse contexto, passou-se a fazer alusão, no Brasil, ao argumento da reserva do possível, o qual se originou na jurisprudência alemã, na década de 1970.

A reserva do possível é um argumento ocasionalmente utilizado nas respostas do Estado às demandas judiciais cujo objeto é o adimplemento de prestações previstas em normas que conferem aos cidadãos algum direito fundamental. Objetiva adequar essas pretensões às possibilidades financeiras do Estado.

Tradicionalmente, a teoria da reserva do possível nos é apresentada como uma criação do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha que, no ano de 1973, ao julgar uma ação em que se impugnava a limitação de vagas no ensino superior de medicina, decidiu não ser possível garantir o acesso universal ao ensino superior, pois não haveria recursos orçamentários suficientes.

É possível se analisar a Teoria da Reserva do Possível sob o ponto de vista da teoria interna ou da teoria externa.

A teoria interna aduz que a reserva do possível seria um limite imanente à norma jusfundamental, ou seja, o limite ao exercício do direito que nasce com o próprio direito. Portanto, para a delimitação normativa de cada direito fundamental, seria sempre levada em consideração a escassez de recursos estatais, que é o fator determinante da invocação da reserva do possível.

Por outro lado, a teoria externa defende a limitação da reserva do possível não nasce com o direito fundamental, mas sim, é consequência das opções políticas realizadas pelos poderes públicos.

Segundo as lições de OLSEN (2008),  a reserva do possível deve ser considerada um elemento externo à norma de direito fundamental, que é o que preconiza a teoria externa das restrições. Não seria possível definir, de forma abstrata, as prestações que estariam abrangidas por determinado direito. Isso só poderia ser definido no caso concreto, comparando a pretensão apresentada com os recursos materiais disponíveis.

Em contraponto aos limites impostos pela reserva do possível, surge a ideia de mínimo existencial, como a própria designação já revela, compreende o conjunto de condições básicas para garantir a cada indivíduo uma vida com dignidade.

Ana Paula de Barcellos (2008, p.282) coloca os direitos fundamentais na imagem de dois círculos concêntricos onde o círculo interior contém o “mínimo de dignidade” como núcleo concreto extraído da exegese normativa, e já no espaço entre o círculo interior e o exterior termos a zona destinada às deliberações políticas a quem cumpre determinar as concepções de dignidade presentes em cada sociedade em dado momento histórico.

Segundo Ingo Sarlet (2013, p.22), tem-se a cisão entre o mínimo fisiológico abrangendo “necessidades de caráter existencial básico” e o mínimo existencial sociocultural que visa “assegurar ao indivíduo um mínimo de inserção – em termos de tendencial igualdade  – na vida social”. Ao comentar esta divisão conceitual, o mencionado jurista pondera que “o conteúdo essencial do mínimo essencial se encontra diretamente fundado no direito à vida e na dignidade da pessoa humana”, e já “o assim designado mínimo sociocultural encontra-se fundado no princípio do Estado Social e no princípio da igualdade no que diz com o seu conteúdo material” (SARLET, 2013, p.22).

Logo, o mínimo existencial é mais que o mínimo vital, como dito, abarca os direitos sociais, necessários a consecução de uma vida digna, ou seja, uma vida permeada pelos direitos fundamentais inerentes à dignidade da pessoa humana, constitucionalmente e internacionalmente reconhecidos.

A teoria da reserva do possível vem resolver um problema real, correspondente ao fato de que os recursos financeiros do Estado são finitos, contudo não deve ses interpretada à risca, levando ao esvaziamento da efetividade dos direitos sociais.

No intuito de harmonizar esses dois aspectos, a doutrina criou a garantia do núcleo essencial ou mínimo existencial, para relativizar a teoria da reserva do possível. Em linhas gerais, essa garantia representaria um conteúdo mínimo dos direitos sociais que não poderia sofrer restrições por parte do Estado, nem sob o argumento da indisponibilidade financeira. Apesar de a legislação brasileira não definir o que seja o conteúdo essencial, o princípio da dignidade humana oferece parâmetros para eleger quais direitos podem integrar tal conceito. Assim, o conteúdo essencial seria a porção do direito fundamental que não poderia ser suprimida nem restringida, sob pena de impossibilitar ao seu titular o desfrute de uma vida com dignidade.

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