MÍNIMO EXISTENCIAL COMO LIMITE À APLICAÇÃO DA RESERVA DO POSSÍVEL
Por: rayannyoliveiraa • 23/9/2021 • Tese • 11.666 Palavras (47 Páginas) • 197 Visualizações
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O MÍNIMO EXISTENCIAL COMO LIMITE À APLICAÇÃO DA RESERVA DO POSSÍVEL AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS
THE “MINIMUM FOR EXISTANCE” AS A LIMIT TO THE APPLICATION OF THE “RESERVE OF THE POSSIBILITIES” THEORY IN THE CONTEXT OF FUNDAMENTAL SOCIAL RIGHTS.
Juliana Tiemi Maruyama Matsuda
Advogada da União
Helida Maria Pereira
Advogada da União
Luciana Camila de Souza
Advogada da União
RESUMO: O presente trabalho analisa a relação entre eficácia dos direitos sociais, reserva do possível e mínimo existencial. Para isso, apresenta as teorias interna e externa, construídas acerca da legitimidade das restrições aos direitos fundamentais sociais, ressaltando a necessidade de os limites serem submetidos ao controle de constitucionalidade e proporcionalidade. Especial atenção é conferida a uma dessas restrições, qual seja, a reserva do possível, mostrando-se seus antecedentes históricos e a visão das teorias interna e externa a respeito. Em um segundo momento, passa a analisar a garantia do conteúdo essencial, inclusive as teorias acerca do seu objeto (teorias objetiva e subjetiva) e do seu valor (teorias absoluta e relativa). Em seguida, aborda o conceito do mínimo existencial no contexto dos direitos fundamentais sociais, e relaciona-o com a garantia do conteúdo essencial, concluindo que ambos exercem a importante função de servir como parâmetro para a aferição da proporcionalidade das restrições que o Estado, sob o argumento da reserva do possível, impõe à eficácia dos direitos fundamentais sociais.
PALAVRAS-CHAVE: Direitos fundamentais sociais. Eficácia. Restrições. Reserva do possível. Garantia do conteúdo essencial. Mínimo existencial. Proporcionalidade.
ABSTRACT: This study presents an analysis of the relationship between effectiveness of social rights, the “under reserve of the possibilities” clause and the “minimum for existance”. For that reason, it presents the internal and external theories, about the legitimacy of restrictions on fundamental social rights, highlighting that the limits have to be submitted to the control of constitutionality and proportionality. Special attention is given to one of this restrictions, which is the “under reserve of the possibilities” clause, showing its historical background and what the view of the internal and external theories about it. In a second step, it analyzes the “security of essential content”, including theories about its object (objective and subjective theories) and its value (absolute and relative theories). Then, deals with the concept of the “minimum for existance” in the context of fundamental social rights, and relates it to the “security of essential content”, concluding that both have the important function of serving as a parameter for measuring the proportionality of the restrictions that the State, under the argument of the “reserve of the possibilities”, imposes to the effectiveness of fundamental social rights.
KEYWORDS: Fundamental social rights. Effectiveness. Restrictions. Under reserve of the possibilities clause. Security of essential content. Minimum for existance. Proportionality.
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SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1 Limites aos direitos fundamentais; 2Reserva do possível; 2.1 Antecedentes históricos; 2.2 Reserva do possível sob o ponto de vista das teorias interna e externa; 3 Garantia do núcleo essencial;3.1 Objeto de proteção do núcleo essencial; 3.1.1 Teoria objetiva; 3.1.2 Teoria subjetiva; 3.2 Valor de proteção do núcleo essencial; 3.2.1 Teoria absoluta; 3.2.2 Teoria relativa; 4 O mínimo existencial no contexto dos direitos fundamentais sociais; 5 Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO
A Constituição de 1988 elencou a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (v. artigo1º, inciso III, da CF), além de indicar, no artigo 3º, seus objetivos fundamentais, in verbis:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Outrossim, incluiu os direitos sociais (como o direito à saúde, à educação, à moradia e à assistência social) na categoria dos direitos fundamentais (Título II da CF), os quais são dotados de eficácia imediata, nos termos do artigo 5º, § 1º1, da CF.
Todos esses fatores foram importantes ferramentas para a concretização dos aludidos fundamentos e objetivos da nossa República Federativa.
A categoria dos direitos sociais, classificada pela doutrina como a 2ª geração dos direitos fundamentais (em oposição aos de 1ª geração, relacionados com a liberdade individual frente ao Estado), demanda atuações positivas por parte do Estado, o que, por sua vez, exige o dispêndio de recursos. Como estes são finitos, acabam se tornando um limite à concretização dos direitos sociais.
Ao mesmo tempo, a conscientização da população acerca de seus direitos e o fortalecimento das instituições destinadas a assegurá-los (como, por exemplo, o Ministério Público) tornaram comum o ajuizamento de ações judiciais nas quais se demandam prestações materiais a serem oferecidas pelo Estado, com o objetivo de efetivar os direitos sociais previstos no texto constitucional.
Nesse contexto, passou-se a fazer alusão, no Brasil, ao argumento da reserva do possível, o qual se originou na jurisprudência alemã, na década de 1970. Tal conceito introduziu, nas discussões acerca do dever do Estado de implementar os direitos sociais, a preocupação com a sua disponibilidade orçamentária.
De um lado, a teoria da reserva do possível vem resolver um problema real, correspondente ao fato de que os recursos financeiros do Estado são finitos; de outro lado, se interpretada à risca, equivale ao esvaziamento da efetividade dos direitos sociais, contrariando o § 1º do artigo 5º do texto constitucional, que determina a aplicação imediata dos direitos e garantias fundamentais.
A fim de harmonizar esses dois aspectos, a doutrina criou a garantia do núcleo essencial, para
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