O JEITINHO BRASILEIRO
Por: Luana de Assis • 26/8/2015 • Resenha • 1.492 Palavras (6 Páginas) • 886 Visualizações
1. O JEITINHO BRASILEIRO
A expressão “jeitinho” vem com a ideia de cordialidade, e segundo alguns autores, seria uma das características marcantes do brasileiro. O autor Sergio Buarque de Holanda disserta em seu livro Raízes do Brasil, publicado em 1936, \cerca do jeitinho brasileiro e o homem cordial Ele nos diz que “jeitinho brasileiro” é o jeito cordial de o brasileiro ser. A palavra cordial remete ao latim cordis, que significa coração. O Homem cordial é aquele que age com o coração ao invés da razão. (COELHO, 2012, sp)
Escrito em meados da década de 1930, Raízes do Brasil data de um período de transição política. A República Velha tinha ficado para trás, a ditadura varguista ainda não se instalara totalmente e a democracia formal era uma perspectiva remota. Desde o movimento modernista, no entanto, que na década de 1920 desferira um golpe contra a influência lusitana na cultura, intelectuais brasileiros procuravam uma identidade brasileira. O livro de Buarque de Holanda faz parte desse esforço, ao lado de Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre. Como intérpretes do Brasil, ambos são gigantes, embora com visões divergentes: enquanto Freyre revela certa nostalgia da influência portuguesa, Buarque de Holanda se regozija por ela começar a ser superada. (PIGALLO, 2012, sp).
Holanda mostra como a família patriarcal no Brasil (iniciado com os portugueses) contribuiu para a formação do “homem cordial”, aquele individuo que não consegue separar o público do privado, que não consegue entender que a vida no Estado burocrático deve ser impessoal e não pessoal. Na verdade, Holanda afirma que o “homem cordial” é a contribuição do Brasil para a civilização. (BEZERRA, 2011, sp). Assim como assevera o autor Sérgio Buarque de Holanda:
A lhaneza no trato, a hostilidade, a generosidade, virtudes tão gabadas por estrangeiros que nos visam, representam, com efeito, um traço definido do caráter brasileiro, na medida, ao menos, em que permanece ativa e fecunda a influência ancestral dos padrões de convívio humano, informados no meio rural e patriarcal. Seria engano supor que essas virtudes possam significar ‘boas maneiras’, civilidade. São, antes de tudo, expressões legítimas de um fundo emotivo extremamente rico e transbordante – ela pode exprimir-se em mandamentos e em sentenças. (1995, p. 146-147 passim).
O jeitinho indica um modo simpático, desesperado e até humano de relacionar o impessoal com o pessoal. Em geral é pacífico, vem acompanhado com uma certa lhaneza, desenvoltura com as palavras e um sorriso singelo. O jeitinho em si, não é utilizado com rispidez, pois uma vez que perde a sua característica afabilidade, adquire certo tom autoritário e, desta forma, transforma-se no argumento do malandro, o famoso “sabe com quem está falando?”, que veremos mais à frente.
Sergio Buarque de Holanda, em sua obra Homem Cordial, disserta sobre o brasileiro e uma característica presente no seu jeito de ser: a cordialidade. Entretanto, ao contrário do que a nomenclatura nos leva a pensar, cordial não é uma pessoa gentil; mas trata-se, no entendimento do autor, daquele que age movido pela emoção no lugar da razão – sem distinção entre público e privado. Esse tal brasileiro citado por Holanda, odeia formalidades, ao passo que põe de lado a ética e a civilidade.
Já no livro O que faz o brasil, Brasil? o brasileiro é retratado através dos aspectos mais simples e bem próximos da realidade. Uma desses é a figura do malandro e o emprego da malandragem, principalmente na forma verbal de dizer “sabe com quem está falando?” (DA MATTA, 1997, p. 182). A figura do malandro traz à tona a hierarquização da desigualdade:
O ‘Sabe com quem está falando?’, além de não ser motivo de orgulho para ninguém – dada a carga considerada antipática e pernóstica da expressão -, fica escondido na nossa imagem (e auto-imagem) como um modo indesejável de ser brasileiro, pois que revelador do nosso formalismo e da nossa maneira velada (e até hipócrita) de demonstração dos mais violentos preconceitos.
A nosso ver, tanto o famoso “jeitinho” quanto o “sabe com quem você está falando.” são dois pontos da mesma situação. Enquanto o primeiro de trata de um estilo mais harmonioso e mais afável de se obter determinada vantagem ou benefício, o outro destaca-se por ser mais conflituoso e prepotente de burlar as regras e fugir da burocracia. No entanto, apesar das diferentes formas de abordagem entre o jeitinho e a malandragem, ambos representam a dificuldade que o brasileiro tem de seguir a lei na sua realidade social cotidiana. Vejamos:
Um livro que escrevi – Carnavais, malandros e heróis – lancei a tese de que o dilema brasileiro residia numa trágica oscilação entre um esqueleto nacional feito de leis universais cujo sujeito era o indivíduo e situações onde cada qual se salvava e se despachava como podia, utilizando para isso o seu sistema de relações pessoais. Haveria assim, nessa colocação, um verdadeiro combate entre leis que devem valer para todos e relações que evidentemente só podem funcionar para quem as tem. O resultado é um sistema social dividido e até mesmo equilibrado entre duas unidades sociais básicas: o indivíduo (o sujeito das leis universais que modernizam a sociedade) e a pessoa (o sujeito das relações sociais, que conduz ao pólo tradicional do sistema). Entre os dois, o coração dos brasileiros balança. E no meio dos dois, a malandragem, o “jeitinho” e o famoso e antipático “sabe com quem está falando?” seriam modos de enfrentar essas contradições e paradoxos de modo tipicamente brasileiro. Ou seja: fazendo uma mediação também
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