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O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NA ADMINISTRAÇÃO

Por:   •  17/8/2018  •  Resenha  •  4.109 Palavras (17 Páginas)  •  122 Visualizações

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ENTERRÍA, Eduardo Garcia de; FERNÁNDEZ, Tomás-Ramón. Curso de direito administrativo. Revisor técnico Carlos Ari Sundfeld, Tradutor José Alberto Froes. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014

CAPÍTULO VIII. O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NA ADMINISTRAÇÃO

I. ESTADO DE DIREITO E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE: O SENTIDO ORIGINÁRIO DESSE PRINCÍPIO

Todo Estado é um “Estado de Direito”. Todo Estado corresponde a uma positivação (Kelsen).

Distingue-se os Estados em “Estados de Direito” ou “Estados de não-Direito”, a partir do conceito do que é o “Direito”: isso implica em um conceito material de Direito (natural).

O Direito Administrativo surge dos ideais da Revolução Francesa, contrários aos fundamentos do Direito do absolutismo (Rei como a fonte de todo Direito, por ser o representante de Deus; e sua atuação podia se dar por meio de normas gerais, atos excepcionais ou por sentenças contraditórias àquelas).

Os revolucionários rejeitavam ambas as coisas: a fonte do Direito não está em nenhum plano supostamente transcendental à comunidade, mas nela própria, na sua vontade geral; e, ao mesmo tempo, existe apenas uma forma legítima de expressão desta vontade, a Lei geral (lex singularis ou privilégio é uma contradictio in terminis para a filosofia naturalista do Iluminismo que alimenta a Revolução), Lei geral que há de determinar todos e cada um dos atos singulares do poder. O Iluminismo não visava “a glória do Estado” (la gloire d’Etat), mas sim “a liberdade do cidadão” (la liberte du citoyen).

Uma vez consolidada essa nova concepção do Direito (em sua fonte; em sua manifestação, em seu fim), o conceito de Estado de Direito se identifica com sua realização e se torna um modelo de Direito natural que estará à frente de toda a evolução política do Ocidente até os nossos dias.

No que toca à nossa matéria, o aspecto substancial do mecanismo que permanece não é que a Lei seja geral ou excepcional, senão que toda ação singular do poder esteja justificada por uma Lei prévia. Esta exigência parte de duas justificativas muito claras (legalidade em sentido estrito + separação de poderes).

Uma mais geral e de base, a ideia de que a legitimidade do poder provém da vontade comunitária, cuja expressão típica, como já estudamos, é a Lei; já não se admitem poderes pessoais como tais, pelo simples motivo de que não há qualquer pessoa com ascendência sobre a comunidade e que ostente como atributo divino a faculdade de editar normas vinculantes para tal comunidade; todo o poder é da Lei, toda autoridade que pode ser exercida é a própria da Lei. Somente em "nome da Lei" é possível impor obediência.

A segunda ideia que reforça essa exigência de que toda atuação singular do poder tenha de estar acobertada por uma Lei prévia é o princípio técnico da separação dos poderes: o Executivo é assim designado porque sua missão é justamente "executar" a Lei, particularizar seus mandatos nos casos concretos; a diferenciação entre os poderes Legislativo e Executivo dá ao primeiro a preeminência e limita o segundo a agir dentro do marco prévio traçado pelas decisões daquele, isto é, pelas Leis. O mesmo ocorre com o Poder Judiciário, que deixa de ser um poder livre, suposta expressão direta da soberania e com a mesma força criativa que o poder normativo supremo, para ser definitivamente legalizado, submetido à Lei.

Esta técnica estrutural obrigatória é justamente o que se chama de princípio da legalidade da Administração: esta sujeita-se à Lei, cuja execução limita suas possibilidades de atuação.

O aspecto genuinamente excepcional do regime de Direito Público fruto da Revolução, que se materializa, no que nos diz respeito, no Direito Administrativo, e que constitui sua definitiva originalidade histórica, é justamente essa mudança radical de concepção do sistema jurídico. A Administração é uma criação abstrata do Direito e não uma manifestação pessoal de um soberano e cuja atuação se submete obrigatoriamente à legalidade, a qual, por sua vez, é uma legalidade objetiva, que se sobrepõe à Administração e não um mero instrumento ocasional e relativo desta, característica que também autoriza que tal legalidade possa ser invocada pelos particulares por meio de um sistema de ações, expressão do princípio da liberdade que a Revolução institucionaliza e que revela como essa legalidade vem a se decompor em verdadeiros direitos subjetivos.

Tal é o sentido geral do princípio da legalidade administrativa.

II. O ÂMBITO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E SUA CONSTRUÇÃO TÉCNICA

A questão, a partir dessa apresentação simples e clara, complica-se com o surgimento e desenvolvimento de um poder normativo próprio da Administração, o poder regulamentar. Contudo, nesse momento, o trabalho não pretende investigar as relações entre Lei, Regulamento e Princípio da Legalidade. Volta-se a atenção para o Ordenamento Jurídico como uma Unidade e a vinculação da Administração a essa Unidade.

Por isso falaremos do princípio da legalidade da Administração generalizando o conceito da legalidade, não em relação a um tipo de norma específica, mas ao ordenamento como um todo, àquilo que Hauriou chamava de "bloco da legalidade" (Leis, Regulamentos, princípios gerais, costumes). (Merkl denominou esta perspectiva de "princípio da juridicidade" da Administração, reservando o nome de "princípio da legalidade" ao jogo proveniente apenas da Lei formal; no entanto, parece uma complicação terminológica desnecessária, depois de esclarecidas as coisas.)

Nossa questão é definir em que sentido o ordenamento opera para determinar a posição jurídica da Administração e sua atuação em concreto. Ou de forma inversa: que tipo de vinculação atinge a Administração em relação ao ordenamento que a rege.

1. AS CONSTRUÇÕES TRADICIONAIS DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE DA ADMINISTRAÇÃO: APLICAÇÃO SINGULAR DA LEI E DOUTRINA DA VINCULAÇÃO NEGATIVA

De acordo com a abordagem primitiva do princípio da legalidade, a Administração, em primeiro lugar, não poderia atuar por autoridade própria, mas sim sob o amparo da autoridade da Lei (o que podemos estender às demais fontes do ordenamento, na medida em que forem legitimamente produzidas); e segundo, esse mecanismo era qualificado como processo de execução da Lei (ou da legalidade, no sentido amplo retromencionado). O problema consistiria em materializar o conteúdo

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