Recurso de Multa
Por: Andressa Cristina Gomes • 23/2/2018 • Tese • 1.378 Palavras (6 Páginas) • 2.133 Visualizações
DO BIS IN IDEM
O Requerente foi penalizado com multa decorrente do cometimento de infração de trânsito prevista no artigo 164, do Código de Trânsito Brasileiro, por ter permitido posse do veículo a pessoa nas condições descritas pelo artigo 162, da mesma codificação.
Art. 164. Permitir que pessoa nas condições referidas nos incisos do art. 162 tome posse do veículo automotor e passe a conduzi-lo na via:
Infração - as mesmas previstas nos incisos do art. 162;
Penalidade - as mesmas previstas no art. 162;
Medida administrativa - a mesma prevista no inciso III do art. 162.
Não se insurge, portanto, contra a imposição dessa penalidade de multa, conquanto, falhou na obrigação de verificar se o condutor estava regularmente habilitado para tomar posse de seu veículo e passar a conduzi-lo.
Contudo, foi notificado da imposição da penalidade decorrente da pratica contida no artigo 162:
Art. 162. Dirigir veículo: [alterar os incisos do artigo 162]
II - com Carteira Nacional de Habilitação ou Permissão para Dirigir cassada ou com suspensão do direito de dirigir:
Infração - gravíssima;
Penalidade - multa (cinco vezes) e apreensão do veículo;
Todavia, não pode ser penalizado com as multas do artigo supra, conquanto não se trata de infração de trânsito de sua responsabilidade.
Isso porque, prevalecendo a penalidade ao proprietário do veículo, estará sendo duplamente penalizado em decorrência de um único fato, qual seja, o condutor ter conduzido veículo em infração ao artigo 162.
Nesse sentido, a penalidade em dobro, imputada apenas ao proprietário, incide no princípio bis in idem, proibido em nosso ordenamento jurídico.
Destarte, se de um lado, cabe ao proprietário verificar a habilitação legal e compatível dos condutores de seu veículo, de outro não se pode olvidar que o condutor não pode conduzir qualquer veículo sabendo de sua condição de condutor inabilitado ou do impedimento de exercer o direito de dirigir.
Deve existir, pois, uma relação de causalidade entre o infrator e a infração cometida e essa relação de causalidade entre proprietário e infração cometida, nas autuações decorrentes do artigo 162 simplesmente não existe, pois a conduta foi praticada pelo condutor e não pelo proprietário.
Não é possível admitir, portanto, a responsabilidade indireta do proprietário em uma infração que, sabidamente, não teve qualquer tipo de participação.
Estabelece o Código de Trânsito Brasileiro, em seu artigo 257:
Art. 257. As penalidades serão impostas ao condutor, ao proprietário do veículo, ao embarcador e ao transportador, salvo os casos de descumprimento de obrigações e deveres impostos a pessoas físicas ou jurídicas expressamente mencionados neste Código.
§ 1º Aos proprietários e condutores de veículos serão impostas concomitantemente as penalidades de que trata este Código toda vez que houver responsabilidade solidária em infração dos preceitos que lhes couber observar, respondendo cada um de per si pela falta em comum que lhes for atribuída.
§ 2º Ao proprietário caberá sempre a responsabilidade pela infração referente à prévia regularização e preenchimento das formalidades e condições exigidas para o trânsito do veículo na via terrestre, conservação e inalterabilidade de suas características, componentes, agregados, habilitação legal e compatível de seus condutores, quando esta for exigida, e outras disposições que deva observar.
§ 3º Ao condutor caberá a responsabilidade pelas infrações decorrentes de atos praticados na direção do veículo. [grifos nossos]
Não se verifica a solidariedade prevista no parágrafo primeiro do artigo 257 entre condutor e proprietário, conquanto o artigo 162 é de responsabilidade exclusiva do condutor.
Trata-se, pois, de responsabilidade indireta, que não guarda qualquer relação como o ato de dirigir em si.
Nesse ínterim, é possível se extrair duas situações irregulares no processo de suspensão do direito de dirigir ao qual o Requerente foi submetido:
- Tendo sido identificado o condutor infrator no momento da abordagem policial, a transferência de pontos para o proprietário do bem, fere o principio da individualização da pena e da busca da verdade real sobre os fatos ocorridos;
Os precedentes do superior tribunal de justiça indicam que haverá a responsabilidade indireta do proprietário quando o infrator não for devidamente Identificado pelo agente de trânsito ou pelo proprietário do veiculo, conforme orienta o artigo 257, do CTB.
Logo, atribuir tal penalidade ao proprietário do veículo como se este fosse o condutor infrator, além de violar o principio da individualidade da pena, viola também o principio ne bis in idem, posto que arcará com duas penalidades pecuniárias decorrentes do mesmo fato.
Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – ADMINISTRATIVO – INFRAÇÕES DE TRÂNSITO PREVISTAS NOS ARTS. 162, I, E 164 DO CTB – PROPRIETÁRIO E CONDUTOR - RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA E SOLIDÁRIA – DUPLA PENALIDADE – VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO NON BIS IN IDEM. 1. O proprietário do veículo que permite que pessoa não habilitada conduza seu automóvel não pode ser punido como se fosse o condutor do mesmo. 2. Ao condutor cabe a responsabilidade pelas infrações decorrentes de atos praticados na direção do veículo, consoante determina o § 3º do art. 257 do CTB. 3. O art. 162 do CTB visa punir o condutor de veículo que dirigir sem possuir Carteira Nacional de Habilitação ou Permissão para Dirigir, enquanto que o art. 164 do mesmo Diploma Legal tem por objetivo punir o proprietário, que tem o dever de zelar pelo veículo automotor. 4. A solidariedade manifesta-se quando o proprietário ou condutor incidam na hipótese descrita da norma, cujo infrator não se possa identificar (art. 257, § 7º, do CTB). 5. Neste caso, ao proprietário cabe tão-somente a infração do art. 164, sob pena de caracterizar violação do princípio do non bis in idem. 6. Recurso especial não provido. (REsp 912.985/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/08/2008, DJe 24/09/2008)
...