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O Direito Econômico e Globalização

Por:   •  19/6/2024  •  Projeto de pesquisa  •  9.372 Palavras (38 Páginas)  •  66 Visualizações

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Direito Econômico e Globalização

1 Primeiras considerações

Há quem diga que a globalização é novidade há 200 anos.

A globalização, sugere a ironia, é apenas uma faceta nova do velho capitalismo. E demasiada atenção a ela pode descurar do fato de que sua história não começou nos anos 90 do século XX.

Conquanto essa crítica tenha embasamento na realidade, ela não é suficientemente profunda, porém, para obscurecer a circunstância de que o que há de novo no velho fenômeno tem efeitos impressionantes, e suas consequências merecem ser estudadas.

Mercados abertos, liberdade alfandegária, relativização da ideia de soberania e do xenofobismo, linhas de produção mundiais, capitais flutuantes e de extrema volatilidade frequentando mercados financeiros sem limites de fronteira, esses os temas característicos do processo de maximização da rentabilidade econômica, responsáveis pela mais drástica alteração estrutural no modo de produção capitalista dos últimos anos.

Em matéria de Direito Econômico, esses efeitos são particularmente sentidos.

Mas é necessário abrandar o impulso inicial de considerar que tudo o que há de novo é fruto da globalização, e que a globalização vai proporcionar alterações em tudo.

É preciso distinguir o que são os efeitos da globalização sobre as práticas de mercado, que poderão ser controladas pelos mecanismos tradicionais do Direito Econômico, daqueles efeitos que tornam ultrapassados ou ineficientes certos controles jurídicos existentes.

Direito Econômico é o direito das políticas públicas econômicas, a regulação estatal da economia, influenciando, orientando, estimulando, restringindo o comportamento dos atores econômicos.

Muitos dos controles jurídicos hoje disponíveis continuarão a ser utilizados normalmente. Apenas haverá uma tendência de mudança nos comportamentos dos atores econômicos. Os comportamentos mudam, mas as regras continuarão as mesmas.

As normas jurídicas são dotadas da capacidade de generalidade. Mas haverá com certeza alguns setores do Direito Econômico cuja sobrevivência será seriamente posta em dúvida com as tendências detectadas mundialmente.

Em outros casos, ainda, haverá mudança de conteúdo e forma da ação do Direito Econômico, acompanhando as mudanças na própria postura do Estado em relação ao problema regulatório.

Também é preciso ressalvar que o processo de globalização é constituído de diversas partes. Não seria possível falar em globalização sem falar, por exemplo, em liberalização das economias nacionais.

Na base de uma tendência de redução da soberania nacional, de mercados mundiais, está a transformação do papel do Estado, no sentido de perda das atribuições anteriormente detidas e modificação das funções desempenhadas.

Algumas das transformações do Direito Econômico são atribuíveis não propriamente à globalização, mas a processos relativamente autônomos e anteriores à globalização, que significaram uma retirada circunstancial do Estado da cena econômica.

Ainda que tais processos tenham predisposto e sejam condição sine qua non da globalização, não podem legitimamente ser identificados com a globalização. Apesar disso, é difícil falar de efeitos da globalização sem que essas suas partes constituintes sejam consideradas.

2 Globalização e liberalização

A globalização é uma forma sintética de nos referirmos a um fenômeno muito amplo e complexo, o das transformações contemporâneas do sistema capitalista.

Justamente por sintetizar algo muito amplo, a palavra globalização costuma gerar grandes discussões conceituais. Meu propósito aqui não é o de aumentar a polêmica, mas o de simplificá-la, passados os arroubos iniciais que o tema suscitou no meio acadêmico.

Globalização significa o fenômeno econômico de busca de conquista de mercados sem restrições às fronteiras nacionais, o fenômeno político da crescente interdependência dos países, o fenômeno cultural de influências recíprocas entre habitantes de países diversos, o fenômeno social do frequente deslocamento e fixação de residência de habitantes de um país em outros, o fenômeno tecnológico da revolução informática e das telecomunicações, o fenômeno financeiro dos investimentos especulativos planetários, causando simultaneamente a reestruturação dos agentes econômicos, a transformação do papel do Estado e do direito em todos os países envolvidos.

Alguns autores sustentam que globalização existe desde que o capitalismo passou a ser o modo de produção dominante na economia ocidental.

A vocação do capitalismo é a de conquistar mercados. Fazê-lo globalmente era algo presente na gênese do sistema.

Escrevendo já no início dos anos 1980, e, portanto, antes que a palavra globalização fosse usada correntemente, um dos maiores historiadores contemporâneos, por exemplo, sustentava que “o fato maior do século XIX é a criação de uma economia global única, que atinge progressivamente as mais remotas paragens do mundo, uma rede cada vez mais densa de transações econômicas, comunicações e movimentos de bens, dinheiro e pessoas ligando os países desenvolvidos entre si e ao mundo não desenvolvido”.

Outros dizem que as políticas colonialistas do século XV em diante são formas ainda mais evidentes de globalização, em que os países centrais lutavam por novos mercados e por novos centros de produção deslocados da metrópole.

Países como Inglaterra, Portugal, França, Holanda, Espanha empreenderam vigorosas campanhas de descoberta de novas terras, e as exploraram durante séculos, seja transformando-as em novos mercados consumidores, seja utilizando-as como local de produção ou extração dos bens de que necessitava o comércio mundial.

Portanto, não é a primeira vez que a determinação do mercado a ser explorado pelos produtores de bens e serviços extrapola os limites nacionais. De fato, é preciso reconhecer que houve outros momentos de globalização na história.

Não receberam esse nome, mas eram formas de globalização. As principais diferenças entre antigas e novas globalizações são de forma e de intensidade. A forma como a ocupação dos mercados é feita, a forma como a economia globalizada exige um rearranjo de forças entre as empresas e países, a forma como os países passam a depender de uma nova mecânica de organização do capitalismo. Não há hoje uma guerra de conquista territorial, não há usurpação física de domínios.

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