Uma utopia ou realidade - Relações de conflito e amizade entre Brasil e Argentina na América do Sul
Por: Anderson Amendola • 23/10/2016 • Artigo • 4.078 Palavras (17 Páginas) • 624 Visualizações
UMA UTOPIA OU REALIDADE: RELAÇÕES DE CONFLITO E AMIZADE ENTRE BRASIL E ARGENTINA NA AMÉRICA DO SUL
Anderson de Oliveira Amendola da Silva (UFF)
Resumo: A antítese entre a utopia e a realidade, entre os que imaginam o mundo de modo a adaptá-lo à sua política, e os que elaboram sua política de modo a adaptá-la às realidades do mundo é a causa da eterna divisão dos teóricos de relações internacionais. O Brasil e a Argentina herdaram os conflitos de seus colonizadores e acabaram acirrando e mantendo essas rivalidades, que só foram superadas na história recente, devido ao entrelaçamento dessas duas potências regionais em torno da cooperação, principalmente na área de energia, que é um importante ponto estratégico, com a construção de usinas hidrelétricas conjuntamente e o apoio no desarmamento nuclear da região. Essa cooperação é uma atitude idealista ou pragmática? Será que essa decisão pela não proliferação de armas nucleares das duas principais potências regionais não deixa a América do Sul em uma situação de vulnerabilidade às influencias externas?
Palavras Chaves: Teoria das Relações Internacionais. Relação Brasil-Argentina. América do Sul.
INTRODUÇÃO
De acordo com E. H. Carr a antítese entre a utopia e a realidade “É uma eterna disputa (...) entre os que imaginam o mundo de modo a adaptá-lo à sua política, e os que elaboram sua política de modo a adaptá-la às realidades do mundo”[1]. O Brasil e a Argentina herdaram os conflitos de seus colonizadores e acabaram acirrando e mantendo essas rivalidades, que só foram superadas na história recente, um dos fatores que progrediram para esse entrelaçamento dessas duas potências regionais foi a cooperação, principalmente na área de energia, que é um importante ponto estratégico, com a construção de usinas hidrelétricas conjuntamente e o apoio no desarmamento nuclear da região ao assinarem tratados em que um país é responsável junto com a ONU na fiscalização das usinas nucleares do outro e vice-versa. A questão é se essa cooperação é uma atitude idealista ou pragmática, será que essa decisão pela não proliferação de armas das duas principais potências regionais não deixa a América do Sul em uma situação de vulnerabilidade a influencias externas? Soma-se o fator do sucateamento dos equipamentos bélicos desses países que passam por um processo de modernização de tempos em tempos, sempre de forma dependente de indústrias estrangeiras. Será que a atitude anterior, mais realista desses países, que tinham programas de armas nucleares em andamento, não acabaria trazendo um avanço tecnológico para a região? Ou traria a sua destruição? E qual atitude deverá ser tomada no atual panorama mundial?
I – RELAÇÃO HISTÓRICA BRASIL-ARGENTINA
As relações iniciais entre Argentina e Brasil foram conflituosas, com diversas fronteiras à definir e a disputa pela região do prata, somado as rivalidades dos Estados europeus de Portugal e Espanha que foi recebido de herança, isso somado a diferenças políticas como a formação de seus Estados que na Argentina foi em forma de República através de uma guerra civil e no Brasil não teve praticamente nenhum conflito direto, continuando a ter um governo autoritário na forma de Império, cujo líder era o herdeiro do trono português da família Bragança. Na mesma corrente está Simões ao escrever que “A primeira marca da política da América do Sul foi a sua divisão ao meio, antes mesmo do nascer. A linha imaginária definida no Tratado de Tordesilhas, de 1942, definiu um espaço de separação entre os territórios submetidos a Lisboa e aqueles submetidos a Madri. ”[2]Completando ainda o autor que “as colônias sul-americanas passaram a refletir, em suas relações, a rivalidade entre Espanha e Portugal. O antagonismo entre metrópoles coloniais produziu uma linha invisível de tensão entre o Brasil português e os Estados da América Espanhola. ” [3] No período de independências nacionais, o formato de Império adotado pelo Brasil contrastou Com o sistema republicano dos vizinhos sul-americanos.
A falta de um mercado comum entre os países da América espanhola fez com que esses países ficassem separados o que favoreceu as assimetrias entre o Brasil os demais países da região que perdura até hoje. Além disso a economia mercantilista estruturou as nações da América sul como Brasil e Argentina à periferia do sistema capitalista de tal forma que a base de suas economias é na produção de commodities para a exportação para as grandes economias industrializadas europeias. Apesar disso a Argentina no início do século XX alcançou “patamares de crescimento econômico e desenvolvimento humano e social no nível de países da europa com índices econômicos e acesso da população à educação e à produção cultural. ”[4]
II – BRASIL E ARGENTINA NO RIO DA PRATA
O Uruguai entra como estado tampão entre as duas potências sul-americanas sendo influenciado e disputado pelas duas, Boris Fausto assim destaca seu surgimento contando que “nasceu em 1828 após três anos de luta entre argentinos, brasileiros e partidários da independência. A Inglaterra viu com bons olhos a criação do país que deveria servir para estabilizar a área do estuário do Rio da Prata, onde os ingleses tinham interesses financeiros e comerciais. ”[5] Entretanto o país não cumpriu efetivamente a função desejada pela Inglaterra, pois “as facções dos blancos e dos colorados disputaram o poder a ferro e fogo”[6], e ainda o disputam até os dias de hoje, essas facções tornaram-se os principais partidos políticos do Uruguai respectivamente o partido nacional e o partido colorado, o primeiro integralizado por proprietários rurais, de origem conservadora e receosos das potências europeias e o segundo apoiado por comerciantes e as potencias imperialistas da Europa de origem liberal. O Brasil com uma política pragmática de tentativa de influência no Uruguai, ao ponto do Barão do Rio Branco declarar que “(...) a nova República Oriental do Uruguai não teve amigo mais dedicado, mais desinteressado, nem mais leal do que o Brasil.” Percebe-se nessa citação a prática de um realismo consistente, que segundo Carr, “envolve a aceitação de todo o processo histórico e exclui julgamentos morais”[7] Desta forma o Brasil tendo interesses econômicos dos gaúchos no fluxo da criação de gado do país, coloca-se ao lado dos colorados de atitude mais liberal, inclusive financiando através de uma contribuição mensal o partido. A tentativa de ascensão do Paraguai na figura de Solano Lopes, para alguns como uma utopia no sentido de tentar formar um Império na América do Sul enfrentando Uruguai e Brasil para conquistar a região do prata, para outros mais realistas a atitude mais plausível em um sistema internacional anárquico, já que no mundo hobbesiano a atitude mais racional possível quando não há um ente superior para governar e impedir que os indivíduos se matem é a “guerra de todos contra todos”, é o medo. O Paraguai esperava que a Argentina aderisse a guerra iniciada a seu favor, mas a Argentina vendo com receio a ascensão do Paraguai como um perigo a sua própria superioridade na região se manteve neutra no início, levando o Paraguai a declarar guerra à Argentina. Esse inimigo comum gerou o Tratado da Tríplice Aliança entre Uruguai, Brasil e Argentina, o que fez com que antigos rivais se unissem contra esse ameaça, nesse momento adotando uma política externa realista maquiavélica de se unir com aqueles de similar nível de poder para impedir a ascensão de uma potência que poderia sobrepujar ambos, o que se mostrou certo, considerando que o Paraguai tinha um exército modernizado, e estava melhor preparado militarmente.
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