Estados Unidos: A Supremacia Contestada
Por: joaopaulocampos • 16/6/2016 • Resenha • 1.957 Palavras (8 Páginas) • 510 Visualizações
Resenha Crítica: DOWBOR, Ladislau et al (orgs). Estados Unidos: a supremacia contestada. São Paulo: Cortez. 2003.
“How many times can a man turn his head, and pretend that he just doesn’t see?” (DOWBOR et al, 2003, p. 7). Com o trecho da música eternizada na voz do cantor e compositor popular norte americano Bob Dylan, Lasdislau Dowbor introduz o tema “Os EUA preocupam?”. A resposta é imediata: sim. A justificativa vem do enorme poderio norte americano atual, hegemônico no Sistema Internacional nos quesitos econômicos, políticos e militares. Hegemonia essa que dificilmente se auto regula.
Para o autor, a contínua desmoralização dos atores não-estatais pela política externa norte americana (como a ONU e a Corte Penal Internacional) e a constante intervenção em prol desses interesses ao redor do mundo (como a tentativa de golpe na Venezuela, invasão do Iraque, presença na Amazônia por meia da Colômbia, entre outros exemplos facilmente recordáveis) são as justificativas para a pergunta inicial do autor. Ainda para Dowbor (2003), isso é fruto de uma combinação de enorme poder e desinformação geral da sociedade americana quanto a temas internacionais, oque permite a seu governo agir sem grandes oposições internas no cenário internacional.
Para Ianni (DOWBOR et al, 2003, p. 17) “há acontecimentos que adquirem significados e conotações excepcionais, reveladores”. Exemplo desses acontecimentos é o atentado ás torres gêmeas do World Trade Center, em 11 de setembro de 2001. O atentado é uma prova de que muitas questões básicas que se acreditava naquele momento, mudaram. Os grandes símbolos do poderio norte americano e, por que não, do capitalismo foram atingidos em um único acontecimento. O poder desse símbolo é, para o autor, comparável ao de grandes acontecimentos na história da humanidade, como o descobrimento do continente americano em 1492, a queda da Bastilha em 1789 e a tomada do Palácio de Inverno de São Petersburgo marcando o início da revolução russa.
Para Ianni, Ocorre aí a “globalização do terrorismo” (DOWBOR et al, 2003). Um ponto interessante citado é uma possível ligação entre o ato violento praticado pelos agressores do 11 de setembro ter raízes na própria cultura americana de violência, constada por exemplo no cinema. As razões para um ato de tamanha violência são históricas. A política externa norte-americana vem construindo inimigos, principalmente durante o século XX, em especial o período pós-guerra e guerra fria. Políticas essas que procuram impor diretrizes econômicas, tecnológicas, culturais a outras nações de qualquer forma. Os exemplos tratados são diversas intervenções realizadas em diversos países, como na Grécia (1944-49), Irã (1953), Guatemala (1954), Congo (1960), Cuba (1961), Brasil (1964), Indonésia (1965), Chile (1973), Nicarágua (1989), Venezuela e Iraque (2002).
Tantos atos de intervenções violentas tiveram como consequência um crescente mal-estar, indignação e revoltas aos Estados Unidos. Sua presença e liderança internacional passaram a ser cada vez mais contestadas. Os golpes da CIA podem ser visto também como atos terroristas, em nome da “diplomacia total” (DOWBOR et al, 2003, p. 35) e possuem efeitos colaterais desastrosos, além das vidas perdidas no processo as respostas a eles também derramam sangue, como por exemplo, o 11 de setembro.
Esses incidentes se deparam com o ideal americano de justiça. A justiça, que muitas vezes é a justificativa de tomada de decisões no âmbito internacional, é um dos pilares de orgulho da sociedade estadunidense. Porém não se pode deixar de ver que o esse conceito de justiça, que permite matar e apoiar corrupções carrega consigo uma hipocrisia. A justiça vem de acordo com o interesse.
Interesse, por exemplo, com o petróleo. Sabemos hoje como ainda desconfiavam os autores do livro (lançado em 2002) que as investidas americanas no Iraque, justificada a época como uma caçada a armas de destruição em massa, não passou de um grande teatro. O governo Bush (por erro ou não) amargou descrença internacional após os anos de procura de tais “armas” não surtiram efeito e o único motivo óbvio de tamanho desgaste e gastos ser o controle de importantes regiões petrolíferas.
Além do histórico de atuação no sistema internacional de forma unitária, a total hegemonia americana (que era mais latente em 2002, data de publicação do livro) dá ares para a política do “destino manifesto”, ou seja, os EUA tem a vocação da liderança mundial. A liderança por si só não é um problema, mas se torna um problema quando um Estado passa a decidir de forma arbitrária e unilateral o destino de muitos sem temer consequências no sistema internacional. É claro que os problemas mundiais não são apenas culpa dos EUA, mas a verdade é que estão contribuindo pouco ou não estão contribuindo para torna-lo um lugar melhor.
Nos anos da guerra fria, na ótica norte americana, o inimigo tinha um rosto. O conflito “fazia sentido” e era organizado por uma forma tradicional, isto é, monopolizada no Estado. Após esse período o novo molde da violência é substancialmente diferente do anterior, o Estado não é o único monopolizador da violência. Nesse sentido, se diluem as fronteiras dos países, a separação entre o “interno” e o “externo”, o “nós” e o “eles”. Ficou evidente a dificuldade de nomear um inimigo sem rosto, que não possui território.
Para Ortiz (DOWBOR et al, 2003, p.36) “O evento do World Trade Center simboliza também o declínio do império americano”. A emergência de outros fortes atores, como a China e a União Europeia, e até recentemente vimos a Rússia mais uma vez consolidando seu poderio e afronta a política ocidental, cria um novo modelo de Sistema Internacional cada vez mais policêntrico.
No texto “Informação e democracia na economia globalizada” (DOWBOR et al, 2003, p.61) José Eduardo Faria trabalha as consequências da sociedade informacional na estrutura do Estado. Ele cita que por um momento, por exemplo, chegou-se a citar que a história tivesse chegado ao fim, não existindo mais alternativa a democracia. “Hoje, no entanto (...) a partir do impacto da revolução das tecnologias de informação na constituição de um mundo que se globaliza, no plano econômico, e que se fragmenta no plano político, a dúvida é saber se haverá alternativas políticas dentro da democracia” (DOWBOR et al, 2003, p.77). Para o autor, é necessário que se “reinvente” a política moderna, que, por exemplo, no caso do Brasil, em 500 anos não conseguiu jamais garantir e gerar condições socioeconômicas para a plenitude da cidadania.
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