Segurança, Securitização: Natureza Segurança Internacional
Por: ane.debald • 1/4/2024 • Resenha • 50.254 Palavras (202 Páginas) • 127 Visualizações
MÓDULO 1 – SEGURANÇA, SECURITIZAÇÃO: NATUREZA SEGURANÇA INTERNACIONAL
1- BUZAN, Barry. Rethinking Security after the Cold War. Cooperation and Conflict. v. 32, n. 5, 1997.
Introdução
Desde o fim da guerra fria, a literatura teórica em estudos de segurança tornou-se notavelmente ativa. Um aspecto desse restabelecimento foi a fragmentação do debate em três escolas: tradicionalistas, que preservam o foco no militarismo; wideners, que ampliam a gama de questões na agenda de segurança; e o recém lançado Estudos Críticos em Segurança, cujos proponentes mantém uma atitude questionadora em relação a todo o quadro no qual o estudo de segurança é conceituado.
A erosão da agenda Tradicionalista e o Contra-ataque Tradicionalista:
No início da Guerra Fria, quando o conceito de segurança nacional entrou em cena, o problema de segurança para o Ocidente era de como responder a um desafio de amplo espectro (militar, social, ideológico e econômico) da União Soviética. A Guerra Fria se dava através da rivalidade entre dois sistemas mutuamente exclusivos de política econômica sobre o futuro da sociedade industrial. Mas, com a pressão causada pela corrida armamentista nuclear, marcada por rápidos e estrategicamente importantes avanços tecnológicos, a inicialmente ampla e vasta conceituação de segurança rapidamente limitou-se a um foco militar.
Na década de 1980, foi visível o afastamento das questões militares-políticas do centro das preocupações da área de segurança, por conta da crescente consciência de que a guerra estava acabando. O grupo central da comunidade de segurança emergente era a Europa ocidental, o Japão e a América do Norte. A efetividade da dissuasão nuclear entre ocidente e oriente tornou possível que a União Soviética pudesse também ser incluída na esfera dessa comunidade de segurança, principalmente após Gorbachev ter apoiado explicitamente a desmilitarização da Guerra Fria. Após a Guerra do Vietnã, houve também uma crescente tendência no ocidente em questionar se a guerra era de fato um método efetivo para atingir uma ampla gama de objetivos políticos e econômicos.
Além disso, houve o aumento da securitização de duas áreas antes consideradas low politics: economia internacional e meio ambiente. No caso ambiental, o processo de securitização teve início nos anos 1960, quando livros como Silent Spring (CARSEN) começaram a fazer com que as pessoas ficassem alertas para os impactos da humanidade na transformação do meio ambiente (mudanças climáticas, biodiversidade, poluição, etc.).
No caso da economia, o processo de securitização surgiu em parte por causa do relativo declínio econômico dos Estados Unidos, inevitável resultado de sua exagerada posição de dominância global em 1945 e pelo esgotamento do excessivo imperialismo que iniciou na Guerra do Vietnã, e também pelas reações a crescente liberalização da economia mundial. A dominância americana foi desafiada pela Europa e pelo Japão quando estes se recuperaram da Segunda Guerra Mundial, bem como por alguns novos países independentes. Em paralelo ao declínio americano, estava a crescente liberalização da economia global, primeiro no comércio, e, a partir de 1970, também em finanças. O que significava que economias nacionais se tornariam mais expostas à competição de outros produtores num mercado global e a poderosas corporações transnacionais e mercados financeiros.
A ideia de segurança econômica no sistema capitalista é cheia de contradições e complicações. Não menos importante, em um mercado, os atores devem se sentir inseguros, caso contrário, o mercado não é eficiente. Mesmo assim, a preocupação se concentrou em uma série de questões específicas: 1. A habilidade dos estados em manter sua capacidade de produção militar independente em um mercado global; 2. A possibilidade de exploração para fins políticos das dependências dentro do mercado global; 3. Receio de que o mercado global gerasse mais perdedores do que ganhadores e aumentasse as já existentes desigualdades entre os estados; 4. Receio de que a economia internacional entrasse em crise pela combinação de fracas políticas, reações protecionistas e instabilidade estrutural no mercado financeiro. Já durante a Guerra Fria, os estados capitalistas se preocupavam mais com a ameaça soviética militar e política do que com a rivalidade comercial entre eles próprios.
Como a União Soviética primeiro retirou seu desafio militar e ideológico, e consequentemente implodiu, a análise racional político-militar do sistema de segurança da Guerra Fria evaporou. Mas, ocorreu também a perda do interesse comum que manteve as economias capitalistas unidas apesar de sua rivalidade. O debate entre wideners e tradicionalistas cresceu a partir da insatisfação com o intenso estreitamento do campo imposto pelas obsessões militares e nucleares da Guerra Fria. Primeiramente, foi estimulado pelo surgimento das agendas econômica e ambiental nas relações internacionais durante as décadas de 1970 e 1980, e pelo crescimento das preocupações com questões identitárias e crime transnacional durante a década de 1990. Esse alargamento orientado da questão foi gatilho para a sua própria reação, criando um apelo para o foco das questões de segurança ao redor do uso da força. Um argumento chave era de que esse alargamento progressivo colocaria em risco a coerência intelectual da segurança.
A defesa do tradicionalismo teve início com o fim da Guerra Fria. Durante muito tempo, ainda era possível encontrar argumentações a favor da restrição do campo da segurança para questões nucleares e militares. Como o edifício inteiro de estudos estratégicos construído durante a Guerra Fria aparentava estar em risco, consequentemente, o foco em análise militar estratégica parecia extremamente vulnerável às pressões dos wideners. Tradicionalistas lutaram através da reafirmação de argumentos convencionais sobre a primazia da segurança militar. Em graus variados, eles aceitaram que deviam olhar mais amplamente para os conflitos em questões não-militares do sistema internacional, e houve uma pequena tentativa em defender a centralidade do estado em análise de segurança, em um período onde muitos atores não-estatais atuavam como atores ativos no jogo militar. Stephen Walt profere, provavelmente, o principal discurso tradicionalista. Ele argumenta que os estudos de segurança são sobre o fenômeno da guerra, e que pode ser definido como “o estudo da ameaça, uso e controle da força militar”. Para ele, a definição do campo entre as várias outras áreas defendidas pelos widening causaria uma destruição
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