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A Explosão gospel: Um olhar das ciências humanas sobre o cenário evangélico no Brasil

Por:   •  11/7/2018  •  Resenha  •  1.956 Palavras (8 Páginas)  •  820 Visualizações

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CUNHA, Magali do Nascimento. A explosão gospel: um olhar das ciências humanas sobre o cenário evangélico no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad X: Instituto Mysterium, 2007.

O livro de Magali do Nascimento Cunha traz uma importante contribuição para os escassos estudos existentes sobre o fenômeno da cultura gospel no Brasil. Cunha traça uma notável linha histórica, que proporciona ao leitor situar-se no tempo e compreender o modo pelo qual as igrejas evangélicas se constituíram no Brasil. A partir daí, trata do fenômeno gospel em si, estando atenta às transformações sociais, políticas e econômicas pelas quais o mundo passa atualmente, num processo que tem seu início por volta do final dos anos 80 do século XX. Desfecha brilhantemente, ao final do livro, quando propõe uma compreensão original do gospel, levando em conta a metáfora bíblica “vinho novo em odres velhos”.

A estrutura do livro é composta por cinco capítulos, além de introdução, conclusão e um capítulo exclusivo à definição e elucidação de terminologias utilizadas no trabalho. O capítulo 1 trata da evolução histórica da presença evangélica no Brasil, começando pelo século XIX e chegando à explosão (neo) pentecostal do final do século XX. Investiga e esclarece, também, o modo pelo qual se formou a identidade evangélica no Brasil, a partir da atuação de missionários estadunidenses e do aspecto e origem rural dos primeiros movimentos evangélicos no país. O capítulo 2 acentua a explosão gospel brasileira, atentando para o modo pelo qual a música religiosa evangélica passou por transformações em seu modo de ser. O terceiro capítulo trata do “sagrado” que envolve a música gospel em uma lógica mais interna aos cultos e às igrejas. O quarto debruça-se sobre o papel que têm o consumo e o entretenimento na formação da cultura gospel no Brasil. Cultura que é abordada no quinto e último capítulo como sendo híbrida, moderna no invólucro e conservadora em seu interior.

Embora os primeiros protestantes tenham aportado ao Brasil já nos séculos seguintes ao “descobrimento”, com as invasões francesa ao Rio de Janeiro e holandesa ao Nordeste, as primeiras igrejas protestantes só são instauradas e reconhecidas a partir da chegada de imigrantes ingleses e, principalmente, alemães, em meados da metade do século XIX. Os ingleses traziam consigo a religião anglicana, enquanto que os alemães traziam a tradição luterana. Estes últimos, muito mais numerosos, instalaram-se principalmente na região Sul do país, e em alguns outros Estados como São Paulo e Espírito Santo. Posteriormente, ainda no século XIX, chegaram missionários de outras matrizes evangélicas (consideradas pela autora como protestantismo de missão, sendo ainda igrejas históricas). Eram eles de denominações como a Metodista, a Presbiteriana, a Batista e a Congregacional e mantinham em comum a tradição puritana de “separação do mundo” e de costumes atrelados à ética religiosa. Encontraram no mundo rural um espaço propício à sua pregação, uma vez que no meio urbano era forte a resistência causada pelas raízes ainda intactas do catolicismo.

No início do século XX, começam a chegar ao Brasil missionários de outra corrente religiosa evangélica: o pentecostalismo (clássico, em sua 1ª onda), marcado pela glossolalia (falar em línguas estranhas, divinas) e pelo emocionalismo do batismo no Espírito Santo. Em 1911, é fundada a Assembleia de Deus em Belém/PA, e o movimento se expande rapidamente a partir dos anos 30, com a industrialização e urbanização do país. Nos anos 50 e 60 surge a segunda onda pentecostal, com a fundação de igrejas genuinamente brasileiras e comandadas por líderes carismáticos, onde a ênfase se dava, além do batismo no Espírito Santo, na cura divina. Este movimento é ampliado e modernizado com a terceira onda pentecostal, surgida ao final dos anos 70. Nas igrejas desta onda, são valorizados o exorcismo e as Teologias da Prosperidade e da Guerra Espiritual. Tais igrejas passariam a ser conhecidas como neopentecostais.

É a partir das igrejas neopentecostais, mas também com ampla aceitação no ramos pentecostais clássico e de cura divina, que surgirá o fenômeno gospel nos anos 80. Digo aqui o fenômeno gospel porque, se considerarmos a música religiosa evangélica como gospel desde os seus primórdios, estaremos desviando o foco da modernidade desse gênero. Historicamente, a música evangélica brasileira foi fundada sobre a tradicional hinologia protestante estadunidense, passando a sofrer transformações com a introdução de ritmos populares e avivalistas por volta do meio do século XX. Começam, neste exato momento, a surgir os chamados “corinhos” (que a autora identifica como oriundos dos movimentos paraeclesiáticos) e a adequação da música sacra à música popular, sobretudo como uma forma de acompanhar o ritmo de urbanização e modernização pela qual passava o país. O gospel tem origem nos Estados Unidos, ainda no século XIX, onde representava a música religiosa de igrejas marcadamente étnicas e seguia um padrão moderno para a época.

No entanto, a autora identifica o gospel como uma cultura, e não simplesmente como um gênero musical. A meu ver, é bastante acertada a decisão nesse sentido. A cultura gospel nasce da confluência de diversos fatores: pela combinação da modernização alcançada pelo gênero já nos anos 80, com a introdução de ritmos seculares adaptados à mensagem religiosa, com o capitalismo globalizado e a cultura de consumo e entretenimento que alcançava a sociedade brasileira. Não se deve deixar de mencionar também o papel influente e modernizante da mídia nesse processo, pois o segmento evangélico sempre procurou pelos meios midiáticos alcançar a população. Diferentemente do que ocorreu nos Estados Unidos, onde a pregação do Evangelho foi mais intensa pela televisão, no Brasil o rádio foi o meio mais utilizado para o proselitismo religioso evangélico. Tal situação se modifica com o passar das décadas, pois as igrejas procuram espaços também pela televisão e pelo mercado fonográfico, montando suas próprias gravadoras. O termo gospel, no Brasil, começa a ser utilizado mais ou menos no final dos anos 80, quando é fundada a Igreja Renascer em Cristo. Esta igreja passa a utilizar frequentemente a expressão para se referir à sua identidade.

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